Embora de forma legítima, diante da inação do Poder Legislativo em cumprir suas obrigações constitucionais, sob o pretexto de interpretar a Constituição nas vezes em que é provocado, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem extrapolado das suas funções e invadido área de competência exclusiva do Congresso Nacional. De uns tempos para cá, o STF arvorou-se legislador, mas além de atropelar os trabalhos legislativos, as leis que produz nem sempre atendem aos anseios da sociedade.
A última investida legislativa do STF ocorreu na semana passada, quando os juízes daquela Corte decidiram fixar regras para que o valor do aviso prévio em caso de demissão seja proporcional ao tempo de serviço.
Além do mês devido, o empregador deverá pagar um adicional de um salário para cada três anos de emprego, de acordo com a fórmula apresentada pelo ministro Marco Aurélio Melo. A sugestão do ministro, no entanto, não difere das muitas propostas para regulamentar a matéria em tramitação na Câmara e no Senado.
Mas, por mais louvável que seja a atitude dos ministros do Supremo em atender a uma justa reivindicação trabalhista prevista, aliás, na Constituição de 1988 , cuja decisão teria sido adotada diante de um pedido de declaração de suposta omissão do Congresso em regulamentar a matéria, entendemos que interpretar é diferente de legislar.
Sem pretender encobrir as nossas falhas, nem sempre procede a acusação de que o Congresso é omisso. O processo legislativo por sua natureza é lento. Uma lei envolve interesses diversos e para que ela seja equilibrada precisa refletir essas diversidades. Por isso mesmo só pode ser gestada no Congresso, a casa onde convivem todas as tendências da sociedade.
Legislação feita fora das Casas Legislativas tende à imperfeição. Uma mexida na legislação trabalhista, por exemplo, precisa manter sintonia entre o direito do trabalhador e o equilíbrio econômico e financeiro da empresa. E isso não está presente na decisão do STF sobre a ampliação do aviso prévio.
Há casos em que o Supremo fica devendo sintonia com a população. Foi o verificado, por exemplo, com a Lei da Ficha Limpa. Depois de aprovada pelo Congresso Nacional, sob os aplausos da população brasileira, a lei de iniciativa popular acabou sendo revogada no STF ao devolver à vida pública figuras que dela haviam sido banidas pelo eleitor.
Houve também precipitação dos ministros do Supremo na antecipação do veredicto sobre o reconhecimento do direito à união civil de pessoas do mesmo sexo. Embora agradando parcela da população, não se pode negar que a decisão dividiu a sociedade.
Para não dizer que só falei de flores, ouso afirmar que a decisão do STF de proibir que os estados ofereçam incentivos fiscais para atrair investimentos foi uma faca de dois gumes. Mesmo se puder levar a uma trégua na disputa por investimentos, essa decisão tende a sufocar o crescimento dos estados de menor desenvolvimento econômico.
Portanto, em sua ação de legiferar, falta ao Supremo o sentimento do mundo. Por seu arco de representação da sociedade, esse sentimento é imanente ao Parlamento. Nós legisladores somos os primeiros a reclamar a demora da tramitação de um projeto de nossa autoria, mas também sabemos como a pressa é inimiga da perfeição.
Ela está demonstrada nas últimas decisões da Suprema Corte. Tendem a ser cumpridas em função do seu juízo de última instância, mas estão sendo contestadas até mesmo no âmbito do Poder Judiciário. Menos pelos seus acertos, mais pela forma com a qual se procurou corrigir eventuais erros ou omissões.
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