Na volta ao Brasil passei um dia em Frankfurt com meu amigo Daniel Cohn-Bendit, co-presidente do bloco verde no Parlamento Europeu, para tratar de um convite que me fez para apresentar em novembro, no Parlamento Europeu, uma exposição sobre a Conferência Rio + 20. Desejam que eu, enquanto presidente da sub-comissão da Câmara para a Rio + 20, lhes explique o que estamos pensando para esse evento que vai se realizar em 2012 no Rio, no vigésimo aniversário da histórica Rio 92.
No hotel, tivemos uma longa conversa e ele me pediu para que lhe explicasse a crise do PV no Brasil e a saída de Marina, o que fiz em detalhe. Depois, fomos dar uma volta pelo centro de Frankfurt, cidade de 600 mil habitantes, onde fica concentrada boa parte da riqueza da Alemanha. A cidade é governada por uma prefeitura que une democratas-cristãos e verdes, o que não segue o alinhamento nacional dos verdes com a social democracia. Há várias outras situações locais desse tipo. São aceitas sem problema por serem baseadas em acordos programáticos claros e transparentes. Levando em conta os 26% que os verdes tiveram em Frankfurt, sua participação na prefeitura é muito influente: cuidam da saúde, educação, meio ambiente e trânsito. Especula-se a a próxima prefeita poderá ser a atual secretária de saúde verde Manuela Rothman, mas ela ainda não decidiu se será candidata.
A cidade tem uma qualidade de vida extraordinária. Intenso uso da bicicleta e um convívio cidadão muito característico que notei, por exemplo, na forma com que a população, inclusive as crianças, se apropriam do espaço do centro da cidade num dia de semana.
Dany foi, no passado, o secretário de assuntos multi-culturais de Frankfurt, antes de voltar ao Parlamento Europeu, pelos verdes franceses. Anteriormente já fora deputado europeu pelos verdes alemães. Aproveitamos para colocar as conversas em dia e falamos da crise econômica global, que naquele dia ganhava as manchetes. Um apanhado rápido do que disse Dany-le-vert:
E a crise econômica?
A verdade é que ninguém sabe o que vai acontecer. A sensação que tenho é que, ao final de tudo, o sistema financeiro internacional, os bancos, todo esse capitalismo especulativo que nas últimas décadas vinha dando a dinâmica da economia global, vão sofrer grande perdas e uma derrota. Vamos voltar a ter um novo ciclo de regulamentação, mas o desafio aí vai ser como podemos avançar na governança supra-nacional. Por mais que os governos não se entendam nos últimos dias, o papel do Banco Central Europeu foi importante. Estamos em território nunca d’antes explorado e, pessoalmente, não penso que o euro esteja em risco de acabar ou de países saírem do euro – como fariam com a massa circulante em cada país? Penso, porém, que uma nova governança vai ser construída e o capital financeiro vai ter que ser enquadrado. A crise tende a promover alternâncias, e pode ser que dentro de três anos tenhamos governos de esquerda aliados aos verdes na Alemanha, França e Itália. Isso pode propiciar massa crítica para novas políticas.
Mas a Alemanha não vai bem economicamente?
Sim, mas o paradoxo é que as pessoas não aceitam mais esse “vai bem” para um segmento muito restrito. Em épocas anteriores, tivemos crescimento econômico que beneficiava à maioria, hoje é restrito a alguns poucos segmentos, mesmo na Alemanha, e as pessoas não aceitam mais isso. É como na primavera árabe: há uma exigência de justiça por sobre tudo.
E os verdes na Alemanha?
Bem, aqui venceu-se uma guerra cultural. Nossas idéias tornaram-se praticamente majoritárias na sociedade, e um grande símbolo disso foi a renúncia às usinas nucleares, depois do acidente de Fukushima. Os verdes agora se estabilizaram acima de 20%. Há pesquisas que nacionalmente lhes dão 23%, até mais. Evoluíram de um patamar de 10%, nos anos 90, para 20%. Junto com a social-democracia, o bloco já obtém 51%. Os liberais (aliados de Angela Merckel) estão abaixo de 5%, ficariam de fora do Congresso. Mas as eleições são em 2013. Falta bastante tempo.
Na França, a juiza Eva Joly derrotou o megacomunicador Nicolas Hulot nas primárias dos verdes…
Ela trabalhou melhor a base, os militantes. Hulot sempre chega atrasado, deveria já ter participado das eleições européias conosco. Como foi um universo eleitoral muito restrito não conseguiu, embora tenha um bom discurso. Mas a situação de Eva também não será simples. As eleições presidenciais na França são sempre complicadas para os verdes e se houver algum risco da Marine Le Pen ir ao segundo turno com Sarkosy haverá um voto útil muito grande nos socialistas. Pessoalmente penso que devemos focar nas eleições para a Assembléia Nacional que, em função do voto distrital, dependem de um bom acordo com os socialistas.
E o Straus Kant, que coisa???
Independentemente dele ter ou não violentado a camareira, isso nunca vamos saber ao certo, um alguém que aspira a presidência não pode ser a esse ponto dominado por seus impulsos. Os socialistas estão numa situação complicada, mas optaram por uma eleição primária totalmente aberta. Qualquer um pode votar.
Mesmo eleitores da direita? O Sarkosy não pode mandar a turma votar no mais fraco?
Depende do comparecimento. Se forem milhões de eleitores, fica impossível, você pode mobilizar uns dez mil, no máximo, para esse tipo de coisa. Na França o voto se dá nos distritos e seria perfeitamente possível perceber os eleitores de direita votando. Não penso que isso vá acontecer. Vão votar os eleitores de esquerda de uma forma geral…
E seus próprios planos?
Vou deixar o parlamento europeu no final deste mandato, já são 20 anos, chega. Estou me preparando para fazer um filme no Brasil, na Copa de 2014. Com 6 equipes, vamos acompanhar o antes, durante e depois de 6 brasileiros. Já temos dois: Gilberto Gil e Sócrates. Estou indo ao Rio no final deste mês para o Blask2Black, para uma mesa redonda com Marina Silva.
Dois vídeos que fiz para o Youtube em Frankfurt:
Pelas ruas com Daniel Cohn-Bendit:
A cultura urbana da bicicleta: