José Rodrigues Filho *
Embora se tenha falado muito sobre conluios entres os três Poderes no Brasil, estava se criando uma expectativa de isto poderia desaparecer com os reclamos da sociedade nas ruas por mais justiça, fim da impunidade e o combate à corrupção. Em que pese os méritos da Operação Lava Jato, quando procuradores e juízes foram vangloriados, a empolgação começa a arrefecer, a partir do momento em que se descobre que os privilégios daqueles que se dizem combater a corrupção não diminuíram. Várias empresas foram destruídas, a exemplo da Odebrecht, mas o país mantém uma casta de privilégiados, sobretudo no poder judiciário, que precisa ser analisada diante da estarrecedora falta de transparência.
Infelizmente, a imoralidade desses privilégios tornou-se mais acintosa nos últimos dias, com o pedido de aumento de ministros do Supremo Tribunal Federal. Para alguns políticos, economistas e a sociedade em geral, este pedido de aumento é indefensável e totalmente injustificado, diante da situação em que se encontra o país, com mais de 13 milhões de desempregados e a grande maioria recebendo salário mínimo. É a justiça mais bem paga do mundo praticando a injustiça social. É mais um tipo de privilégio abominável. Com tantos privilégios não se pode pensar em reduzir as altas taxas de assassinatos, estupros, roubos e feminicídios que assolam o país de norte a sul.
Leia também
Com um presidente da Republica com denúncias criminais e um Congresso com vários parlamentares enganchados na Lava Jato começam a surgir na imprensa insinuações de que o momento é propício para o Judiciário reivindicar um aumento salarial em conluio com os Poderes Executivo e Legislativo. Isto merece uma profunda investigação. Será que estamos diante de um conluio com troca de favores? Falar de privilégios e corrupção nos Poderes Executivo e Legislativo é dispensável por já ser bastante conhecidos, porém não é o caso no âmbito do poder Judiciário, onde pouco se fala de suas falhas, muito menos de corrupção e privilégios..
Será que estes privilégios não são formas camufladas de corrupção contra o erário público? Se as estatísticas mostram que a corrupção no poder judiciário é evidente em vários países do mundo, sobretudo na Africa e América Latina, não podemos isentar o Brasil, onde os privilégios são abundantes e opacos. Não há dúvidas de que o poder judiciário no Brasil tornou-se muito poderoso nos últimos anos e sua interferência nos demais Poderes acontece costumeiramente.. A Justiça Eleitoral no Brasil, por exemplo, tornou-se muito poderosa, quando se compara a administração de eleições brasileiras com a de outros países. O próximo governo deve copiar os modelos de administração de eleições nas democracias mais avançadas e acabar com esta Justiça Eleitoral caríssima que se proliferou nas repúblicas bananas da América Latina.
É difícil compreender como um sistema legal dotado de privilégios opacos possa servir para trazer a Justiça para uma sociedade tão desigual. Como pode uma casta de privilegiados, que está entre os mais ricos do país, trazer justiça para a maioria dos mais pobres, incluindo uma pobreza abundante, vivenciando demasiados sacrifícios? Quando se diz que pobre e ladrão de galinha é preso no Brasil, mas os ricos podem desrespeitar a justiça, estamos falando deste sistema injusto, perverso e cheio de privilégios na sua forma e construção. A Operação Lava Lato abriu alguns esperanças, mas os privilégios do poder judiciário estão se tornando tão evidentes, que dificilmente se pode acreditar em mudanças. Além disto, num país de ladrões parece que todos podem ser presos numa instancia e, noutra superior, todos podem ser soltos.
Por mais que se diga que os encontros entre os Poderes, as vezes fora da agenda, estão acontecendo dentro de um diálogo institucional, para tratar de imoralidades como o aumento do poder judiciário, os que estão no andar de baixo começam a perceber como os conluios entre os Poderes ainda continuam uma vergonha nacional. Voltar as ruas contra tantos privilégios é um sacrífico que a sociedade, mais uma vez, não pode descartar. O combate à corrupção deve continuar, baseando-se em princípios da moralidade, igualdade e justiça social. Destruir empresas envolvidas na corrupção, mantendo-se uma casta de privilegiados aplicando a justiça é um exercício fútil e ilusório. A República está destruída, com os privilégios e a corrupção quase intocáveis.
* Professor da Universidade Federal da Paraíba, foi pesquisador nas Universidades de Johns Hopkins e Harvard (USA).
Mais textos de José Rodrigues Filho
Partidos de esquerda e direita no Brasil – muitas bocas arrodeando o cocho político