Eduardo Militão
Deputados da oposição estão mais do que céticos quanto às intenções do governo de retomar as discussões sobre a reforma trabalhista e sindical, conforme anunciou ontem (29) o ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger. Para eles, a intenção é criar uma “cortina de fumaça” ou factóide para desviar a atenção da reforma tributária e da emenda sobre o reajuste dos aposentados, o que pode constranger deputados petistas e o presidente Lula. O governo não garante que a proposta vá prosperar, mas diz que sua missão é tentar mudar o quadro atual (leia mais).
Em linhas gerais, o documento com as diretrizes anunciadas por Unger – e avalizadas pelo Planalto – tratam de três pontos para reformar o sistema atual, criado nos anos 1940 pelo governo de Getúlio Vargas. O primeiro item é reduzir a o trabalho informal sob o qual vivem 50% da população economicamente ativa, por meio da desoneração da folha de pagamentos e por mudanças na política industrial e agrícola.
O segundo é aumentar a participação dos salários na renda nacional, por meio de benefícios fiscais para quem contrata empregados com baixa renda, ampliação da participação nos lucros dos trabalhadores e proteção efetiva aos funcionários temporários e terceirizados. A minuta das diretrizes inclui revisão do regime sindical, como, por exemplo, a substituição do imposto sindical.
Mas, para a oposição, tudo não passa de discurso e incoerência do PT. “Isso aí é carta de intenções”, avalia o vice-líder do DEM na Câmara Ronaldo Caiado (GO). “É um factóide, lógico, mais um. Ele desvia o foco do que é principal”, emenda.
Segundo o deputado, o Congresso deve se debruçar sobre a reforma tributária, em debate na Câmara, e uma emenda ao projeto de lei complementar que dá aos aposentados o mesmo reajuste do salário mínimo. Como a derrubada da segunda matéria é impopular, pode haver atrito entre parlamentares petistas e o Palácio do Planalto. Caiado avalia que debater a reforma trabalhista seria uma compensação ao desgaste.
Cético quanto ao andamento da matéria no Congresso, o deputado Paulo Renato (PSDB-SP), ex-ministro da Educação no governo FHC, concorda com a tese de Caiado. Ele chega a desdenhar até da função exercida pelo ministro Unger. Para Paulo Renato, as diretrizes anunciadas servem apenas para legitimá-lo no cargo.
“O ministro veio para fazer planejamento de longo prazo e até agora não aconteceu nada. De vez em quando ele tem que soltar alguma proposta para dizer que existe”, ironiza.
O deputado tucano acusa o presidente de fazer média com empresários e sindicalistas nesse tema. Ora acena com desoneração de impostos para os primeiros, ora com manutenção do status quo para os sindicalistas. “Mas no fim, prevalece o segundo”, critica Paulo Renato, ao identificar os governistas como históricos defensores do sindicalismo.
Só em 2009
Segundo o ministro Mangabeira Unger, as discussões começam agora com representantes dos empregados, dos empregadores, do Congresso e da sociedade em geral. Só no início de 2009, depois de ouvir as partes envolvidas, é que o governo federal vai enviar a proposta ao Legislativo.
Mesmo assim, Paulo Renato não acredita que o projeto vá sair do papel, nem mesmo em 2010. ”As coisas polêmicas só são aprovadas quando há empenho do governo. Eles querem é melhorar e aumentar os seus privilégios e não estão preocupados com a proteção dos informais.”
O líder do DEM, deputado ACM Neto (BA), duvida de todas as promessas do governo contidas no documento de Mangabeira Unger. “Sou a favor disso, mas não acredito que o PT conduza de maneira séria uma discussão dessas no Congresso. No passado, o PT e a CUT [Central Única dos Trabalhadores] fizeram terrorismo contra a votação de matérias trabalhistas. Eles não vão agora assumir outra postura”, reclama.
O oposicionista ainda aposta que a discussão possa se estender até 2010, quando ficará impedida de ser votada por conta das eleições presidenciais. “O ministro é um idealista”, diz ACM Neto.
Negociação
O líder do PT na Câmara, Maurício Rands (PE), vê o anúncio de Mangabeira Unger como uma disposição do governo Lula de mudar o quadro trabalhista de maneira negociada, sem imposições. “Jamais o governo quis fazer qualquer reforma impondo aos principais atores de relações trabalhistas no Brasil. A reforma que queremos fazer é negociada.”
Rands diz que a mudanças no sistema sindical devem preceder as trabalhistas. “Uma reforma no direito coletivo do trabalho e depois no direito individual do trabalho”, opina. O líder do PT, que é especialista da área, defende eliminar incidências na folha de pagamento que não são direitos dos empregados – como o salário-educação e a contribuição para o Incra – e mudanças o financiamento da Previdência Social para desonerar as empresas.
Ele afirma que, no decorrer deste ano, é possível criar as condições políticas para amadurecer as idéias e votá-las ainda em 2009. “É uma iniciativa boa do Executivo, porque nossa preocupação é que em 2009 a gente avance nessa questão”, calcula Rands.
O deputado Chico Alencar (Psol-RJ) acredita que o método de discussão proposto pelo ministro Unger é bom, mas é preciso ver se, no conteúdo, a proposta não vai privilegiar os pontos de vista de “centrais sindicais chapa-branca”.
O Psol defende que nenhum direito trabalhista seja perdido com a reforma. O partido ainda quer a redução da jornada de trabalho sem redução dos salários, cautela na implantação de tecnologias que possam acarretar demissões em massa, qualificação da mão-de-obra e diminuição de diferenças entre os maiores e os menores salários do país. Para Alencar o que vai pesar para definir se a proposta vai sair do “blá-blá-blá” é a mobilização social.
Criados no governo Lula, o Fórum Nacional do Trabalho e o da Previdência Social não chegaram a objetivos práticos. A reforma trabalhista não foi enviada ao Congresso. A reforma sindical acabou engavetada.
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