Rogério Schmitt*
Não, este artigo não é sobre a renovação da social-democracia proposta há mais de uma década pelo ex-chanceler britânico Tony Blair. Afinal, grafei a consagrada expressão com letras minúsculas… Estou falando da nossa própria sucessão presidencial. E apostando na repetição de uma já tradicional bipolarização entre PT e PSDB.
Resta pouco mais de um ano para as eleições de 2010, e continuo achando prematuro cravar a vitória dos aliados ou dos adversários do atual governo. De fato, há bons argumentos para os dois lados. O líder inconteste de todas as pesquisas feitas nos últimos anos – e isso certamente não mudará tão cedo – é um candidato de oposição já bastante conhecido pelo eleitorado. Por outro lado, a possibilidade de transferência de votos de um presidente campeão de popularidade para a candidata oficial, especialmente após o início efetivo da campanha, também não pode ser subestimada.
Apenas receio não ser o portador de boas notícias para os leitores que porventura possam depositar suas esperanças no surgimento de um(a) terceiro(a) candidato(a) eleitoralmente viável. Em outras palavras, de um “azarão” que tenha chances reais de vitória ou, no mínimo, de participar de um provável segundo turno. Para todos os efeitos práticos, essa possibilidade pode ser desconsiderada. E há boas razões para que seja assim.
O sistema político brasileiro é claramente multipartidário. Há cerca de 20 partidos representados no Congresso. Nenhuma dessas legendas possui mais de 20% dos votos na Câmara ou no Senado. Essa fragmentação estimula a formação de governos de coalizão. Da última vez em que contei, havia mais ou menos dez partidos no comando das diferentes pastas da Esplanada dos Ministérios.
Mas a história acima muda de figura quando passamos a examinar o retrospecto recente das eleições presidenciais. A maioria dos partidos brasileiros não costuma apresentar candidatos próprios ao Palácio do Planalto. Somente duas siglas deram a cara para bater em todas as cinco eleições presidenciais realizadas desde o fim da ditadura: justamente o PT e o PSDB.
Como seria de se esperar, essa estratégia de fixação dessas duas “marcas” presidenciais se refletiu no resultado das urnas. Presidenciáveis petistas e tucanos se alternaram na primeira e na segunda posição nas quatro últimas eleições. Somados, os candidatos do PT e do PSDB receberam 90,2% dos votos válidos em 2006. Não foi muito diferente nos pleitos anteriores: 69,6% em 2002; 84,8% em 1998 e 81,3% em 1994.
O fato é que as eleições presidenciais brasileiras se tornaram virtualmente bipartidárias na última década e meia. Na média, a votação agregada de petistas e tucanos nesses quatro pleitos foi de 81,5%. A título de comparação, os especialistas já classificam como bipartidários os processos eleitorais em que os dois maiores partidos atingem 70% dos votos.
Mesmo antes de a campanha começar de fato – e de os presidenciáveis colocarem os seus blocos na rua pra valer –, essa bipolarização já se insinua novamente nas pesquisas eleitorais. Nos principais cenários das rodadas mais recentes dos maiores institutos, a votação somada (como proporção dos votos válidos) da dupla José Serra & Dilma Rousseff equivale a 64,6% na medição do Datafolha), 74,7% segundo CNI-Ibope e 80,1%, de acordo com CNT-Sensus.
Se forem mesmo candidatos a presidente, não será, portanto, nada fácil a tarefa dos possíveis “azarões” dessa disputa: o deputado Ciro Gomes, a senadora Marina Silva e a ex-senadora Heloisa Helena. Todos eles lutarão contra dificuldades quase intransponíveis, como orçamentos de campanha mais modestos, reduzido tempo de propaganda na televisão e no rádio, e máquinas partidárias pouco estruturadas na maioria dos estados.
Na prática, os presidenciáveis que poderiam representar uma “terceira via” devem disputar uma fatia equivalente a cerca de 20% do eleitorado. Seja quem for o terceiro colocado, dificilmente ele (ou ela) obterá muito mais do que 10% dos votos válidos. É muito pouco para abalar o favoritismo de tucanos e petistas – ou sequer para pleitear uma vaga no segundo turno.
Mas o apoio desses candidatos de menor expressão – e dos preciosos votos que eles comandam – certamente será decisivo para determinar o resultado final da sucessão presidencial. Como sempre acontece, ganha o segundo turno o candidato que consegue transferir para si os votos dos eleitores dos candidatos que não forem para o segundo turno.
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