Neste final de ano, depois de ter apostado na mega-sena da virada, cheguei mais uma vez à conclusão de que odeio filas e sou partidário incondicional da ilusão e dos enganos. Também resolvi dar mais um crédito às mulheres que não me quiseram, espero que elas façam o mesmo. E é claro que o sentimento de mais um ano meia-boca que passou e a esperança de que no próximo ano tudo vai ser menos insosso, revigorou – vejam só – minha crença no imponderável. De repente, meio que de carona nesse sentimento brega, resolvi acreditar que Deus existe.
Todo final de ano é assim. E parece que nesse final de 2011, depois da morte de Christopher Hitchens, o assunto tornou-se obrigatório na pauta dos feios, sujos e malvados. Na Folha, o portuguesinho das segundas-feiras e a Monga da PUC (nada a ver com o Macaco Simão) enalteceram o inglês , todos eles e mais os blogueiros furiosos da Veja, escreveram o necrológio do homem que processou Madre Teresa de Calcutá, para desespero do Laerte, o cartunista, digo, para a indignação da tia Neném que chegou a mandar carta pro Painel do Leitor reclamando da Monga, e assim por diante.
Mas por que Deus, outra vez?
Uma coisa vou dizer, e até eu fico chocado com isso: é por absoluta falta de opção.
E eu fico aqui pensando comigo mesmo. Não é melhor acreditar nos pássaros, nas cachoeiras e no azul do céu sobre nossos cornos, nos anjos, querubins & serafins que iluminam o quarto das crianças que morreram antes do tempo, enfim, não é preferível acreditar que Deus inventou o arco-íris depois da chuva e mais os bifes de alcatra e a umidade que brota de dentro das mulheres, e que realmente Deus existe, do que acreditar no mundo chato que o Dráuzio Varella inventou pra gente?
Uma praia isolada no final do mundo, gaivotas, o vento batendo na janela, uma índia pelada na sua cama de pernas abertas e a farmácia mais próxima a dois dias de viagem: a pele macia de Oxum. Isso. Ou dr.Vampirinho Varella dizendo que sua felicidade pode matá-lo se você não usar camisinha? Deus ou Draúzio? Pensem a respeito, e se quiserem trocar a praia paradisíaca por um hotel fuleiro no largo Paissandu, e a índia por um travesti, dá quase na mesma.
Se acredito em Deus e nos seus subprodutos, o diabo incluído, e nas ilusões todas, nos sofismas, nas parábolas e nas elipses, e enfim, se acredito no Pai, no Filho e no Espírito Santo e em coisas improváveis, tipo 800 virgens no paraíso e viagras cósmicos, ora, se troco umas idéias com Exu-Caveira e empenho promessas a Santa Edwiges, e se me distraio, ocupo meu tempo e me divirto com essas baboseiras ainda em vida, não lhe parece razoável, caro leitor, que – depois de morto – eu, o incauto que viaja na maionese, também tenha o direito de permanecer mergulhado na ilusão e na inverossimilhança?
Em outras palavras: ainda que não exista nada do lado de lá, o lucro para quem se iludiu com a vida, e acreditou nos enganos, está garantido. Antes da morte, existia vida?
A fraude, a meu ver, é mais do que válida para quem perdeu uma vida fumando escondido, pagou o IPTU em dia, acreditou em Lei Rouanet. Pra quem nada teve aqui, nada lá tá bom demais. Independentemente do querer, e eu quero, todos enganamos e somos enganados. Até no Apóstolo Valdemiro Santiago e no talento do Luan Santana, se quiser, eu acredito e ninguém tem nada com isso.
A vida é ilusão. Vide Buda, Calderón de la Barca, Benito di Paula, Cervantes etc. Por que a morte não pode ser outra trapaça?
E é precisamente aqui que a porca torce o rabo.
Eu escolho os meus enganos, erro nos meus alvos. E nenhum doutor Dráuzio, ninguém tem nada com isso. Embora – como disse o Furio Lonza – o livre-arbítrio seja mais veemente nos urubus que, afinal, nascem brancos, eu ainda acredito que exista liberdade para escolher os lugares errados nesse mundo, viver do meu jeito,cometer meus vexames, brigar com meus amigos e amar as mulheres que não me quiseram. Querem saber? Não uso camisinha e o problema é meu e das malucas que são alérgicas a látex e urram com suspicious mind na hora do sexo. Elvis na pelvis.
