Lúcio Lambranho, Edson Sardinha e Eduardo Militão
A Câmara pagou oito voos para um colaborador do empresário Fernando Sarney investigado pela Polícia Federal na Operação Boi Barrica. Mesmo não tendo qualquer vínculo funcional com a Casa, Marco Antônio Bogéa usou a cota do líder do PV, Sarney Filho (MA), irmão do empresário, e de outros três deputados entre julho de 2007 e julho de 2008. Bogéa e Fernando Sarney são acusados de participar de um esquema de corrupção em estatais do setor elétrico.
Registros das companhias aéreas aos quais o Congresso em Foco teve acesso revelam que Bogéa voou cinco vezes na cota de Sarney Filho, sempre entre Brasília e São Paulo. Em outras duas oportunidades, ele voou com os créditos da Câmara reservados aos deputados Veloso (PMDB-BA) e Gonzaga Patriota (PSB-PE). No caso de Patriota, a cota foi usada por Bogéa para o trecho Brasília-São Paulo. Já com o benefício de Veloso a viagem se deu entre Brasília e Teresina.
O colaborador de Fernando Sarney foi vigiado pela PF quando levou uma mala de Brasília para São Paulo a pedido do empresário. O voo de Bogéa monitorado pelos policiais federais ocorreu no dia 19 de julho de 2008. Essa oitava viagem também foi paga pela Câmara, emitida numa troca de cotas entre os deputados Carlos Abicalil (PT-MT) e Valadares Filho (PSB-SE), como revelou este site no último mês de março.
De acordo com o relatório da operação, foi Astrogildo Quental, diretor Financeiro e de Relações com Investidores da Eletrobrás, quem entregou essa carga para Bogéa antes do embarque. Quental foi indicado para o cargo pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB-MA), e foi secretário estadual de Infraestrutura do Maranhão no governo de Roseana Sarney (1995-2002).
“Após contato com Astrogildo Quental, onde recebeu uma mala, cujo conteúdo não se pode determinar e, no dia seguinte, embarcou rumo a São Paulo, num voo da TAM, em estado visivelmente tenso, a fim de levar algo a pedido de Astrogildo”, diz o relato dos delegados Márcio Adriano Anselmo e Thiago Monjardim Santos, ambos da Divisão de Repressão a Crimes Financeiros da PF.
Foi a partir da publicação desta reportagem que o Congresso em Foco aprofundou a apuração que acabou resultando na série que revelou o uso indevido de passagens aéreas tanto nas cotas de parlamentares da Câmara como do Senado (leia tudo sobre a farra das passagens).
Antes dessa reportagem envolvendo o filho do presidente do Senado, o site revelou, ainda em agosto de 2008, que o caso já era alvo de uma investigação do Ministério Público Federal (MPF). A apuração tinha como base uma denúncia de peculato e estelionato qualificado contra ex-deputado Lino Rossi (PR-MT), justamente por irregularidades e uso indevido da sua cota.
Na mesma matéria, o Congresso em Foco mostrou que, apesar de ter sido alvo da mesma denúncia envolvendo o deputado do Mato Grosso, o servidor Marlon Melo de Araújo, ex-assessor de Rossi, havia sido contratado, um ano depois, para trabalhar no gabinete do deputado Edmilson Valentim (PCdoB-RJ).
Marlon é um dos seis acusados nesta denúncia do MPF de desviar dinheiro das cotas. Mas o caso do funcionário – que foi exonerado do cargo pelo deputado do PCdoB após ser informado pelo site das acusações – revelava na época como a Câmara não exercia nenhum controle sobre as cotas de passagens aéreas.
Amigo de infância
Procurado na última sexta-feira (8) pela reportagem, o líder do PV informou que cedeu passagens a Bogéa, porque os dois são amigos desde a infância em São Luís. “O Marco Antônio Bogéa é um amigo de infância de São Luís que, na ocasião da emissão das passagens, estava passando por um momento difícil, enfrentando um tratamento de câncer em São Paulo. Eu o ajudei com as passagens como também no tratamento médico”, justificou Sarney Filho por meio de sua assessoria de imprensa.
O site também tentou contato com os deputados Veloso e Gonzaga Patriota, mas não recebeu retorno até o fechamento desta edição.
Rádio Senado
O colaborador do empresário maranhense, segundo a PF, atuava em Brasília como motorista de Fernando Sarney. Bogéa também foi funcionário terceirizado na função de assistente de produção da TV Senado entre os dias 16 de junho de 2004 e 13 de junho de 2007.
Ainda no último dia de trabalho na TV Senado, Bogéa foi contratado pela Adservis Multiperfil Ltda, empresa que tem contrato mensal de mais R$ 331 mil para fornecimento de mão-de-obra para Rádio Senado. Na TV Senado, o funcionário tinha seu contrato terceirizado pela Ipanema Empresa de Serviços Gerais e Transportes Ltda, empresa investigada pelo Ministério Público Federal por supostos contratos irregulares com o Senado.
Bogéa foi procurado pela reportagem duas vezes. Nas dependências da Rádio Senado, afirmou que leu as reportagens do site sobre o uso indevido de passagens aéreas da Câmara, mas preferiu não se manifestar. Ele também não quis responder perguntas sobre seu relacionamento com Fernando Sarney e o uso do bilhete emitido em seu nome por meio da cota do deputado Carlos Abicalil.
Na sexta-feira passada, o Congresso em Foco fez novo contato com Bogéa por meio de seu telefone celular. Ele disse que não poderia falar naquele instante porque estava no trânsito. A reportagem tentou novo contato diversas vezes. Mas o telefone dele encontrava-se desligado.
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