O livro do Humberto Werneck, O Desatino da Rapaziada – jornalistas e escritores em Minas Gerais, me deu o que pensar. Entre a atual mídia neoconservadora e predatória e a anterior (bem anterior por sinal), qualquer uma (literalmente, juro), o que aconteceu, meu Deus, o que, o que?
Em primeiro lugar, no intervalo, mudei eu: parei de comprar jornais e revistas (se bem que acabo de assinar a Caros Amigos ao vivo e eletronicamente ao Le Monde Diplomatique) uma vez que não mais conseguia ler sem deixar de me sentir, numa primeira reação epidérmica, totalmente injuriada e/ou, tentando ser complacente, totalmente desmoralizada, e vocês? Nos dois casos a sensação de “derrota moral” é persistente, entranha na alma.
No texto anterior me referi à possibilidade duma outra mídia possível no sentido mais canônico e platônico da profissão, que propõe a busca do bom, do belo e do verdadeiro.
E se pensarmos que literariamente forma & conteúdo são indissociáveis, então uma escrita canalha, hipócrita, uma argumentação tendenciosa no aspecto de conduzir o leitor pelo nariz, sem contar o contorcionismo mental, próprio dessa arte tão sub-reptícia quanto marcial na qual, aliás, pode-se ganhar várias medalhas olímpicas e é preciso chegar lá, tornar-se um veterano no manejo de todo o estoque verbal de truques sujos para entrar em campo, dar meia-volta na verdade, baixar-lhe o moral e à categoria de meia-verdade, fazê-la recuar pouco a pouco, encurralar a omissão contra as cordas, até que, na condição de mentira, a verdade finalmente beije a lona, glory hallelujah!
Um esporte e tanto. Pra quem aprecia o gosto do próprio rabo preso. E uma vez que literariamente forma & conteúdo são indissociáveis, a escrita canalha não vale rigorosamente nada.
Primeiro, não resiste ao mais elementar questionamento do departamento de lógica, segundo, nela há um terceiro elemento mais importante que forma & conteúdo (ambos indissociáveis) que é a intenção.
Num texto ruim o que vale é a intenção, o intuito, o objetivo, onde pretende chegar, porquê e quem ganha com o maldito texto ruim do maldito escriba!
E intenções, boas, más, quaisquer que sejam, absolutamente não contam em literatura. Que é realização, é presença da própria coisa, não discurso sobre a coisa (que, nesse caso, é ensaio), não intenção de dizer a coisa (e nesse, é equívoco).
Certa vez alguém me deu um conselho: aquele que pretende ser escritor precisa apontar o mais alto possível, estratosfericamente, na direção do Prêmio Nobel.
Mas não é preciso ir tão longe.
A aproximação da moçada atual com o “elenco mágico”, na boa expressão de Sylvio Costa, dos mineiros tipo Carlos Drummond de Andrade, Fernando Sabino, Otto Lara Rezende, Autran Dourado, Affonso Romano de Sant’Anna, Ivan Ângelo, Luiz Vilela, Roberto Drummond, Rubem Braga (mineiro do Espírito Santo), Murilo Rubião, Aníbal Machado, Cyro dos Anjos, Paulo Mendes Campos, Silviano Santiago, Pedro Nava & outros, foi feita para se ter uma boa idéia do tamanho dos paradigmas do ramo, do real valor e da excelência das tradições de que precisamos estar à altura, porque sim, nós, brasileiros, nas letras e comunicações, temos modelos incomparáveis e fortes tradições.
Como no futebol. E com a desvantagem de que a concorrência é dobrada porque há mulheres em campo.