Marcos Magalhães |
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Antes apontada como quase unanimidade nacional, no meio político, a política externa brasileira começa a se transformar no mais novo cenário dos embates parlamentares entre governo e oposição. Uma pequena prévia desse debate ocorreu durante a eleição e a posse do novo comando da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CRE) da Câmara dos Deputados, nesta semana. A eleição foi tranqüila. O deputado Carlos Melles (PFL-MG), ex-ministro do Esporte e do Turismo no governo de Fernando Henrique Cardoso, foi escolhido presidente da comissão dentro de um ambiente de consenso. As diferenças começaram a aparecer nos pronunciamentos que ocorreram após a posse dos eleitos para a nova Mesa. Enquanto integrantes da base governista repetiam críticas ao “imperialismo norte-americano” e advertências contra a criação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), o deputado Roberto Brant (PFL-MG) – ex-ministro do governo anterior, como Melles – preferiu fazer uma crítica direta ao que chamou de “partidarização” da política externa do atual governo. As novas diretrizes adotadas pelo Ministério das Relações Exteriores, disse Brant, contêm um “forte viés ideológico”, que poderia colocar em risco os interesses econômicos do país ao redor do mundo. Por outro lado, acusou, a base governista estaria promovendo o que chamou de “aparelhamento” do Itamarati, que, por sua vez, estaria elaborando a nova política externa “de costas para a sociedade”. Segundo Brant, a CRE deveria promover uma “severa fiscalização” do trabalho da diplomacia brasileira e garantir que a política externa brasileira seja tema de amplos debates na comissão. O conterrâneo e correligionário Melles concordou com a necessidade de abrir a comissão a discussões com “todos os segmentos da sociedade”, especialmente em um ano marcado pela reta final das negociações para a criação da Alca e o estabelecimento de um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Européia. Mas fez questão de observar que sua eleição ocorria em clima de consenso entre a base governista e a oposição. “Quando souberam no PT que o indicado pelo PFL para a comissão era eu, ficaram felizes”, ressaltou. Pragmático, o novo presidente da comissão – engenheiro e empresário – lembrou que o principal objetivo da política externa brasileira deve ser a geração de empregos, por meio do estímulo às exportações e à abertura de mercados, e disse que a comissão precisa promover a integração das Américas, começando pelo Mercosul. A aproximação com os vizinhos sul-americanos promete continuar como tema pacífico entre os parlamentares, mas o mesmo não se pode dizer da busca de um acordo de livre comércio para todo o continente. Poucas horas antes da reunião da CRE, a deputada Maria José Maninha (PT-DF), escolhida vice-presidente da comissão, lembrou relatório recentemente divulgado pela Organização das Nações Unidas (ONU) sobre os escassos resultados da globalização, durante reunião da Confederação Parlamentar das Américas, realizada na Câmara, ao defender a rápida criação de um parlamento intercontinental, capaz de ampliar o debate sobre a integração. “Não podemos nos esquecer que estamos em pleno processo de negociação da Área de Livre Comércio das Américas e é nosso dever criar condições para que as discussões econômicas ganhem o fórum político que ampliará sua repercussão e possibilitará a criação de uma receita de integração econômica que inverta a prioridade do desenvolvimento sem causar traumas”, afirmou a deputada. O novo fórum pode demorar, mas a discussão sobre o modelo de integração continental e sobre a própria política externa promete ganhar fôlego no Congresso Nacional. |