Mário Coelho
Criado com a missão de analisar a conduta e o decoro dos colegas, o Conselho de Ética da Câmara tem parte dos seus integrantes com problemas na Justiça. Levantamento feito pelo Congresso em Foco mostra que 20% dos membros do colegiado enfrentam inquéritos e ações penais no Supremo Tribunal Federal (STF). Juntos, eles somam 19 processos no Supremo. É a mais alta corte do país que tem a prerrogativa de investigar e julgar deputados federais e senadores.
A nova composição do Conselho de Ética, formada por 15 deputados titulares e 15 suplentes, foi instalada na última quarta-feira (16). Os parlamentares já têm uma missão: analisar o caso envolvendo a colega Jaqueline Roriz (PMN-DF). No início do mês, veio à tona um vídeo onde ela aparece, junto com o marido, recebendo R$ 50 mil das mãos de Durval Barbosa, delator do esquema de propina que deu origem à Operação Caixa de Pandora.
Após a instalação do conselho, o site fez uma busca pelo nome de cada parlamentar no acompanhamento processual do Supremo. É possível procurar também pelo número do processo e de protocolo, e pelos advogados. Somente ações que tramitam em segredo de Justiça não aparecem na consulta. A partir daí, foi possível identificar que seis deputados são investigados e até mesmo réus no Supremo. Somente inquéritos e ações penais ativos entraram na lista.
Entre os enrolados com a Justiça, o deputado que tem o maior número de processos é Abelardo Camarinha (PSB-SP). Tramitam atualmente na corte, de acordo com a pesquisa, quatro ações penais, onde ele já é réu, e nove inquéritos, em fase de investigação. A maior parte dos casos está dentro da classificação direito penal. São processos envolvendo crimes de responsabilidade, crime da Lei de Licitações, crimes de imprensa, crime ambiental e até crime contra a honra.
Veja a lista completa de processos dos parlamentares
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O Congresso em Foco entrou em contato com o deputado, inclusive enviando a lista de processos, para que ele pudesse argumentar e dar sua versão dos casos. O mesmo procedimento foi feito com os outros parlamentares. Nenhum deles respondeu, à exceção do deputado Sílvio Costa (PTB-PE). Em resposta ao site no ano passado, logo após ser reeleito, Camarinha minimizou a quantidade de processos.
?Tenho nove inquéritos promovidos por meus adversários, e que estão todos sendo arquivados, nenhum virou processo. E quatro ações, duas de discussões políticas, naturais em campanha, troca de acusações. Em 14 anos como prefeito de minha cidade [Marília], nenhuma condenação?, disse, na época.
No ano passado, Camarinha era um dos parlamentares com o maior número de processos na região Sudeste. Dentro do colegiado, a quantidade de investigações e ações penais dos outros colegas não chega perto do que o deputado paulista enfrenta atualmente. Enquanto ele se defende em 13 casos, os demais integrantes somam seis. São quatro inquéritos e duas ações penais.
Dos deputados restantes, somente um enfrenta mais do que um caso. É Wladimir Costa (PMDB-PA). Ele é investigado por calúnia e difamação e responde como réu em uma ação penal por crimes de imprensa e contra a honra. Já Marcos Medrado (PDT-BA) enfrenta um inquérito por crimes eleitorais. Ao jornal O Estado de S. Paulo, ele afirmou que, apesar de ter sido presidente estadual do PP, não se envolveu com a prestação de contas do partido, questionada na Justiça.
Farra das passagens
Situação peculiar vive o deputado Sílvio Costa (PTB-PE). Até o ano passado, ele, como mesmo disse ao Congresso em Foco, estava invicto. Não possuía nenhum processo. No entanto, em 2009, ao participar de um debate na Rádio CBN sobre a farra das passagens, revelada com exclusividade pelo site, ele teria chamado o deputado Raul Jugmann (PPS-PE) de corrupto. ?O debate estava acalorado, e o Jungmann disse que eu o chamei de corrupto?, disse o deputado.
Jungmann, então, entrou com uma queixa crime no Supremo. Por seis votos a dois, os ministros entenderam que o petebista precisava ser investigado para saber se os limites da imunidade parlamentar foram extrapolados. O julgamento ocorreu em 24 de junho do ano passado. Desde então, a ação penal tramita em segredo. O relator do caso é o ministro Marco Aurélio Mello.
Costa não vê problema em fazer parte do Conselho de Ética mesmo enfrentando uma ação penal. Para ele, é preciso diferenciar os casos, ?não colocá-los no mesmo balaio?. O petebista lembra que sua situação não é, por exemplo, de improbidade ou corrupção. A ação penal, ao contrário, dá uma espécie de vantagem, acredita. O pernambucano acrescenta que, ao sofrer um processo por conta de declarações dadas a outro parlamentar, possui mais condições de defender suas posições no colegiado.
Clima
Apesar de uma parte dos conselheiros estarem com problemas na Justiça, o clima entre os parlamentares é de punição. Deputados frisam que, primeiro, é preciso dar sustentação jurídica para recomendar a cassação por um fato ocorrido antes do mandato. “O nosso primeiro desafio vai ser criar a argumentação jurídica necessária para que o caso, anterior ao mandato, seja analisado sem dúvidas, para superarmos esse assunto de vez”, disse o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP).
Até deputados com processos, como Abelardo Camarinha, já se pronunciaram publicamente pela punição a Jaqueline, que pode ser desde uma censura pública até cassação. O presidente do conselho, inclusive, já declarou que ela é ré confessa. Pesam contra ela os seguintes fatores: é de um partido pequeno, está no primeiro mandato e a família, que já foi poderosa no Distrito Federal, está em baixa. ?Ética não caduca?, afirmou Assis Carvalho, durante a sessão de instalação do Conselho de Ética.
Meio a meio
Com a posse do atual conselho, verifica-se que um em cada cinco dos titulares possui processo. A mesma proporção é mantida para os suplentes. A situação é melhor do que há dois anos. Levantamento feito pelo Congresso em Foco na época mostrou que um em cada quatro membros do conselho respondia a procedimentos do STF. Eram eles: Sérgio Moraes (PTB-RS), Wladimir Costa (PMDB-PA), Urzeni Rocha (PSDB-RR) e Abelardo Camarinha (PSB-SP). Os parlamentares acumulavam 21 processos na mais alta corte do país.
Além de enfrentar a desconfiança da população, os deputados ainda precisam superar outro problema. Dos 113 processos analisados pelo Conselho de Ética da Câmara de 2004 a 2010, apenas 17 saíram do colegiado rumo ao plenário com parecer pela cassação do acusado de quebra de decoro. Quatro deles resultaram em cassação pelo plenário. São os 513 deputados os responsáveis por dar a última palavra sobre a postura dos colegas.