Edson Sardinha
Quase três semanas após as eleições, alguns parlamentares ainda se lamentam e procuram explicações para a derrota. A necessidade de reflexão é ainda maior para o grupo de 18 deputados que tiveram menos da metade da votação alcançada em 2006.
“Estou tentando entender o que houve”, admite a deputada Solange Amaral (DEM-RJ). Eleita para o primeiro mandato federal em 2006, com 101.428 votos, Solange recebeu apenas 26.529 votos, um terço da votação anterior. “Dói muito. Foi uma surpresa para mim e para todo mundo”, emenda a deputada.
“Até 25 de setembro, as pesquisas me davam como eleita. Posso ter cometido erros durante a campanha. São coisas muito internas, muito locais. Nossa coligação, que parecia ser uma aliança de muito sucesso, não teve o êxito esperado”, avalia a deputada.
O deputado Charles Lucena (PTB-PE) tem explicação para o seu insucesso. “Para mim, determinante foi a morosidade da Justiça. Durante 88 dias da campanha disseram que eu era ‘ficha suja’. A dois dias da eleição, liberaram minha candidatura e admitiram que eu era ‘ficha limpa’. Como vou explicar isso para o meu eleitor em tão pouco tempo?”, reclama o pernambucano.
O Congresso em Foco procurou os 18 deputados que perderam mais da metade dos votos conseguidos em 2006. Apenas os dois se dispuseram a avaliar as razões de suas derrotas.
Suplente efetivado no ano passado, Charles Lucena recebeu 21.917 votos em 2006. Em outubro, apenas 9.592 eleitores votaram nele. O petebista foi declarado inelegível pelo Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco por abuso do poder político e econômico em 2006. Ele e a mãe, a ex-deputada estadual Malba Lucena, foram acusados de utilizar um programa que oferecia atendimento médico, além de aulas de inglês e informática, com fins eleitoreiros.
Acionado pelo Ministério Público Eleitoral, o TRE-PE enquadrou mãe e filho na Lei da Ficha Limpa, que ampliou de três para oito anos o período de inelegibilidade para os casos de abuso de poder econômico. Charles recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral e conseguiu a liberação de sua candidatura dois dias antes da eleição. Os ministros entenderam que ele já havia cumprido a punição e que não estava sujeito à nova lei.
“Primeiro, me condenaram à pena de morte. Depois me executaram. Só então decidiram revogar a decisão. Mas, aí, eu já estava morto”, critica o deputado. “Sou uma pessoa séria, a favor da ficha limpa, um médico, um educador. Não tenho como ser ressarcido. Quero pelo menos que minha imagem seja reparada”, reforça o deputado.
Charles já tem outras pretensões eleitorais. “Minha luta vai continuar. Vou voltar a ser vereador do Recife. Mas Pernambuco perdeu a chance de me ter como representante, porque sou uma pessoa digna. Sou apenas um injustiçado”, declara.
Solange Amaral afirma que, apesar da decepção, está motivada para concluir seu mandato. “Estou no terceiro mandato, já fui deputada estadual duas vezes. Não caí de paraquedas na política”, diz a deputada. “Nossos candidatos a governador e a senador não tiveram 20% dos votos. A onda da Marina impediu o crescimento de José Serra e seus aliados. Houve uma conjunção de fatores”, considera.
Alguns companheiros de aliança de Solange também viram seus votos minguarem de uma eleição para outra. A deputada Andreia Zito (PSDB-RJ) e o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), por exemplo, tiveram menos da metade dos votos obtidos em 2006. Os dois, porém, ainda conseguiram se reeleger. Rodrigo Maia teve 86.162 votos em outubro. Há quatro anos, o presidente do DEM totalizou 235.111 votos. Andréia Zito, que teve 190.413 em sua primeira eleição, recebeu agora 82.832 votos.
Divisão ou migração de votos
Para o analista político Antônio Augusto de Queiroz, do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), ninguém perde tantos votos sem ter sofrido sérios abalos em sua base eleitoral. “O que justifica, em geral, é a divisão ou a migração da base política. Ninguém decresce na razão de dois terços sem desagregação da base que o sustentou na eleição anterior. O chamado voto de opinião pesou muito pouco nesta eleição, o que prevaleceu foi o uso da máquina”, considera.
O cientista político Paulo Kramer avalia que a Lei da Ficha Limpa teve impacto muito grande nestas eleições, apesar da indefinição do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o assunto. Mas outros fatores de ordem pessoal e corporativa também podem explicar o fracasso eleitoral dos parlamentares candidatos à reeleição.
“Na eleição proporcional, os fatores pessoais pesam muito. O eleitor vota em quem ele conhece ou no candidato indicado por algum amigo. Uma campanha permanente que não foi feita, interesses pessoais ou corporativos não atendidos, tudo isso pode influenciar na derrota. A relação com o eleitor, nas eleições proporcionais, é mais forte”, afirma o cientista político.