Hoje me sinto mais forte,
Mais feliz, quem sabe,
Só levo a certeza
De que muito pouco sei,
Ou nada sei.
(Trecho da música “Tocando em Frente”, de Almir Sater)
A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.
Quando se vê, já são seis horas!
Quando se vê, já é sexta-feira…
Quando se vê, já terminou o ano…
Quando se vê, perdemos o amor da nossa vida.
Quando se vê, já passaram-se 50 anos!
Agora é tarde demais para ser reprovado.
Se me fosse dado um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio.
Seguiria sempre em frente e iria jogando, pelo caminho, a casca dourada e
inútil das horas.
Desta forma, eu digo:
Não deixe de fazer algo que gosta, devido à falta de tempo,
pois a única falta que terá,
será desse tempo que infelizmente não voltará mais.
Não conheço nada mais belo na língua portuguesa do que esse poema de Mário Quintana, intitulado “Só um lembrete”. É inspiração de um gênio que, ao compô-lo, já tinha vivenciado toda essa experiência de que fala com tanta emoção e em tão poucas linhas. Verdadeira obra-prima de concisão, esses versos são capazes de fazer com que o sentimento “ilhado, morto, amordaçado, volte a incomodar”, como cantou, também com notável beleza, outro inspirado poeta, o cearense Fagner, em Revelação.
Foi a leitura – na verdade, releitura – dessa maravilha de Quintana que inspirou meu artigo desta semana. Não por coincidência, mas pelo fato de eu me enxergar ali, da primeira à última linha. Quando vejo, já são seis horas; quando vejo, já é sexta-feira; quando vejo, já terminou o ano; quando vejo, já se passaram cinquenta anos…
Sim, amigos, passaram-se cinquenta anos desde que cheguei ao mundo, no dia 18 de julho de 1962, na pequena cidade de Encanto, Rio Grande do Norte, a alguns milhares de quilômetros de onde hoje escrevo estas palavras, em meu gabinete no Gran Cursos, aqui em Brasília. Aquele foi um dia cujos acontecimentos destacados pelos jornais mostravam que o mundo mudara, embora não tanto quanto pensemos: “Deposto pelo Exército o Presidente do Peru, Manoel Prado”, “A Comissão Parlamentar obrigou ontem a venda de feijão ao povo”, “Violentos choques entre guerrilheiros comunistas e tropas do Vietnã, apoiadas por helicópteros norte-americanos”, “Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul concede mandado de segurança a proprietários de terras, contra desapropriações decretadas pelo governador Leonel Brizola”, “Flamengo vai transformar a Gávea no maior centro esportivo do continente”, “Transferência de Amarildo para o futebol italiano vira novela”.
Tantos nascidos naquele 18 de julho já não estão mais entre nós… Tanta gente que naquele dia era notícia na imprensa – ou não – ficou pelo caminho… Mas aqui estou eu, dirigindo um grupo empresarial e em pleno vigor, em meus cinquenta anos de idade, cheio de planos e de projetos para, se Deus quiser, mais meio século de vida. Brincadeira? Exagero? Otimismo desvairado? Não, nada disso. Trata-se de possibilidade concreta. Afinal, hoje me sinto muito mais forte, muito mais vigoroso do que quando tinha a metade da idade que acabei de completar, quando era apenas um professor em início de carreira e sem saber o que o futuro me reservava, contando apenas com a determinação de alcançar tudo aquilo que desejava. Naquele tempo, eu não era capaz de correr uma maratona olímpica, de 42.195 metros, como faço hoje sem a menor dificuldade!
Fui um rapaz que desejava um lugar ao sol, depois de ter vivido a infância e a adolescência na pobreza, no seio de uma família nordestina que migrara para Brasília quando eu tinha oito anos de idade, com a expectativa de dias melhores para mim e meus seis irmãos. Conheço bem o trabalho duro de misturar concreto sob sol ou sob chuva, graças ao meu trabalho de auxiliar de pedreiro de meu pai. Sei o que é carregar marmita para almoçar no trabalho. Sei o que é andar a pé para economizar o dinheiro da passagem. Sei o que é estudar em escola pública. Sei o que é precisar de livros emprestados para poder fazer as lições de casa ou estudar para concursos.
Nada disso, no entanto, me fez desistir do meu objetivo. O caminho para alcançá-lo foi o estudo incansável e a porta da frente dos concursos públicos, que me levaram aonde estou hoje. Por isso, sinto-me muito à vontade para, neste momento de alegria, dizer que espero viver pelo menos outros cinquenta anos e ter tempo para realizar todos os meus projetos. E olhe que estou em muito boa companhia ao ter essa pretensão: “Leva um longo tempo para se tornar jovem”, já dizia o pintor Pablo Picasso, que viveu 92 anos e se manteve ativo e intelectualmente produtivo até o fim de sua existência.
Mas o que mais me enche de energia para encarar a jornada das próximas cinco décadas são os pensamentos de uma mulher que marcou época entre os anos 1960 e 1980, por seu talento e sua beleza extraordinária. Hoje na maturidade, ela dá lições de sabedoria para quem, como eu, entra agora no que ela chama de “terceiro ato da vida”. Refiro-me à atriz norte-americana Jane Fonda, de 74 anos de idade. Leiam o que ela escreveu e reflitam sobre o futuro, assim como eu estou fazendo agora:
“Houve muitas revoluções no último século, mas talvez nenhuma tão significativa quanto a revolução da longevidade. Estamos vivendo, em média, hoje, 34 anos a mais do que nossas bisavós. Pensem sobre isso. Isso é um completo segundo período de vida adulta, que foi adicionado à nossa expectativa de vida. E, ainda assim, para a maior parte, nossa cultura ainda não se posicionou sobre o que isso significa. Ainda estamos vivendo com o velho paradigma da idade como um arco. Essa é a metáfora. A velha metáfora. Você nasce, atinge o auge na meia idade e declina para a decrepitude. Idade como patologia. Mas muitas pessoas hoje – filósofos, artistas, médicos, cientistas – estão lançando um novo olhar para o que chamo de terceiro ato: as três últimas décadas da vida. Eles percebem que isso é, na verdade, um estágio de desenvolvimento da vida com sua própria significância, tão diferente da idade madura quanto a adolescência é da infância. E estão questionando – todos nós deveríamos estar questionando – como usamos esse tempo? Como vivê-lo com sucesso? Qual é a nova metáfora apropriada para envelhecimento?
Passei o último ano pesquisando e escrevendo sobre esse assunto. E descobri que uma metáfora mais adequada para o envelhecimento é uma escadaria – a ascensão para o topo do espírito humano, trazendo-nos para a sabedoria, completude e autenticidade. De forma nenhuma a idade como patologia, mas idade como potencial. E adivinhem: esse potencial não é para poucos felizardos. Acontece que a maioria das pessoas acima de 50 sente-se melhor e menos estressada, e menos hostil, menos ansiosa. Tendemos a ver os itens comuns mais que as diferenças. Alguns dos estudos dizem até mesmo que somos mais felizes.”
É nesse contexto que estou cada vez mais confiante em relação aos meus próximos cinquenta anos. Faço minhas as palavras de Mário Quintana: “A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa”.
Espero continuar fazendo esse dever por muito tempo, da melhor maneira possível, e assim contribuir para que meus atuais e futuros alunos também alcancem o objetivo de se tornar servidores públicos e de desfrutar por muitos e muitos anos o seu
FELIZ CARGO NOVO!