Zelig é um dos filmes mais divertidos de Woody Allen. Narrado como se fosse um documentário, um filme sobre alguém que de fato tivesse existido, ele conta a história de um sujeito com uma incrível capacidade camaleônica. Ao se aproximar de alguém, ele passava rapidamente a não apenas copiar trejeitos e opiniões. Ele conseguia mesmo ficar parecido. Integrava-se a qualquer cenário e situação com a maior naturalidade. A magia do cinema fazia com que o personagem de Woody Allen aparecesse presente nas mais variadas situações históricas: com o ex-ditador italiano Benito Mussolini, com o tirano alemão Adolf Hitler, com o ex-presidente americano John Kennedy, etc.
Veja abaixo o trailler do filme de Woody Allen:
Zelig pode ser um personagem de ficção nos Estados Unidos de Woody Allen. Aqui, personagens camaleônicos como ele habitam com naturalidade nosso mundo da política. Que o diga o bigode do senador Romero Jucá (PMDB-RR), que vem há anos mudando de coloração para que ele consiga a proeza de ter sido líder de três governos diferentes no Senado: Fernando Henrique, Lula e Dilma.
Por aqui, ampliamos o conceito de Woody Allen. Não contentes com apenas um personagem, criamos agremiações de Zeligs. Como o recém-criado PSD.
Há algumas semanas, o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), abordou o líder do PSD, Guilherme Campos (SP), e convidou-o a participar das reuniões do governo com os partidos da sua base de sustentação. Guilherme Campos declinou do convite. De forma educada, disse que o convite honrava o PSD, mas não se coadunava com o perfil de independência que o novo partido fundado pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, quer manter.
Na verdade, o que acontece é que o PSD descobriu que a tal “independência” que prega é a postura mais conveniente para um partido político no Brasil, do ponto de vista eleitoral. Depois que caiu a regra da verticalização – que determinava que as alianças feitas na eleição principal disputada tinham se repetir em todas as demais eleições (se um partido fechava determinada aliança para presidente, não podia se aliar nos estados a partidos que tinham outras coligações nas eleições presidenciais) –, virar uma geleia ideológica tornou-se um grande negócio. Porque permite alinhar-se ao melhor jogo disponível em cada local.
Por isso, enganou-se quem pensava que a ideia central em torno da criação do PSD fosse imediatamente alinhar-se ao governo Dilma. A ideia central, na verdade, é estabelecer uma postura aberta a todas as possibilidades. Se julgar conveniente no futuro, o PSD pode até se aproximar de Dilma. Mas, desde já, fica estabelecido que não se comportará também como partido de oposição.
Agora, essa neutralidade, ou “independência” permite as mais variadas possibilidades. Vejamos: nas tratativas estaduais para ser formado, o PSD teve diferentes apoios nos estados, dependendo da conveniência local. No PSB, os governadores de Pernambuco, Eduardo Campos e do Ceará, Cid Gomes, ajudaram a formação do partido em seus estados. No PMDB, fizeram o mesmo os governadores do Rio, Sérgio Cabral, e do Maranhão, Roseana Sarney. No PSDB, veio a ajuda de Antônio Anastasia e Geraldo Alckmin, em Minas Gerais e em São Paulo. E do PT, ajudaram Jaques Wagner, da Bahia, e Marcelo Déda, em Sergipe.
Isso gera a seguinte situação para o PSD nas eleições municipais do ano que vem. Em São Paulo, o PSD busca o apoio do PSDB para reeleger Kassab. Em Belo Horizonte, vai apoiar, junto com o PSDB, a reeleição de Márcio Lacerda, do PSB. No Rio, vai apoiar a reeleição de Eduardo Paes, do PMDB. Em Fortaleza, junto com o PSB, apoiará a reeleição de Luiziane Lins, do PT. Em Recife, vai estar também junto com o PSB apoiando outro petista, o prefeito João da Costa. E por aí, segue, ora com o PSDB, ora com o PT, ora com o PSB, ora com o PMDB. Enfim, com quem for mais conveniente para seus planos locais.
No Brasil político nacionalmente polarizado entre PT e PSDB, criou-se uma espécie de segunda divisão política, altamente atraente, porém, para quem a ocupa. Muitos dos demais partidos abdicaram de ter um projeto nacional e crescem por suas posições regionais. Essa tem sido há anos a estratégia do PMDB. Faz com que o partido tenha o vice-presidente da República, cinco ministros de Estado, cinco governadores, 18 senadores, 79 deputados federais, 152 deputados estaduais, 1.175 prefeitos.
É esse o caminho que o PSD quer seguir. Para ele, funciona bem admitir a mais ampla possível política de alianças. Ou seja, sentir-se bem em qualquer cenário, com qualquer figurino. Woody Allen não faria melhor.
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