Fábio Góis
Em vez de serem expulsos pelo proprietário (no caso, o Estado), invasores de imóvel que completem cinco anos de ocupação poderão adquiri-lo por meio de financiamento integral da Caixa Econômica Federal (CEF). É o que propõe o Projeto de Lei (PL) 7562/10, de autoria do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que tramita em três comissões (Constituição e Justiça; Desenvolvimento Urbano; e Finanças e Tributação) em caráter conclusivo ? ou seja, sem necessidade de ir a plenário, salvo em casos específicos de contestação no âmbito dos colegiados.
A invasão de espaços públicos é um problema em várias partes do país. Não apenas no caso de populações pobres, como nas favelas. Em Brasília, por exemplo, parte do entorno da cidade tem se transformado em condomínios de luxo que começaram com a invasão dos terrenos públicos por seus proprietários. A ocupação de áreas irregulares é também uma das situações apontadas para o deslizamento de encostas e problemas relacionados com chuvas e enchentes em regiões montanhosas, especialmente no Rio de Janeiro, estado de Eduardo Cunha. Ao mesmo tempo, porém, o país convive com um grande déficit habitacional. Esse é a questão apontada por Eduardo Cunha para defender seu projeto.
Além da possibilidade de financiamento para adquirir o imóvel invadido, o proprietário, pelo projeto de Eduardo Cunha, poderá abater eventuais melhoras que tiver feito durante o período de ocupação. O projeto estabelece que a instituição financeira ?levará em conta eventuais benfeitorias feitas de forma comprovada pelo ocupante do imóvel?.
Confira a íntegra do PL 7562/10
Só invasões passadas
Eduardo Cunha se apressa em esclarecer que seu projeto não tem o intuito de incentivar novas invasões. ?Este projeto não está considerando invasões futuras, mas apenas aquelas referentes ao tempo passado?, esclareceu Eduardo Cunha ao Congresso em Foco. Para o deputado, o importante é regularizar situações que ocorrem de fato. ?Vi situações em que as pessoas estavam tentando pagar pelo imóvel e não estavam conseguindo guarita do governo para custear a compra. O poder público estava perdendo muito dinheiro?, argumenta.
Segundo Eduardo Cunha, o projeto de lei provocará a redução de imbróglios judiciais envolvendo questões imobiliárias, bem como reduzirá o déficit habitacional no país.
?A concordância pelo ocupante do imóvel do disposto no artigo anterior implicará no [sic] sobrestamento de quaisquer ações judiciais existentes buscando a reintegração de posse, que deverão obrigatoriamente ter a desistência expressa da Caixa Econômica Federal, após a assinatura do instrumento contratual?, descreve o artigo 2º da proposição, que ainda livra o ocupante do imóvel de ?qualquer ônus? em caso de desistência.
O deputado disse ter presenciado situações ?absurdas? que poderiam ter sido solucionadas de maneira lucrativa, para a instituição financeira, e humanitária, para os moradores em questão. ?Não tem sentido, em um país com um déficit habitacional enorme, jogar essas pessoas na rua?, argumentou o peemedebista, lembrando que, em alguns casos, os imóveis sequer tinham sido concluídos ou apresentavam algum tipo de deterioração ? problemas que, avalia o deputado, poderiam ser resolvidos com reformas bancadas pelos novos proprietários.
Sem ônus
Para obter o financiamento da Caixa, o ?invasor? do imóvel não é obrigado a comprovar renda ou qualquer outro tipo de garantia, à exceção do próprio imóvel (o bem seria empenhado em hipótese de eventual inadimplência). ?O ocupante da unidade que atenda às condições do caput e não queira ser contemplado pelo financiamento imobiliário será obrigado a desocupá-la em até 90 (noventa dias), após a notificação pela Caixa Econômica Federal de disponibilidade do financiamento?, diz trecho do projeto de lei.
Na sucinta justificativa, o autor do projeto fala em evitar ?consequências sociais sérias? para a Caixa. ?Estamos em um momento em que a Caixa Econômica Federal luta para reintegrar propriedades invadidas há muitos anos, cujo efeito final será em um novo esqueleto, necessitando de obras para possível venda a terceiros. Por outro lado, várias famílias irão para as ruas procurar imóveis para morar. A presente proposta tem o intuito de permitir o fim dessas ações, possibilitando aos ocupantes pagarem pelos imóveis e, ao mesmo tempo, permitindo com que a CEF se livre de um problema que tem conseqüências sociais sérias?, diz a íntegra da argumentação.
Apresentado em plenário e protocolado na Secretaria Geral da Mesa em 30 de junho de 2010, o projeto foi distribuído às comissões e aguarda designação de relator desde o início de julho na Comissão de Desenvolvimento Urbano, onde iniciou a tramitação. Por imposições regimentais (artigo 105), a matéria foi arquivada em 31 de janeiro de 2011, em razão do encerramento da legislatura passada. Mas, a pedido do próprio deputado, que foi reeleito, a proposição já se encontra “desarquivada” desde a última terça-feira (22).
O próprio deputado admite que a proposição não seria rapidamente apreciada. ?As matérias de iniciativa dos próprios parlamentares sempre demoram muito tempo em tramitação. Mesmo que seja declarada a urgência e relevância do texto, é muito pouco provável que ele seja votado neste ano [2010]?, resignou-se Eduardo Cunha à época da apresentação do projeto, lembrando que ?pelos menos 50 matérias? já estavam prioritariamente pautadas na sessão legislativa anterior. ?Mas eu vou batalhar pelo projeto, porque eu o entendo meritório.?