Eduardo Militão
Ex-dono da firma que controla a TV Caburaí, retransmissora da Bandeirantes em Roraima, o lobista Geraldo Magela Fernandes da Rocha titubeia no início, mas confirma. Era apenas um laranja do líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). Em entrevista ao Congresso em Foco, Magela confirma que o verdadeiro dono da TV Caburaí é Romero Jucá, uma situação que contraria a Constituição. De acordo com o artigo 54, deputados e senadores não podem ser “proprietários, controladores ou diretores” de empresas que sejam concessionárias de serviço público, caso das emissoras de rádio e TV.
Leia o que disse Geraldo Magela ao Congresso em Foco:
Congresso em Foco – O senhor aceitou abrir essa firma [Uyrapuru Comunicações e Publicidade, controladora da TV Caburaí]. Quem propôs ao senhor abrir essa firma?
Geraldo Magela Rocha – O senador Romero Jucá.
O senhor trabalhava para ele?
Trabalhava.
O senhor era um testa de ferro do Jucá?
Diante das pressões, realmente me tornei um testa de ferro. É a classificação melhor.
Então, o senhor era um laranja do senador na televisão?
Sim.
A televisão pertence a ele?
A televisão pertence… A Uyrapuru, no fundo, no fundo, pertencia a ele.
O senhor era só o laranja?
Certamente. Certamente, é a classificação certa.
Ouça a íntegra desse trecho da entrevista.
Aos 58 anos, falido, com o nome sujo, contas bancárias bloqueadas, sem cheques ou cartões de crédito, morando de favor na casa da filha, com uma dívida de R$ 2,5 milhões para pagar à União e à Justiça, Magela Rocha resolveu contar o que, segundo ele, seria a verdadeira história da TV Caburaí e os detalhes que o levaram a essa situação. Um dos presos na Operação Navalha, ele tentou por meses negociar com Jucá os débitos na Justiça. Para ele, é o senador quem deveria pagar as dívidas.
Do lobby à TV
Magela conheceu Romero Jucá no final dos anos 80, quando o hoje líder do governo foi presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai). Na época, Magela trabalhou com ele na Funai. Mais tarde, Geraldo Magela Rocha abriu a Pool Comunicação, um escritório que faz lobby, ou seja, defende interesses de empresas perante o governo federal em Brasília. Ao mesmo tempo, fazia a publicidade das campanhas políticas de Romero Jucá.
No último dia do governo José Sarney, 14 de março de 1990, o Departamento Nacional de Telecomunicações (Dentel) concedeu o canal 8 de Boa Vista para se tornar a TV Caburaí, que seria então explorada pela Fundação de Promoção Social e Cultural do Estado de Roraima.
Uma empresa, a TV Caburaí Ltda, foi criada para produzir os programas da TV que pertencia à fundação. O senador Romero Jucá chegou a ser sócio desta empresa, mas depois deixou a sociedade. A firma está desativada, segundo o próprio parlamentar.
Em 1999, a Fundação encerra a parceria com a empresa que pertenceu ao líder do governo. É quando Magela entra no esquema, para, segundo ele, se tornar laranja de Romero Jucá. A TV Caburaí é alugada para a empresa Uyrapuru Comunicações, criada por Geraldo Magela e por sua filha, Marianna Rocha.
Ao Congresso em Foco, Magela afirma que foi Jucá quem lhe pediu para abrir a Uyrapuru. “Aceitei ceder o nome e ainda coloquei a minha filha como sócia porque confiei que nunca chegaria nesse processo”, conta ele. Em troca de emprestar seu nome para tocar a TV, Jucá prometia um “acerto futuro”, que nunca aconteceu, de acordo com o ex-aliado. O lobista vivia das rendas da Pool e das campanhas políticas e afirma que, de 1999 a 2003, nunca recebeu nada da TV, à exceção de uma única retirada, inferior a R$ 15 mil.
Segundo Magela, ele comandava a parte administrativo-financeira da TV. Jucá cuidava da programação, principalmente do jornalismo político. Mas o ex-laranja avalia que havia gastos demais, devido à promoção do grupo político do senador Jucá, o que ainda rendia multas eleitorais contra a empresa. “Tinha mais de 20 jornalistas, uma frota de cinco ou seis carros rodando Roraima só para política. O objetivo sempre foi político.”
Em 2003, Magela Rocha pediu para deixar a Uyrapuru e a TV. Então, Jucá teria lhe dito: “Eu criei uma empresa para os meninos e vou passar para eles”. A empresa era a Societat Participações Ltda., criada em setembro de 2002, em Recife (PE), terra natal do senador, segundo a Receita Federal. Constam como sócios da Societat os filhos do líder do governo – Rodrigo e Marina Jucá – e suas então enteadas Ana Paula e Luciana Surita, filhas de sua ex-mulher Tereza Surita Jucá.
Pela alteração contratual de 2003, a Uyrapuru foi comprada por Rodrigo Jucá e pela Societat. Na prática, Rodrigo Jucá passou a ser sócio majoritário da empresa que alugava a TV Caburaí.
O valor da compra seria de R$ 30 mil, mas Magela Rocha diz que os Jucás não lhe pagaram nada, porque era apenas uma transferência a ser feita nos papéis.
Assinaturas falsificadas
Segundo o mandado de segurança, vários problemas aconteceram nessa transferência. Magela Rocha alega que só em 2009, seis anos depois, a Junta Comercial de Roraima e o Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC) oficializaram a “compra” da Uyrapuru por Rodrigo Jucá e a Societat.
Ele diz que o prazo legal para essa transferência é de 30 dias. E que, nesse anos todos, foram usadas procurações revogadas, assinaturas e documentos falsificados.
Veja documentos apresentados por Geraldo Magela Rocha à Justiça
O grande problema dessa demora de transferência é que nesse meio tempo ninguém pagou os impostos e demais encargos da TV. O resultado: R$ 2,5 milhões em impostos e obrigações trabalhistas não pagos que estão sendo cobrados de Geraldo Magela Rocha. Como a mudança de dono não era oficializada, as dívidas são cobradas do lobista, que teve os bens e contas bloqueados pela Justiça.
“Vou tomar a TV de volta”
O lobista entrou com um mandado de segurança na 1ª Vara Federal de Brasília. Mas a juíza Solange Vasconcelos remeteu o caso para a Justiça
Federal em Roraima. E retirou o diretor do DNRC da lista de réus.
Veja aqui o mandado de segurança impetrado por Geraldo Magela
No mandado de segurança, Magela Rocha pede de volta a administração da Uyrapuru, controladora da TV. Isso porque, ele afirma que tentou passar a empresa para o nome dos filhos de Jucá em 2003, mas isso não se concretizou por problemas burocráticos. Enquanto isso, Magela Rocha alega que o filho do senador, Rodrigo de Holanda Menezes Jucá, administrou mal a televisão e acumulou dívidas, que ficaram todas em sem nome.
O lobista disse ao Congresso em Foco que quer tomar a TV de volta e, assim, vender o patrimônio para pagar os débitos ou manter o negócio em suas mãos e tentar se reerguer financeiramente. “Claro, vou tomar a televisão dele.”
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