Nova reportagem publicada neste domingo (07) pelo site The Intercept em parceria com a Folha de S. Paulo revela que os procuradores da Operação Lava Jato atuaram para expor informações da delação premiada da Odebrecht que estavam sob sigilo judicial como forma de interferir no cenário político da Venezuela. As informações são baseadas em conversas entre os procuradores do Ministério Público Federal responsáveis pela Lava Jato no Paraná, trocadas pelo aplicativo de mensagens Telegram, ocorridas em agosto de 2017. O atual ministro da Justiça, Sérgio Moro, também está envolvido.
Os diálogos mostram Moro deu início ao assunto. “Talvez seja o caso de tornar pública a delação dá Odebrecht sobre propinas na Venezuela”, disse o juiz. “Isso está aqui ou na PGR?”, completa. Deltan Dallagnol, coordenador da Lava Jato no Ministério Público Federal em Curitiba, responde que iria buscar uma forma de contornar os limites do acordo de delação premiada para divulgar as informações. “Haverá críticas e um preço, mas vale pagar para expor e contribuir com os venezuelanos”, afirma o procurador.
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Ao comentar o assunto com os colegas, Dallagnol enfrentou alguma resistência, já que outro procurador temia aprofundar a convulsão social no país vizinho. Dallagnol argumentou sobre a motivação política da ação. “Não vejo problema de soberania. E há justificativa para fazer qto à Venezuela e não outros pq destituiu a procuradora geral e é ditadura”, disse. “O propósito de priorizar seria contribuir com a luta de um povo contra a injustiça, revelando fatos e mostrando que se não há responsabilização lá é pq lá há repressão. Qto a travar a possibilidade de processamento lá, podemos fazer só em relação a parte dos fatos, o que resolveria o problema”, argumenta Dallagnol, no grupo chamado “Filhos de Januário 2”. Ele deixou claro aos colegas que tinha o apoio de Sérgio Moro para a iniciativa de vazar informações sigilosas.
De acordo com a reportagem da Folha de S.Paulo, o acordo fechado pela Odebrecht, assinado com autoridades brasileiras, dos Estados Unidos e da Suíça, estabelece que as informações só podem ser compartilhadas com investigadores de outros países se eles garantirem que não tomarão medidas contra a empresa e os executivos que se tornaram delatores.
A cooperação não oficial entre Lava Jato e procuradores da Venezuela começou a se concretizar algumas semanas depois, no final de agosto de 2017, quando a procuradora-geral da Venezuela, Luisa Ortega Díaz veio ao Brasil. Ela tinha sido destituída do cargo pelo governo de Nicolas Maduro sob a acusação de chefiar um esquema de extorsões com o marido.
Segundo os diálogos examinados pela Folha e pelo Intercept, dias depois, o procurador Vladimir Aras, que chefiava a Secretaria de Cooperação Internacional do Ministério Público Federal, pediu ajuda aos integrantes da Lava Jato para receber dois procuradores venezuelanos que viriam ao Brasil em segredo para trabalhar com eles no caso. Em outubro, a PGR destituída da Venezuela e exilada na Colômbia publicou em seu site na internet dois vídeos com trechos de depoimentos do ex-diretor da Odebrecht na Venezuela, Euzenando Azevedo, sobre contribuições feitas pela empreiteira para campanhas eleitorais de Maduro.
Os advogados da empresa questionaram o MPF no Paraná sobre o vazamento e pediram ao Supremo Tribunal Federal abertura de investigação para apurar o caso.
Procurado, o ministro da Justiça Sérgio Moro não quis comentar o conteúdo das novas conversas divulgadas e manteve a argumentação adotada nas últimas semanas de questionar a veracidade dos diálogos, que, segundo ele, podem ter sido alterados pelos hackers que invadiram os celulares dele e dos procuradores. A mesma argumentação foi adotada pela força tarefa da Operação Lava Jato no MPF em Paraná.
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