É preciso mesmo tirar o chapéu para Luiz Inácio Lula da Silva. Dono de uma imensa sensibilidade política que não costuma seguir os manuais mais tradicionais da política, Lula vez por outra lembra aquele velho bordão do Chacrinha: veio para confundir, não para explicar. É um pouco assim que as coisas vão se desenrolando nas eleições em São Paulo. Elas vão desafiando a lógica de todo mundo. Com exceção, talvez, da lógica de Lula.
Quando, no final do ano passado, Lula sacou da manga a candidatura do então ministro da Educação, Fernando Haddad, comentei aqui que o plano podia dar certo. Lula estava escolhendo a sua Dilma de calças. Como Dilma logo após a sua escolha, Haddad era então um desconhecido da maioria do público e começava num patamar baixo. Mas as pesquisas indicavam uma forte disposição do eleitorado por votar em alguém que Lula indicasse.
Mais adiante, os ventos da política jogavam a biruta para um lado oposto. Haddad patinava, não subia como o previsto. Houve o constrangimento da foto de Lula ao lado de Paulo Maluf. A desistência da deputada Luiza Erundina (PSB-SP) em ser a vice de Haddad em função disso. E os problemas das apostas de Lula em outras capitais, como Recife – estes, ainda não resolvidos. Àquela altura, parecia que São Lula errara, e demonstrava que não era infalível.
Fugindo como o diabo da cruz da pretensão de ser dono da verdade, reforcei acima, com os devidos links, erros e acertos de avaliações anteriores. Quem corre atrás de pitonisas, deve, talvez optar pela astrologia, e não pelo jornalismo. As colunas são retratos do momento. E, na política, dizia Magalhães Pinto, os momentos mudam como as nuvens: você olha, está de um jeito; olha de novo, está de outro.
Assim, o comentário aqui vai se referir sobre o retrato de agora. Se assim será em outubro, veremos lá na frente. O retrato de agora, revelado pela última pesquisa Datafolha, dá inteira razão ao raciocínio que Lula teve lá atrás, quando pensou em Haddad para ser o candidato do PT à prefeitura de São Paulo. É o retrato do desgaste dos atores tradicionais da política paulistana e o desejo do eleitorado em apostar em algo novo.
Até aqui, a aposta no novo se consubstancia mais em Celso Russomano. É preciso saber se ele resistirá ao esforço que fazem tanto o PT quanto o PSDB para mostrá-lo como uma aposta falsa, uma espécie de Fernando Collor, que venderia uma imagem pública diferente da verdadeira. E, então, no desmonte da aposta em Russomano, eis que surge Fernando Haddad.
Na pesquisa, ele aparece tecnicamente empatado com José Serra. Nas últimas rodadas de pesquisa, Serra só vem despencando. Padece de uma altíssima taxa de rejeição. Seguido o roteiro, a tendência é que Serra caia mais e Haddad o ultrapasse, indo ao segundo turno com Russomano. E, aí, a chancela pública que terá de Lula e da presidenta Dilma Rousseff poderá pesar a seu favor, e contra Russomano.
E, aí, o golpe fatal no PSDB. Quando a aposta em Haddad parecia uma furada, os tucanos se animaram e botaram José Serra na disputa. O resultado da pesquisa agora só demonstra o seu desgaste. Os paulistanos acham – com razão – que Serra, caso eleito, os deixaria de novo na mão para tentar novamente a Presidência da República ou o governo do estado. E, assim, ele, pela desconfiança, cai. Se não for sequer para o segundo turno, Serra amargará um impressionante declínio político. Como Aécio Neves não diz ao que veio, o PSDB fica em sérios apuros para seus planos futuros.
Se Aécio estiver correto no seu estilo exageradamente low profile, conseguirá ser ainda mais surpreendente do que tem sido Lula. Inaugurará o estilo invisível de se fazer política. É improvável que dê certo. Serra sai do páreo, Aécio não entra nele, Dilma bate recordes de popularidade. E se Lula conseguir eleger sua Dilma de calças, vai se manter no centro da ribalta política. De onde nunca planejou mesmo sair. Para, daí, dedicar-se a uma nova proeza: reconstruir o antigo PT, que, tudo indica, sairá combalido do julgamento do mensalão. Ele mesmo, aquele que disse que ia provar que o mensalão era uma farsa, vai se reinventar de novo e reinventar seu partido a partir das Dilmas e Haddads que escolheu. Mas isso já é tema para uma outra coluna.