Uma análise sóbria e extremamente informativa é a de Luís Nassif, esta semana em seu blog, sobre as reais chances de Serra (e do “serrismo”) chegar ao Planalto. E já pelo título, “Serra e o fim da era paulista na política”, tudo indica que são poucas, sem contar o probabilíssimo efeito dominó decorrente do mensalão do DEM.
Achei a abordagem tão sóbria e válida que merecia minha atenção especial, uma vez que sou paulistana e sei perfeitamente o que anda acontecendo em Sampa sob os governos tucanos – um desmonte absoluto do Estado, aliada à arrogância dos governantes e um total descaso para com as reais necessidades da população.
Aliás, já isto repito a várias colunas, governantes que “governam” contra os interesses até dos próprios eleitores. Como o Nassif também vive em São Paulo, encontrei fina sintonia com a análise dele e concluí que ela precisava ser divulgada para leitores de outras partes do Brasil. Afinal, o Serra não é pré-candidato a presidente de todos os brasileiros?
Vale conferir:
“Por que José Serra vacila tanto em anunciar-se candidato?
Para quem acompanha a política paulista com olhos de observador e tem contatos com aliados atuais e ex-aliados de Serra, a razão é simples. Seu cálculo político era o seguinte: se perde as eleições para presidente, acaba sua carreira política; candidatando-se à reeleição para governador e o PSDB emplacando candidato a presidente, perde o partido para o aliado. Em qualquer hipótese, iria para a aposentadoria ou para segundo plano. Para ele só interessava uma das alternativas: ele presidente ou; ele governador e alguém do PT presidente. Ou o PSDB dava certo com ele ou que explodisse sem ele.
Esta foi a lógica que (des)orientou sua (in)decisão e que levou o partido a esse abraço de afogado. A idéia era enrolar até a convenção, lá analisar o que lhe fosse melhor.
De lá para cá, muita água rolou. Agora, as alternativas são as seguintes:
1. O xeque que recebeu de Aécio Neves (anunciando a saída da disputa para candidato a presidente) demoliu a estratégia inicial de Serra. Agora, se desiste da presidência e sai candidato a governador, leva a pecha de medroso e de sujeito que sacrificou o partido em nome de seus interesses pessoais. 2. Se sai candidato a presidente, no dia seguinte o serrismo acaba. O clima eleitoral de hoje, mais o poder remanescente de Serra, dificulta a avaliação isenta do seu governo.
Esse quadro – que vou traçar agora – será de consenso no ano que vem, quando começar o balanço isento do seu governo, sem as paixões eleitorais e sem a obrigatoriedade da velha mídia de criar o seu campeão a fórceps. Aí se verá com mais clareza a falta de gestão, a ausência total do governador do dia-a-dia da administração (a não ser para inaugurações), a perda de controle sobre os esquemas de caixinha política.
Hoje em dia, a liderança de Serra sobre seu governo é próxima a zero. Ele mantém o partido unido e a administração calada pelo medo, não pelas idéias ou pela liderança.
Há mágoas profundas do covismo, mágoas dos aliados do DEM – pela maneira como deserdou Kassab -, afastamento daqueles que poderiam ser chamados de serristas históricos. Mas as idéias têm que levar em conta a mudança das circunstâncias e do país.
No governo paulista, não conseguiu levantar uma bandeira modernizadora sequer. Pior: não percebeu que os novos tempos exigiam um compromisso férreo com o bem estar do cidadão e a inclusão social. Continuou preso ao modelito do administrador frio, ao mesmo tempo em que comprometia o aparato regulatório do Estado com concessões descabidas a concessionárias. O castigo veio a cavalo. A decisão de desviar todos os recursos para o Rodoanel provocou o segundo maior desastre coletivo da moderna história do país, produzido por erros de gestão: o alagamento de São Paulo devido à interrupção das obras de desassoreamento do rio Tietê. O primeiro foi o ‘apagão’ do governo FHC.
O Serra que emergiu governador decepcionou aliados históricos. Mostrou-se ausente da administração estadual, sem escrúpulos quando tornou-se o principal alimentador do macartismo virulento da velha mídia – usando a Veja e a Folha – e dos barra-pesadas do Congresso. Quando abriu mão dos quadros técnicos, perdeu o pé das idéias. Havia meia dúzia de intelectuais que o abastecia com idéias modernizantes. Sem eles, sua única manifestação ‘intelectual’ foi o artigo para a Folha criticando a posição do Brasil em relação ao Irã – repetindo argumentos do blogueiro terceirizado da Veja. Ao encampar o estilo Maluf – virulência ideológica (através de seus comandados na mídia), insensibilidade social, (falsa) imagem de administrador frio e insensível, ênfase apenas nas obras de grande visibilidade, desinteresse em relação a temas centrais, como educação e segurança – Serra destruiu a solidariedade partidária criada duramente por lideranças como Mário Covas, Franco Montoro e Sérgio Motta.
Principalmente, chamaram a atenção dois vícios seus, frutos de um personalismo exacerbado. O primeiro, a tendência de chamar a si todos os méritos, não admitir críticas e tratar os subordinados com desprezo, inclusive proibindo a qualquer secretário sequer mostrar seu trabalho. Fundamentalmente, a de exigir a cabeça de jornalistas que o criticavam. O mal-estar na administração é geral. Em vez de um Estadista, passaram a ser comandados por um chefe de repartição que não admite o brilho de ninguém, nem lhes dá reconhecimento, não é eficiente e só joga para a torcida.
O segundo, a deslealdade. Duvido que exista no governo Serra qualquer estrela com luz própria que lhe deva lealdade. A estratégia política de FHC e Lula sempre foi a de agregar, aparar resistências, afagar o ego de aliados. A de Serra foi a do conflito maximizado não por posições políticas, mas pelo ego transtornado. O uso do blogueiro terceirizado da Veja para ataques descabidos (pela virulência) contra Geraldo Alckmin, Chalita, Aécio, deixou marcas profundas no próprio partido. Alckmin não lhe deve lealdade, assim como Aloizio Nunes – que está sendo rifado por Serra. Alberto Goldmann deve? Praticamente desapareceu sob o personalismo de Serra, assim como Guilherme Afif. No interior, há uma leva enorme de prefeitos esperando o último sopro de Serra para desvencilhar-se da presença incômoda do governador.
O que segura o serrismo, hoje em dia, é apenas o temor do espírito vingativo de Serra. E um grupo de pessoas que será varrido da vida pública com sua derrota por absoluta falta de opção. Mas que chora amargamente a aposta na pessoa errada. Aliás, se Aécio Neves for esperto (e é), tratará de resgatar esses quadros para o partido.
Saindo candidato a presidente e ficando claro que não terá chance de vitória, o PSDB paulista se bandeará na hora para o novo rei. O resultado final será o fim da era paulista na política nacional, um modelo que se sustentou décadas graças ao movimento das diretas e à aliança com a velha mídia. Acaba em um momento histórico, em que o desenvolvimento se interioriza e o monopólio da opinião começa a cair.”
Repetindo: se o quadro é sombrio, pode piorar muito graças ao efeito dominó que já atinge os demos aliados.