Ronaldo Brasiliense*
O fantástico Valdir Pereira, o Didi, autor da folha-seca, um dos melhores lançadores de bola da história do futebol mundial, era – como uma espécie de precursor de Romário – preguiçoso nos treinos. Decididamente, não se empenhava nos treinamentos da semana para se dedicar o quanto podia, registram os cronistas esportivos da época, à sua paixão maior: Guiomar, a mulher da sua vida. “Treino é treino, jogo é jogo”, desculpava-se o craque Didi, um exemplo ainda hoje. Até na política.
O lançamento da candidatura do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, à presidência da República pelo PSDB, lançou luzes sobre o quadro sucessório e não há dúvidas de que os tucanos se coligarão com o PFL. As duas últimas pesquisas sobre a sucessão presidencial divulgadas recentemente (Ibope e Datafolha) mostraram a liderança e o favoritismo do presidente Lula, mas são apenas fotografias de momento.
Alckmin, segundo o Datafolha, cresceu seis pontos, passando de 17% para 23%, num cenário em que o candidato do PMDB é Anthony Garotinho. Já o presidente Lula oscilou de 43% para 42%. O governador paulista cresceu quase o dobro em praticamente todos os segmentos e regiões, o que mostra que o que estamos vendo é um simples treino e ainda há muito jogo pela frente.
O aumento do salário mínimo para R$ 350, a inflação em baixa, os R$ 400 milhões liberados às pressas, sem licitação, para tapar buracos das estradas federais, os programas habitacionais adubados com dinheiro da Caixa e o aumento no mensalinho da Bolsa-Família, beneficiando 11 milhões de famílias, principalmente na região Nordeste, fazem parte do pacote de bondades que alavancou a popularidade de Lula.
Mas os líderes petistas no Congresso e os ministros de Lula parecem que trabalham contra. É só ver o recente festival de bobagens patrocinado pelos senadores Tião Viana (PT-AC) e Ideli Salvatti (PT-SC), como o mandado de segurança estapafúrdio ao Supremo Tribunal Federal (STF) impedindo o caseiro Francenildo dos Santos – da mansão da República de Ribeirão Preto – de depor na CPI dos Bingos, e o requerimento solicitando o acesso às fitas do sistema interno de TV para verificar a movimentação do caseiro Francenildo Santos Costa no interior do Senado. E quem garante que não foi um petista de alto coturno quem quebrou na marra o sigilo bancário do caseiro Nildo?
Tudo isso é treino para o jogo eleitoral de outubro, diria o mestre Didi. Não dá para dizer agora, antes de o STF decidir se haverá ou não verticalização das coligações partidárias, antes da definição do PMDB sobre lançar ou não candidato próprio ao Palácio do Planalto, e antes da Copa do Mundo da Alemanha – quando os brasileiros estaremos entorpecidos pela pátria de chuteiras e esqueceremos essa política de negociatas – que já está definido o que vai sair das urnas nas eleições de outubro. Os times ainda nem entraram em campo. Não se sabe sequer quais jogadores serão escalados.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) terá a árdua missão de tornar o processo mais democrático. Instituir medidas básicas, como a prestação de contas da campanha em tempo real, pela internet, e punições exemplares para a compra de voto são questões que devem ser solucionadas no curto prazo.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) lançam no dia 3 de abril, com outras 20 entidades da sociedade civil, a Campanha Nacional de Combate à Corrupção Eleitoral. O Brasil inteiro torce para que o processo eleitoral deste ano seja o mais democrático possível. Que o abuso do poder econômico seja coibido com rigor pela Justiça Eleitoral; que o caixa 2 – que não será extirpado e quem acredita nisso crê, também, em Saci Pererê – seja combatido e que o eleitor seja sábio ao analisar as candidaturas postas à mesa.
É preciso também que se estabeleçam regras claras sobre o uso da máquina pública na campanha eleitoral. Com a reeleição, o presidente da República, os governadores e os prefeitos podem concorrer a um segundo mandato no exercício do cargo e toda inauguração de obra, por mais ordinária que seja, vira comício eleitoral. E o pior: os gastos com publicidade feitos para enaltecer a inauguração de algumas obras, federais e estaduais, muitas vezes superam inclusive o valor investido para a execução da própria obra.
Não votar em candidato que tem a vida marcada por atos de corrupção é o primeiro passo. Fiquem atentos aos políticos candidatos que enriqueceram na vida pública. Quem ganha R$ 8 mil como governador de Estado, senador da República ou deputado federal, a não ser que tenha recebido herança, não pode exibir em suas declarações de Imposto de Renda fazendas de gado, grupos de comunicação, carros importados, enfim, patrimônio de milhões de reais. Como dizia o sábio Didi: “Treino é treino, jogo é jogo”. E o jogo eleitoral só está começando.