Antonio Vital
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O problema do governo no Congresso e fora dele é que os petistas, neófitos no poder, ainda não pegaram bem o jeito de lidar com profissionais calejados da política, como o presidente do Senado, José Sarney (AP), e o senador Renan Calheiros (AL), os dois do PMDB. Sarney é tão bom no que faz que consegue manter um pé no PMDB, outro no PFL (onde estão a filha Roseana, e, só para nomear outro, o senador Edison Lobão, sua cria) e mordisca até um pedaço da esquerda, com o filho Zequinha no PV. Isso sem contar que saiu diretamente da presidência do partido oficial dos militares para ser o primeiro presidente civil depois da ditadura. As peripécias dele são incontáveis e só há espaço aqui para lembrar as mais óbvias, como o fato de ser cacique ao mesmo tempo em dois estados, o Amapá e o Maranhão. Ou a de virar o homem mais poderoso no governo do PT. De Renan Calheiros, se pode falar coisas parecidas, apesar do currículo menos extenso, provavelmente pela diferença de idade. Um dos criadores do fenômeno Fernando Collor de Mello, em 1988, rompeu com o pupilo antes do impeachment, foi para o PMDB, onde aos poucos foi abocanhando nacos de poder, assumiu o Ministério da Justiça no governo Fernando Henrique Cardoso e hoje se revela um adversário de peso de Sarney. A briga dos dois deixou o governo na situação do sujeito que tem dois pittbulls para sua proteção e não sabe o que fazer quando os dois começam a brigar. Melhor é ficar quietinho, que é o que Lula e companhia estão tentando fazer. Na disputa de Calheiros e Sarney pela presidência do Senado, pode acabar sobrando para um terceiro candidato. Isso porque Sarney não admite perder. Se perceber que a emenda da reeleição não vai passar, vai apoiar outro contra Calheiros. Se perceber que pode perder nos votos, em caso de aprovação da emenda da reeleição, fará o mesmo. Enquanto isso, os dois exibem suas forças. Sarney deixou a MP dos Bingos ser derrubada para mostrar como faz falta. Calheiros inflou a comissão especial que pode vir a aumentar o salário mínimo para mostrar que pode atrapalhar, e muito, os planos do Palácio do Planalto, se contrariado. Mas o problema, para o governo, é mais grave. Em torno dos dois adversários gravitam outros profissionais da política que agem segundo razões bem práticas e desprovidas de qualquer resíduo ideológico. O senador Edison Lobão (PFL-MA), só para citar um caso, votou contra a MP dos Bingos, não por ser contra ou a favor de Sarney ou de Calheiros. O filho dele, Edison Lobão Filho, já foi dono de bingo no Maranhão e chegou a ser sócio de uma empresa semelhante que atuava em Brasília. Transportando o fenômeno para o plano estadual, o PT não sabe o que fazer, por exemplo, para enfrentar adversários que têm perfil parecido. Em Brasília, o partido de Lula ficou desnorteado com a absolvição de Joaquim Roriz pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A cassação do mandato de Roriz, outra cria de Sarney, era dada como certa, principalmente depois que o TSE cassou o mandato do senador João Capiberibe (PSB-AP) – adversário local do partido do presidente do Senado. O processo contra Roriz tem dezenas de provas de que dinheiro público do Distrito Federal foi usado na campanha de Roriz por meio de uma triangulação que envolveu empresas prestadoras de serviço ao governo. Mas não é assim que as coisas funcionam. O relator do processo, Carlos Velloso, interpretou de maneira tão formal as provas que, onde havia "8", ele viu apenas uma bolinha em cima da outra no lugar de "oito". Resultado: Roriz foi absolvido. Pensando bem, é melhor mesmo Lula e os demais ocupantes do Palácio do Planalto manterem um sadio amadorismo em certos casos. |