Nenhum ateu xarope e mal-humorado vai me dizer que Deus não existe. Bem como a bispa Sônia jamais vai me convencer do contrário. Como é que a micose de unha existe, como é que o Kassab existe e Deus não existe?
Ora, eu acredito no coelhinho da Pascoa e não acredito em arroz integral. Repito. Ninguém faz escolhas por ninguém e, a partir de agora, fica decretado que a soja faz mal à saúde, porque assim eu quero. Me leva pra Pasárgada, Bandeira.
Eu não quero ser enganado por qualquer mané. Aqui vai: em 2012 ninguém vai meter o bedelho na minha vida e na vida de ninguém. Nenhum higienista do PSDB, nenhuma nutricionista que nunca experimentou o cabrito do Nova Capela, nem tampouco os xaropes que vibram com o Krishna do Nando Reis, terão o direito de dar pitacos nas escolhas alheias. Sem estilo, não.
A partir de agora e para sempre, dispenso a cartilha do Bolsonaro e a cartilha dos gays, os chiliques do Malafaia e o botox da Marta Suplicy. Não preciso ser enganado pelos outros. O auto-engano e o voto nulo são minhas bandeiras. E eu desejo a essa gente que come pizza de chocolate que morra engasgada.
Por que não posso acreditar num Deus displicente se me fio numa memória que me trai o tempo todo? Eu acredito no Felipão! Ora, apesar da crueldade das mulheres, eu acredito no amor das mulheres, creio em peitinhos mexericas servidos à la carte e sobretudo nos beijos de mau-hálito depois de uma noite de sexo quase familiar, e se no dia seguinte esse beijo de cigarro e conhaque se repete até na hora de embarcar a amada no táxi que parte para nunca mais, é porque apesar da mentira da noite passada, as mãos que escorregaram na hora do adeus e o hálito de cemitério existem, oh Deus!, existem para sempre! Numa coisa acredito: é desse material que são feitas as mentiras mais bonitas.
Ah, eu acredito em tanta merda, tenho uma boa vontade danada com meus traidores e, às vezes, chego até a perdoar só para confirmar que a traição é mais previsível que o perdão e que, ambos, são faces da mesma moeda e irão prevalecer porque ninguém inventou nada melhor do que o amor e o ódio para dar uma liga nesse treco que chamamos “um dia depois do outro”, ah, são tantas mentiras que nos arrastam pro fundo do poço… tanta merda que eu fico aqui pensando com meus botões: vai sobrar pro Papai Noel.
E sobrou. Aliás, nunca o bom velhinho foi tão maltratado e difamado como nesse último natal. O povo do facebook tava puto com ele. Relax, Grima. Mesmo assim, eu sigo acreditando em Papai Noel. Nele e no Mustafá Contursi.
E tem mais. Acredito que 2012 será um ano maravilhoso pr’aqueles que advogam as causas da insensatez e as causas perdidas em geral, e se eu quiser acreditar que existe uma conexão entre os maconheiros da USP e a primavera árabe, estarei forçando um pouco a barra, mas mesmo assim o problema é meu e ninguém, a não ser dona Marietta que paga minhas contas, ninguém tem nada a ver com isso. Se eu tenho um milhão de amigos no facebook, e se eu existo aqui no Congresso em Foco há três anos, por que não posso chegar ao final dessa crônica e desejar um feliz ano novo pros meus leitores mais soturnos?
Isso aí, feliz 2012 para vocês, e beijos no coração. “Beijos no coração”? Não! Aí também já é abusar do estilo, que existe, quero crer, para infernizar a vida daqueles que não têm talento.
Mas se o cara tiver estilo, tudo bem. Pode acreditar em Deus e na vida antes e depois da morte e desejar beijos no coração dos leitores do Christopher Hitchens. Então, só pra sacanear, acredito que exista um sítio que Deus reservou para os céticos, feios, sujos e malvados. Um lugarzinho batuta pro azar do Christopher Hitchens, que, agora, vai ter que dividir sua descrença com o Saramago, lá no ranchinho dos ateus – que é o mesmo dos marxistas. Tão fudidos.
Acreditem ou não, feliz ano novo.