O coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, o procurador Deltan Dallagnol, classificou como “absurda” a proposta em discussão no Banco Central que exclui parentes de políticos da lista de monitoramento obrigatório das instituições financeiras. “Parentes de políticos e funcionários públicos são usados com frequência para lavar o dinheiro da corrupção”, ressaltou o procurador em uma série de comentários publicada no Twitter.
Ele citou como exemplo o caso do ex-deputado e ex-presidente do PP Pedro Corrêa. “A Lava Jato é um de muitos casos em que aconteceu isso. No caso envolvendo o parlamentar do PP Pedro Correa, por exemplo, o juiz registrou, na condenação, que as propinas foram lavadas com o auxílio de seu filho. Parte do dinheiro foi lavado por meio de depósitos fracionados que envolveram a conta da nora. Houve depósitos feitos pelo próprio Alberto Youssef”, lembrou Dallagnol.
A exclusão de parentes de políticos é uma das mudanças submetidas pelo Banco Central a consulta popular. Outra alteração polêmica discutida é a derrubada da exigência de que todas as transações bancárias acima de R$ 10 mil sejam notificadas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). O BC sugere que somente operações em dinheiro acima de R$ 50 mil sejam obrigatoriamente informadas.
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Testa de ferro
Dallagnol argumenta que o uso de familiares como laranjas oferece riscos devido à maior exposição dos envolvidos, mas é o meio mais cômodo para o criminoso lavar dinheiro. “Sob o ponto de vista do criminoso, o uso de pessoa com vínculo familiar, de um lado, apresenta certa desvantagem por haver maior probabilidade de ser foco da atenção, do que outro terceiro (laranja, testa de ferro, fantasma ou ficto), em uma investigação mais ampla ou profunda”, ponderou.
“De outro lado, é altamente tentador, pois não demanda maior esforço – quase toda pessoa possui relação com pais, ou filhos, ou irmãos, ou possui um companheiro(a) –, chama menos a atenção no momento do uso, e apresenta segurança, decorrente do vínculo de confiança”, observou.
PublicidadeSegundo ele, é muito mais provável que um policial corrupto use um familiar para ser titular de seus bens adquiridos com propina do que um terceiro. “O uso de familiares para movimentação e a fim de figurarem como proprietários nominais de bens, valores e empresas, merece destaque em separado em razão da sua frequência, ainda que os familiares possam ser enquadrados em outras categorias, como a dos laranjas e testas de ferro”, defendeu.
Relatório do Coaf aponta 48 depósitos suspeitos na conta de Flávio Bolsonaro
Consulta pública
O Banco Central abriu no último dia 17 consulta pública para atualizar as normas impostas aos bancos e demais instituições financeiras para combater a lavagem de dinheiro. As regras em vigor facilitam o acesso a informações mais detalhadas pelos investigadores e embasam pedidos de quebra de sigilo.
Desde 2009, familiares de pessoas consideradas politicamente expostas – como políticos do Executivo e do Legislativo federal, integrantes de tribunais superiores, governadores presidentes de tribunais de contas – são submetidas a uma fiscalização mais rigorosa dos bancos.
Segundo a Folha de S.Paulo, a minuta de nova circular apresentada pelo BC amplia o grupo de pessoas politicamente expostas aumentou, apesar da retirada dos parentes da lista de vigilância. Foram incluídos deputados estaduais, vereadores e presidentes e tesoureiros de partidos políticos.
“A proposta não retira parentes. Ela deixa a cargo da instituição financeira avaliar se as movimentações de parentes precisam ser reportadas. Depende do grau de risco que a instituição atribui aos parentes do PEP”, afirmou o Banco Central em mensagem enviada à Folha. A lista, observou o BC, poderá ser alterada conforme o resultado da consulta pública.
Depósitos fracionados
Pelas regras atuais, todas as transações bancárias acima de R$ 10 mil, mesmo que fracionadas, geram notificações dos bancos ao Coaf. A instituição descobriu assim, por exemplo, que o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) recebeu 48 depósitos de R$ 2 mil cada entre junho e julho de 2017.
De acordo com a minuta em análise, só operações em dinheiro acima de R$ 50 mil terão de ser obrigatoriamente comunicadas. Nos demais casos, segundo a Folha, caberá aos bancos acusarem operações suspeitas, de acordo com critérios como as partes envolvidas na transação, os valores, as formas como foi realizada, se falta de fundamento econômico ou legal para a operação e outros indícios de lavagem. O Banco Central argumenta que a ideia é obrigar os bancos a criar regras internas para identificar casos suspeitos, independentemente do valor envolvido.