Cláudio Boriola *
Empréstimo consignado é o crédito que será descontado diretamente na folha de pagamento do trabalhador ou do aposentado/pensionista que recorrer a esse instrumento.
Na última sexta-feira, 13 de outubro, a Dataprev, empresa de tecnologia e informação da Previdência Social, divulgou os números que envolvem todas as transações de empréstimo consignado desde a sua criação, em 2004, realizadas pelos beneficiários do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).
Dos 19 milhões de segurados, 6,4 milhões já utilizaram o empréstimo com desconto em folha. O montante movimentado foi de R$ 17,9 bilhões. A maioria dos beneficiários, 57,8%, prefere pagar a sua dívida entre 31 e 36 meses, limite atual de parcelas. Até o ano passado, existiam contratos de até 60 meses, que foram proibidos e, inclusive, não aparecem mais nas estatísticas do Dataprev. Portanto, não estão incluídos nessas estatísticas.
Quando o assunto é faixa de ganhos, os números servem para confirmar o que já conhecemos na realidade: em 25,9% das operações, a faixa salarial do beneficiário é de um salário mínimo. Quem ganha entre um e dois salários mínimos faz 40,9% das transações. Ou seja, quem tem uma maior probabilidade de se complicar posteriormente com os descontos do empréstimo consignado acaba sendo também quem mais se utiliza deles.
Em outra pesquisa, realizada em setembro deste ano pelo Instituto de Economia Gastão Vidigal, da Associação Comercial de São Paulo, o objetivo de quem faz um empréstimo consignado fica mais claro. Aproveitando-se da taxa de juros um pouco mais baixa que a do empréstimo convencional (2,86% ao mês, no caso dos beneficiários do INSS), 65% das pessoas ouvidas contrataram o serviço para pagar outras dívidas. Já outros 12% deram como motivo "ajudar a família", o que não deixa muito claro se é para pagar dívidas de familiares ou ainda ajudar em um empreendimento ou pequeno negócio.
Os riscos de um empréstimo ou de uma venda consignada não estão somente na alta probabilidade de se arranjar uma dívida que fuja do controle. São poucos os casos, mas há também a chance de ocorrer um erro de cobrança, prejudicando o consumidor. Uma amiga resolveu aproveitar a promoção de uma famosa marca de perfumes e fragrâncias na empresa em que trabalha e adquiriu um produto numa compra consignada, parcelada em duas vezes. Isso aconteceu no mês de agosto. Para a surpresa da consumidora, no holerite do mês de setembro, veio o desconto do valor total da compra, sendo ignorado o parcelamento.
Ela, que não estava preparada para o pagamento do valor total, viu o seu salário diminuir e não teve muita opção, além de reclamar com o setor responsável pelo desconto. Não sendo o primeiro erro suficiente, no mês de outubro ela teve descontado, novamente, o valor total da compra, como se em vez de ser dividido, o valor tivesse multiplicado. Logicamente, ela teve o dinheiro de volta, mas a cabeça já tinha doído e o salário já havia sido pago com a diferença. Vale lembrar que em um caso como esse, em que há dano ou prejuízo para o consumidor, cabe não só a restituição, mas também o ressarcimento desse prejuízo (uma conta que tenha vencido no período do desconto e não pôde ser paga, por exemplo).
O empréstimo e a venda consignados foram artifícios criados pelo nosso sistema capitalista para as empresas terem o pagamento garantido e não sofrerem as conseqüências da inadimplência. Uma dica que é recorrente, mas sempre vale a pena ser dada: nunca comprometa mais de 30% da sua renda com o pagamento das parcelas de um empréstimo, seja ele consignado ou não. Nunca se esqueça de que o sistema zela muito bem pelo cofre das instituições financeiras. Mas do nosso bolso, quem cuida somos nós mesmos.
* Cláudio Boriola é consultor financeiro, especialista em Economia Doméstica e Direitos do Consumidor. Fundador e presidente da Boriola Consultoria, empresa criada há mais de 12 anos, é autor do livro Paz, saúde e crédito e do projeto para inclusão da disciplina "Educação Financeira" nas escolas.