Lúcio Lambranho e Edson Sardinha
Pelo menos dois senadores são citados nas investigações da Polícia Federal que resultaram na prisão dos 47 acusados de integrar a máfia das obras públicas: Renan Calheiros (PMDB-AL) e Delcídio Amaral (PT-MS).
O nome do presidente do Senado aparece duas vezes no documento que a Polícia Federal encaminhou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), na semana passada, para embasar as ações da Operação Navalha. De acordo com as investigações, Renan teria sido procurado para facilitar a liberação de verbas para obras de construção de canais tocadas pela empreiteira Gautama, apontada como carro-chefe do esquema, em Alagoas.
Renan admitiu conhecer Zuleido Veras, dono da Gautama, mas negou ter mantido qualquer relação com aquele que é considerado o chefe da quadrilha. "Nos encontramos algumas vezes, mas não é uma pessoa que me freqüenta nem que eu freqüente. Em Alagoas, todo mundo se conhece", disse o senador, em entrevista coletiva. "Meu nome aparece mencionado por terceiros, o que não tem sentido, porque eu não conheço essas pessoas", completou o senador em referência aos demais envolvidos.
Segundo as investigações da PF, Zuleido teria dito, em conversas telefônicas, que procurara o presidente do Senado para facilitar a liberação de verbas para a Gautama, responsável pela construção da barragem de Duas Bocas/Santa Luzia no Rio Pratagy,
Veja o trecho do relatório ao qual o Congresso em Foco teve acesso:
“Inicialmente, constatou-se que a verba de 15 (quinze) milhões que seria utilizada para pagamento do executado pela GAUTAMA teria sido “apropriada” pela Secretaria da Fazenda. Em conseqüência, ZULEIDO, pessoalmente e por meio de seus funcionários (FÁTIMA, ROSEVALDO e BOLIVAR), procurou de diversas maneiras, especialmente por meio de contatos políticos (Deputado Antonio Albuquerque, Teotônio Vilela, Renan Calheiros), contatar EDUARDO HENRIQUE ARAÚJO FERREIRA, vulgo “CHEBA” (à época, Secretário da Fazenda de Alagoas), bem como servidores da SEINFRA para que disponibilizassem recursos para o pagamento.”
O nome do presidente do Senado aparece ainda em outra conversa telefônica interceptada pela PF. A gravação mostra uma brevíssima conversa entre o presidente da Gautama e Bolívar Ribeiro Saback, funcionário da empresa: “ZULEIDO pergunta quem teria ligado. BOLIVAR diz que Ele falou que teriam ligado: TEO (TEOTÔNIO VILELA), RENAN (CALHEIROS) – CAI A LIGAÇÃO. (28/06/2006 13:54:12)”.
De acordo com a PF, o governador de Alagoas, Teotônio Vilela Filho (PSDB), teria autorizado a execução de uma obra para a Gautama logo após um encontro com o dono da empresa. Os negócios com a empreiteira teriam ajudado o governo de Alagoas a quitar débito com o INSS, porque, inadimplente, o Estado não recebia repasses da União. Ontem o governador negou qualquer envolvimento com o caso e disse que teve o seu nome utilizado indevidamente por ex-auxiliares. Cinco assessores de Teotônio foram presos na Operação Navalha.
Aliado político do tucano, Renan condenou o “vazamento” das “especulações”. “Do jeito que como os fatos estão sendo divulgados é muito ruim para democracia. Não temo absolutamente nada. Não há investimento feito em Alagoas que não tenha a interferência da bancada do estado”, disse Renan.
Jatinho
Já o ex-presidente da CPI dos Correios, Delcídio Amaral, aparece nas investigações da PF como beneficiário de R$ 24 mil da Gautama. O valor teria sido destinado ao pagamento do aluguel de um jatinho no qual o senador viajou. Delcídio admitiu que o empresário pagou a conta, mas rechaçou qualquer envolvimento com a quadrilha.
Em discurso feito na tribuna na última segunda-feira, o senador contou que, com a morte do sogro, no dia 4 de abril, pediu a um amigo, o empresário Luis Gonzaga Solomon, dinheiro emprestado para alugar um avião e ir ao enterro, em Barretos (SP). Luis teria dado um cheque à empresa Ícaro. Mas, sem o dinheiro para honrar o pagamento, recorreu a Zuleido Veras, que teria se prontificado a pagar os R$ 24 mil (leia mais).
Leia o diálogo interceptado pela PF entre Luiz Gonzaga (identificado como Zaga) e o dono da Gautama:
"ZAGA diz que quer fazer uma consulta a ele ZULEIDO e diz: ‘o SENADOR (DELCÍDIO) me pediu o vôo daqui (BRASÍLIA) até BARRETO que ‘enviera’ em torno de R$ 12.000,00 (doze mil reais) esse vôo, agora ele me perguntou se, que depois de lá ele não tem como chegar
Ainda em seu discurso, Delcídio admitiu conhecer Zuleido, mas afirmou que nunca recebeu doação do empresário em suas campanhas eleitorais nem destinou emendas para obras executadas pela construtora. “Desde 2003, fiz 51 emendas, no valor total de R$ 17 milhões”, disse. “As emendas da Gautama são milionárias. As emendinhas de Mato Grosso do Sul não são desse perfil”.
Renan e Delcídio não são os únicos senadores a terem os seus nomes sob a ponta afiada da navalha. Outros três senadores foram atingidos indiretamente pela operação da PF: José Sarney (PMDB-AP), Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA) e Maria do Carmo Alves (DEM-SE).
Sarney é padrinho político do agora ex-ministro Silas Rondeau, que deixou ontem o Ministério de Minas e Energia em meio à suspeita de ter recebido propina da Gautama. ACM é tio do deputado Paulo Magalhães (DEM-BA), acusado de ter recebido propina de R$ 20 mil de Zuleido. Mulher do ex-governador João Alves (DEM), Maria do Carmo é mãe de João Alves Neto, preso pela PF sob a acusação de participar da máfia das obras públicas.