Erich Decat*
Maior derrota do presidente Lula no Congresso em seu segundo mandato, a rejeição da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) não impedirá o governo federal de arrecadar 10% a mais este ano em comparação com 2007, quando foi registrado o atual recorde de receita.
Depois de acumular R$ 620 bilhões com as receitas primárias no ano passado, o governo espera receber R$ 686,8 bilhões em impostos e contribuições em 2008. O valor equivale a 24,6% do Produto Interno Bruto (PIB) do país e representa um acréscimo de R$ 66 bilhões em comparação com a receita anterior. Ou seja, quase o dobro dos R$ 37,2 bilhões arrecadados ano passado apenas com a CPMF.
Até agora, o desgaste pela derrota foi mais político do que financeiro. A derrubada da contribuição no Senado obrigou a Comissão Mista de Orçamento a rever toda a proposta orçamentária e abriu caminho para novas disputas entre governo e oposição. Com três meses de atraso, somente hoje (12) o Plenário do Congresso deve votar o Projeto de Lei Orçamentária (PLOA) de 2008.
Para a líder do bloco de apoio ao governo no Senado, Ideli Salvatti (PT-SC), o aumento da arrecadação é reflexo do momento atual da economia do país. “A perspectiva de arrecadação se deve ao crescimento do país já confirmado em janeiro e fevereiro. Temos hoje uma perspectiva de crescimento de 6%”, disse ao Congresso em Foco. Quanto ao atraso da votação do Orçamento, a petista aponta a oposição como principal barreira para que a proposta seja aprovada.
Já para o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA), vice-líder da oposição na Casa, a estima de receita para 2008 mostra que o governo fez “terrorismo” ao dizer que o fim da CPMF colocaria em xeque programas essenciais para a população.
“Ele [o governo] de forma terrorista dizia que se caísse a CPMF inviabilizaria a saúde, os programas sociais. A projeção de mais de R$ 60 bilhões de arrecadação em 2008 vem mostrar que o governo usa de meias-verdades para tentar impor as suas teses ao Congresso”, afirmou.
Apenas com o imposto de renda, o governo deve arrecadar este ano cerca de R$ 20 bilhões a mais do que em 2007, quando os contribuintes pagaram R$ 148 bilhões ao “leão”.
Entre outros impostos que deverão reforçar o caixa do governo federal, estão a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) (R$ 115,2 bi), a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) (R$ 40,6 bi), o Imposto sobre Produtos Industrializados (R$ 39,8 bilhões), o PIS/Pasep (R$ 30,1 bi), o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) (R$ 17,5 bi), o Imposto de Importação (R$ 14,6 bi) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) dos combustíveis (R$ 8,5 bilhões).
Uma das medidas adotadas pelo governo para compensar parte da perda da CPMF foi reajustar as alíquotas do IOF e da CSLL do setor financeiro. Com esses dois aumentos, o governo espera arrecadar R$ 10 bilhões a mais este ano.
Ultimatos
As semanas que antecederam a votação no plenário do Congresso do orçamento foram marcadas por ultimatos realizados pela base aliada. Em campo, os presidentes da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), e do Senado, Garibaldi Alves (PMDB-RN), enquadraram, no último dia 26, a Comissão Mista do Orçamento (CMO) ameaçando atropelá-la e votar a LOA sem que a peça orçamentária fosse apreciada no colegiado.
A pressão, que não chegou a se concretizar, abriu espaço para a inclusão, de última hora, do anexo de metas e prioridades no valor de R$ 534 milhões e que acirrou os ânimos entre oposição e governo. O anexo é composto por emendas de bancadas e de parlamentares e tem como principais beneficiários os integrantes da própria CMO.
Em reunião realizada ontem (11), líderes do governo e da oposição decidiram que o anexo será retirado da peça orçamentária. Por outro lado, ficou definido que 50% dos recursos do anexo serão distribuídos por meio do Fundo de Participação dos Estados. Já outros 40% devem ser repassados com base na média dos últimos três anos dos valores aprovados em emendas de bancadas parlamentares.
Lei Kandir
Apesar dos congressistas chegarem a um acordo quanto à votação do anexo de metas, a Lei Kandir (que isenta o exportador de pagar o ICMS) deve gerar discussão nos debates durante a votação do orçamento.
“Ficou um problema, que é o da Lei Kandir, que ainda é uma pendência que temos de resolver”, disse o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM). A proposta aprovada pela Comissão Mista de Orçamento retirou R$ 450 milhões dos R$ 5,2 bilhões previstos para serem repassados aos estados exportadores e repassou o montante para a compra de produtos agrícolas. Segundo o relator-geral do orçamento, deputado José Pimentel (PT-CE), os estados exportadores serão compensados com recursos oriundos do excesso de arrecadação prevista para este ano.
Passo a passo
O sistema orçamentário é composto pela Lei Orçamentária Anual (LOA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e o Plano Plurianual (PPA). É por meio desse sistema que são estabelecidas as despesas de toda a administração pública para serem efetuadas ao longo do ano subseqüente. As propostas que irão compor esse sistema são elaboradas primeiramente pelo Poder Executivo e, em seguida, enviadas para votação no Congresso, onde podem sofrer profundas alterações.
*Colaborou Fábio Góis