Laurez Cerqueira *
Entrincheirados na Praça de Guerra dos Três Poderes, o Supremo Tribunal Federal, o Congresso Nacional e o governo disparam uns contra os outros.
Alvejados pela Lava Jato, com a prisão de Temer e Moreira Franco, o STF, o Congresso Nacional, particularmente a Câmara dos Deputados, preparam contra-ataques. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, se descola de Bolsonaro.
Parece até que a Lava Jato cumpre instruções, depois da visita do ex-juiz Sérgio Moro e de Jair Bolsonaro à CIA (Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos).
A Lava Jato coloca em xeque o STF, que é quem, em última instância, pode mandar soltar os dois golpistas descartados pelo sistema, arcando com o desgaste da decisão na opinião pública.
Coloca na berlinda Rodrigo Maia, casado com a enteada de Moreira Franco, conhecidos na lista de propinas da empreiteira Odebrecht, respectivamente como “Botafogo” e “Gato Angorá”.
Maia não anda obedecendo comandos do governo, de colocar em votação as tais medidas anticrime de Moro e não está correspondendo à expectativa de aprovar a reforma da previdência do banqueiro Paulo Guedes.
O ataque deixou sinais evidentes de que, depois do desabamento do governo nas pesquisas e da viagem aos Estados Unidos, Bolsonaro e Moro tendem a usar a Lava Jato como arma para constranger e tentar subordinar o Congresso, o STF, e outros tribunais superiores.
Os sinais são de que a Lava Jato ensaia um semestre de prisões a torto e a direito como estratégia para encobrir o desastre do governo, negócios e negociatas de entrega do patrimônio público, a falta de projeto e de saída para a crise econômica, política e institucional do país.
Agonizando no desprestígio, depois de ser desmascarada, revelada como organização política que persegue adversários e protege os seus, a Lava Jato poupou Michel Temer e outros políticos corruptos enquanto interessavam ao golpe.
Procuradores afirmam que o esquema de corrupção de Temer funciona há mais de 40 anos e que foram desviados um total de mais de R$ 1,8 bilhão. Então chegou a hora do descarte dos artífices do golpe de estado, é isso? Se é isso, Romero Jucá, José Serra, Aloysio Nunes Ferreira, Aécio Neves, e outros, também serão presos?
O STF foi parte do golpe. Engavetou a ação de inconstitucionalidade do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, mantém o ex-presidente Lula preso, negando a ele o recurso a que tem direito sobre a decisão da segunda instância.
A Lava Jato foi tardiamente enquadrada pelo STF. Só depois de barrada a candidatura de Lula à presidência da República é que foram decididas a transferência dos processos sobre “caixa dois” para o TSE e o impedimento de os procuradores botarem a mão em R$ 2,5 bilhões da Petrobras para, entre outras finalidades propostas por Deltan Dallagnol, remunerar polpudas palestras deles, de magistrados e outros espertalhões.
A tensão aumentou depois da determinação do presidente do STF de mandar investigar quem paga as empresas para impulsionar fake news de ataque ao tribunal e seus integrantes.
Melhor seria aproveitar a oportunidade e mandar investigar as denúncias de “caixa dois” que pagou o pool de empresas impulsionadoras das fake news e as “candidaturas laranjas” na eleição do presidente da República.
O processo que investiga as denúncias de fraude eleitoral está nas mãos do ministro do TSE, Jorge Mussi, mas nada acontece.
Nessa guerra entre cúmplices da destruição institucional do país, o STF e o Congresso têm muito mais balas nas agulhas. Podem revidar com instalação de processos de investigação sobre as violações da Constituição e das leis por integrantes da Lava Jato e de tribunais de justiça de primeira instância.
Caso insista na beligerância com as demais instituições da República, Sérgio Moro, o juiz Marcelo Bretas, procuradores e policiais federais, poderão acabar nos bancos das CPIs no Congresso Nacional, diante das câmeras, para prestarem conta das flagrantes violações da ordem jurídica do país, de certas transações com o Departamento de Estado e com os serviços de inteligência dos Estados Unidos, aos quais sequer o Congresso Nacional teve acesso.
Por outro lado, parece que Moro esqueceu que, se pretende ser ministro do STF terá que beijar a mão de muitos senadores. Afinal, quem aprova ou rejeita o nome de ministros dos tribunais superiores é o Senado.
Além disso, uma retirada cirúrgica do capitão Jair Bolsonaro do cenário político pode evoluir com as investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco. O Ministério Público do Rio de Janeiro diz ter provas mais que suficientes para condenar os dois ex-policiais militares presos acusados de serem os assassinos de Marielle. As relações dos milicianos presos com a família Bolsonaro são de muita intimidade. Falta muito pouco para se chegar aos mandantes.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, se quiser entrar para a história, deve sair da condição de office boy de Jair Bolsonaro na Câmara, bancar uma CPI que investigue as ligações da família Bolsonaro com as milícias no Rio de Janeiro, o possível envolvimento com o assassinato de Marielle, as denúncias de uso de “caixa dois” no financiamento da campanha eleitoral do presidente da República e o desvio do dinheiro do Fundo Partidário, do PSL, nas “candidaturas laranja”. Ou a responsabilidade de integrantes da Lava Jato pela quebra de grandes empresas brasileiras de engenharia.
A cirurgia pode ser rápida. Se o TSE também decide ir fundo nas investigações das fake news, do “caixa dois” das “candidaturas laranja”, a chapa Bolsonaro-Mourão pode ir para o espaço.
Rodrigo Maia assumiria, por um período de 90 dias, para realizar novas eleições.
Esse seria o melhor dos mundos para a democracia e para o país. O povo seria chamado a realizar um grande debate nacional e decidir o destino do país. Mas os entrincheirados da Praça dos Três Poderes não demonstram preocupação com o país. Parecem dominados por suas vaidades pessoais. Faltam lideranças de porte, gente como Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Lula, Leonel Brizola.
Enquanto isso, a economia afunda, o desemprego estrutural explode, a pobreza se espalha pelos campos e cidades e o país derrete institucionalmente.
O Brasil poderia ter dado um salto civilizatório extraordinário, se a Lava Jato fosse realmente uma ação de combate à corrupção, instituída para esse fim, e agisse respeitando os marcos legais e a Constituição. Mas se revelou uma organização política. Não se combate a corrupção corrompendo a Constituição, as leis e os direitos dos cidadãos, por mais errados que sejam.
* Laurez Cerqueira é jornalista