No último dia 3, publiquei aqui neste espaço o artigo “Fechado para balanço”. Escrevi que a “cada final de ano o jornal, a rádio, a revista e a TV fazem um balanço dos principais fatos. Geralmente é um balanço incompleto ou falso” e que poderia registrar dezenas de casos sobre o que afirmava, mas que só me limitaria a três exemplos: apagão, inflação e desemprego.
Termino o artigo afirmando que “Seria importante que a grande maioria dos jornais, revistas semanais, rádios e TVs fechassem para um balanço de consciência neste fim de ano. Se fizessem isso, garanto que a maioria não teria moral para reabrir em 2014, ou começaria o ano pedindo desculpas pelas mentiras e manipulações de 2013.”. Termino o artigo fazendo um alerta: “2014 temos eleições. A manipulação e a mentira vão aumentar”.
Como era de se esperar, nenhum veículo fez o balanço de consciência. Sobre 2014, a imprensa de uma maneira geral já iniciou a campanha eleitoral e como se fosse partido de oposição.
Muitos jornalistas, críticos de imprensa, professores universitários e curiosos como eu fizeram o “balanço da imprensa”. O balanço que a própria imprensa não fez. Ainda no ano passado, dia 29 de dezembro, Luis Nassif contribuiu com o balanço publicando em seu blog o artigo “Como os jornalões conseguiram estragar um Natal surpreendente”.
Nassif chama a atenção sobre duas manchetes: uma da Folha (“Comércio tem o pior resultado no Natal em 11 anos”) e uma do Estadão (“Com crédito contido e juros altos, vendas de Natal decepcionam”). Os artigos referentes a essas manchetes foram feitos após análise dos dados fornecidos pela Serasa Experian e pela Alshop (Associação dos Lojistas de Shoppings).
Peço licença aos meus leitores e leitoras, mas para ser fiel ao Nassif, entendo que o melhor é reproduzir o próprio argumento do autor para demonstrar a manipulação da informação. Manipulação, diga-se a verdade, a serviço dos partidos de oposição.
Nassif desmonta a manipulação com a seguinte análise (coloco em itálico para poupar as aspas):
Publicidade1. Erro de manchete: Se em 2013 vendeu-se mais do que em 2012, como considerar que foi o pior resultado em 11 anos?
2. A Serasa trabalha especificamente com pedidos de informação para crédito. Houve retração no crédito, mas a maior ferramenta de vendas tem sido o parcelamento (em até dez vezes) em cartões de crédito e de loja. Os jornalões trataram os dados da Serasa como se representassem o universo total de vendas.
3. As vendas em shoppings deixam de lado o comércio para classes C e D – justamente as que mais vêm crescendo. Mesmo assim, os jornalões trataram os dados como se representassem o todo.
4. A Alshop (Associação dos Lojistas) informou que as vendas cresceram 6% no Natal. O problema maior foi o aumento do número de lojas, que fez com que as lojas mais antigas permanecessem com o mesmo faturamento. Ora, o que expressa o mercado são as vendas totais. A distribuição entre lojas novas e antigas é problema setorial, que nada tem a ver com a conjuntura.
5. Os jornalões deixaram de lado o comércio eletrônico – que tem sido o principal competidor das lojas de shopping. Em 2013 os shoppings centers venderam R$ 138 bilhões, 8% a mais do que em 2012. O comércio eletrônico vendeu R$ 23 bilhões, ou 45% a mais do que em 2012. Somando a venda dos dois segmentos, saltou de R$ 143 bi em 2012 para R$ 161 bi em 2013, aumento de expressivos 12%.
6. Os jornais falam em “decepção”, porque a Alshop esperava crescimento de 10% nas vendas de Natal e conseguiu-se “apenas” 6%. Esperar 10% de crescimento com uma economia rodando a 2% é erro clamoroso de análise. Mas, para os jornalões, o erro está na realidade, que não acompanhou os sonhos.
A imprensa tem perdido a credibilidade e é o que demonstra a pesquisa divulgada em novembro de 2013 pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). A FGV fez a “pesquisa Índice de Confiança na Justiça Brasileira (ICJBrasil), da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) de São Paulo”. O objetivo da pesquisa é a coleta de informações para a publicação do Anuário da FGV.
A pesquisa mediu a confiança de cinco instituições e, entre elas, a dos meios de comunicação. Conclusão: TVs não têm a confiança de 71% dos pesquisados. Quanto aos jornais e revistas semanais, não deve ser longe disso.
“Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data”. Essa frase de Luis Fernando Veríssimo deve ser levada em consideração não só quando se lê o jornal e as revistas semanais, mas também quando se ouve na TV e no rádio. Esses dois podem até falsificar a data do fato, uma vez que não está impressa.