Eduardo Militão
A Comissão de Sindicância da Câmara encontrou indícios para processar administrativamente 45 servidores por supostamente fazer comércio ilegal de passagens aéreas dos deputados. Um deles faleceu e seu caso acabou arquivado. Os funcionários pertencem a 39 gabinetes de parlamentares. A maioria dos congressistas demitiu os subordinados temendo “contaminação” com a farra das passagens.
A máfia das passagens consistia em obter créditos de passagens para uso exclusivo dos deputados a trabalho em agências de turismo, que os comercializam a terceiros se valendo de descontos. Para dar os descontos, os agentes obtinham deságios na compra, empréstimo ou antecipações desses créditos com intermediários ou funcionários dos gabinetes. Como mostrou o Congresso em Foco, pelo menos um deputado tentou, ele mesmo, negociar seus créditos acumulados (leia mais).
Após análise do relatório da comissão de sindicância, que é mantido em sigilo pela Mesa da Câmara, a direção da Casa decidiu abrir processo contra 44 servidores.
Da mesma forma, a Corregedoria abriu processo apenas contra alguns dos 39 parlamentares que chefiavam os funcionários. A reportagem identificou que pelo menos oito parlamentares (20% do total) são investigados pelo órgão comandado por Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM-BA). Até agora, apenas Eugênio Rabelo (PR-CE) teve o caso arquivado.
Paulo Roberto (PTB-RS) aguarda uma decisão da Mesa. O licenciado Paulo Bauer (PSDB-SC) e seu suplente, Acélio Casagrande (PMDB-SC), estão sendo investigados por uma comissão de deputados.
Márcio Junqueira (DEM-RR), Raymundo Veloso (PMDB-BA), Roberto Rocha (PSDB-MA) e Aníbal Gomes (PMDB-CE) são alvo de apurações preliminares do corregedor. A reportagem apurou que Francisco Rossi (PMDB-SP) também prestou informações a ACM Neto, mas não é possível dizer se há uma investigação contra ele. Saiba o que dizem os deputados investigados na Corregedoria.
Demissões
O secretário parlamentar Wendell Victor da Silva Costa, que trabalhava com Fernando Chucre (PSDB-SP), já é falecido. Por isso, só há processo administrativo contra 44 servidores.
Desse total, apenas 15 continuam trabalhando na Câmara, ou seja, pouco mais de um terço. Os deputados depositaram confiança nos servidores e os mantiveram na Casa, inclusive concedendo-lhes aumentos salariais conforme apurou o site. Uma funcionária, porém, teve o ordenado reduzido em dezembro.
Outros 19 funcionários – ou 43% – foram demitidos em meio à publicação das reportagens do Congresso em Foco sobre o uso indiscriminado, por senadores e deputados, de passagens aéreas pagas com dinheiro público (leia mais). Um servidor conseguiu um novo trabalho como Cargo de Natureza Especial (CNE) na Mesa Diretora, mas acabou demitido novamente.
Um grupo de 10 servidores deixou a Câmara antes do escândalo. Eles representam 23% do total de processados. A reportagem encontrou o caso de uma servidora defendida ardorosamente pelo deputado. O ex-chefe não queria sequer passar os contatos da ex-servidora para não atrapalhar seus estudos.
O sexto andar
A listagem dos servidores mostra uma curiosidade. Boa parte dos acusados trabalha no 6º andar do Anexo IV da Câmara. As investigações da comissão de sindicância, da Polícia Legislativa e entrevistas obtidas pelo site mostram que os deputados e seus servidores vizinhos de gabinete tinham o hábito de emprestar a cota de bilhetes aéreos entre si. Em algumas ocasiões, a devolução desses créditos era intermediada por agentes.
No sexto andar fica o gabinete de Márcio Junqueira. Lá trabalhava o servidor Marco Aurélio Vilanova, um operador de passagens no mercado ilegal, segundo relatório da comissão de sindicância. Ele foi demitido.
Nada menos que dez servidores de nove gabinetes estão envolvidos nos processos de comércio de bilhetes. Todos estão no sexto andar do Anexo IV. É o andar com mais pessoas citadas no relatório. O 6º e o 7º andares reúnem mais de um terço dos envolvidos no caso.
No mês passado, vários funcionários começaram a apresentar suas defesas às comissões de processo que teve até 27 de dezembro para concluir seus trabalhos. Entretanto, houve suspensão dos prazos por conta do recesso do Natal e do Ano Novo.
Além disso, é possível que sejam dados mais 30 ou 60 dias para que as comissões concluam seus trabalhos. Se nem isso for necessário, a Câmara pode recriar os grupos com os mesmos membros para encerrarem o julgamento dos casos.
LEIA AMANHÃ: A lista dos 45 servidores processados e dos 39 deputados aos quais eles eram ligados