Antônio Carlos de Almeida Castro*
“De tanto se repetir uma mentira, ela acaba se transformando em verdade.” (Joseph Goebbels)
Quando a operação Lava Jato começou, o setor estruturado do marketing fez uma opção que considerei infantil e maniqueísta, mas que se revelou eficiente. As pessoas que ousassem apontar excessos eram tachadas de contrárias ao combate à corrupção.
Como se a dita operação fosse a solução dos problemas do Brasil, quase uma entidade divina para dar respostas a todas as perguntas existenciais do brasileiro, entoando: pergunte à Lava Jato.
Essa opinião falsa e covarde tomou ares de verdade. O que interessava era calar qualquer crítica. Com o sucesso, resolveram ir além. Usaram o prestígio da operação para encampar alguns projetos pessoais ou das instituições e aperfeiçoaram a estratégia. Tudo o que fosse contrário aos interesses era apontado como forma de tirar credibilidade.
Essa ousadia se cristalizou com a espetacularização do processo penal. A lei de abuso de autoridade surgiu quando do Segundo Pacto Republicano de Estado, em 2009. Redigida por um grupo de juristas, entre eles o ministro Teori Zavascki (1948-2017), foi exposta como um projeto do senador Renan Calheiros (MDB-AL) para conter a Lava Jato.
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Um projeto anterior à operação, mas que operadores da Lava Jato temiam, foi deturpado sem pudor.
As tais dez medidas, apregoadas como sendo contra a corrupção, nenhuma relação tinham com o combate à corrupção. Visavam a diminuir o escopo do habeas corpus, fazer valer a prova ilícita no processo penal, instituir um teste fascista de integridade. Aqueles que criticamente se propunham a fazer o debate das dez medidas eram apontados como contrários à operação.
O momento mais significativo foi quando do julgamento do afastamento da presunção de inocência pelo STF e no julgamento sobre a prisão em segundo grau. Aqueles que ousaram discutir a constitucionalidade foram tachados de inimigos da sociedade.
O juiz universal de Curitiba chegou a cometer a ousadia de, em público, pedir ao presidente da República que interferisse no julgamento do Supremo.
Nenhuma relação com a Lava Jato tem a discussão da prisão obrigatória após segunda instância. Ao contrário, trata-se de medida que atinge milhares de desassistidos, sem rosto e sem voz. Infelizmente, essa discussão será recrudescida pelos que querem a prisão de Lula após o julgamento do TRF-4. É a jurisprudência de ocasião, própria do momento de ativismo judicial.
Também o despacho do ministro Gilmar Mendes sobre o uso da condução coercitiva foi atacado como uma forma de tirar o poder. Bastou vir a liminar para que o setor estruturado de marketing fizesse uma campanha mostrando que a Lava Jato estava em risco. Falso, desleal.
A mais recente investida foi contra o indulto de Natal, uma tradição humanitária. Sob o frágil pretexto de que seriam indultadas pessoas envolvidas nas investigações, investiu-se contra o indulto. Os reais prejudicados são pessoas que fazem parte da tradicional clientela do sistema penal brasileiro: negros, pobres e despossuídos.
Há três anos corro o país em debates frequentes para apontar os excessos, denunciando essa estratégia perversa e irresponsável. A resposta, de maneira infame, é dizerem que se trata de artimanha da defesa contra a Lava Jato.
Todas estas questões são colocadas maldosamente, como se fossem para atingir a operação. Faz lembrar a inteligente propaganda do posto Ipiranga: tudo você encontra lá. Qualquer discordância com os detentores da virtude e da verdade será vista como ofensa à Lava Jato. Qualquer reclamação terá de ser feita lá no posto Ipiranga.
Deviam ler Pessoa: “Aos que a fama bafeja, embacia-se a vida”.
*Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, é advogado e tem 21 clientes em processos da operação Lava Jato