Rogério Schmitt*
O primeiro trimestre de 2009 chegou ao seu final marcado por notícias negativas. No campo econômico, o destaque foi para a crise financeira internacional e os seus crescentes impactos sobre a economia brasileira. No campo político, o Congresso Nacional esteve novamente sob os holofotes da imprensa, com novos escândalos se sucedendo a cada semana.
Os pratos da vez vão desde o retorno triunfal de alguns velhos caciques da nossa política até a revelação de graves abusos na utilização de recursos públicos pelos congressistas e pelas burocracias legislativas – passando inclusive por novas denúncias de corrupção eleitoral.
Aqueles que acompanham profissionalmente há vários anos as atividades do Congresso sabem que essa não foi a primeira e nem será a última safra de notícias negativas sobre a instituição. Na verdade, esse processo costuma se repetir de modo quase sazonal. Assim como nos melhores romances policiais, as sucessivas crises políticas sempre escondem um jogo complexo de interesses entre partidos, entre poderes, entre governo e oposição e entre coalizões eleitorais em formação.
Esse texto será a primeira de duas colunas dedicadas a investigar o impacto dessas sucessivas crises políticas sobre o comportamento e as atitudes do eleitorado brasileiro. Mais especificamente, o meu objetivo será avaliar se o constante noticiário negativo sobre o Congresso Nacional se reflete ou não numa piora dos seus índices de desempenho perante a população.
Há duas maneiras possíveis de fazer empiricamente essa avaliação. Uma delas é recorrer aos levantamentos da popularidade do Congresso feitos pelos institutos de pesquisa da opinião pública. Esses dados serão avaliados na próxima coluna. A segunda maneira é observar alguns números referentes aos resultados eleitorais propriamente ditos.
A tabela 1 mostra a evolução da taxa nacional de abstenção eleitoral nas quatro últimas eleições para o Congresso. A proporção de eleitores que se absteve de votar em cada pleito se revela bem estável ao longo do tempo, e vem até caindo discretamente nas duas eleições mais recentes. Portanto, não se pode falar em nenhuma tendência de aumento da apatia dos eleitores.
Tabela 1: Abstenção (%) nas eleições para o Congresso Nacional
1994 | 1998 | 2002 | 2006 |
17,8% | 21,5% | 17,7% | 16,7% |
Fonte: TSE
A tabela 2 se refere à evolução dos votos brancos e nulos (como proporção do comparecimento às urnas) nas eleições para deputado federal. O dado que mais chama a atenção é a drástica redução desses dois tipos de voto a partir da adoção da urna eletrônica (em 1998). Ambas as taxas tiveram um pequeno aumento em 2006, na comparação com 2002, mas nada que autorize diagnósticos de indiferença ou protesto generalizados entre os eleitores. Na eleição da atual legislatura, quase nove em cada dez eleitores que compareceram às urnas validaram o seu voto (votando em candidatos ou na legenda).
Tabela 2: Votos brancos e nulos (%) nas eleições para a Câmara dos Deputados
| 1994 | 1998 | 2002 | 2006 |
Brancos | 16,5% | 10,2% | 4,7% | 6,3% |
Nulos | 25,2% | 9,8% | 2,9% | 4,8% |
Esse quadro não é muito diferente quando se examina a evolução nacional dos votos inválidos nas eleições dos senadores (tabela 3). É fato que os votos brancos e nulos para o Senado costumam ser em maior proporção do que para a Câmara. Mas esse fenômeno pode ser atribuído quase que inteiramente ao fato de que em duas dessas quatro eleições (1994 e 2002) os eleitores estavam elegendo dois senadores em cada estado da federação. Os votos em branco tendem a aumentar porque muitos eleitores acabam votando apenas no primeiro senador. E os votos nulos também tendem a crescer porque muitos eleitores votam duas vezes no mesmo nome. Além disso, na urna eletrônica, o voto para senador é dado posteriormente ao voto para deputado federal – o que também colabora para um maior desperdício de votos.
Tabela 3: Votos brancos e nulos (%) nas eleições para o Senado Federal
| 1994 | 1998 | 2002 | 2006 |
Brancos | 27,8% | 13,6% | 7,0% | 7,9% |
Nulos | 10,7% | 12,1% | 11,9% | 11,6% |
Fonte: TSE
Em resumo, os dados examinados nesse texto não autorizam especulações sobre uma possível deterioração progressiva da imagem e da reputação do Congresso como um todo ou de suas duas Casas separadamente. Os números acima são inteiramente compatíveis com um sistema de voto obrigatório, e não apontam para qualquer tendência preocupante de aumento da apatia ou da indiferença eleitoral, ou sequer do voto de protesto. Pelo contrário, parece haver até mais razões para otimismo do que para pessimismo. Resta conferir o veredicto das pesquisas de opinião pública sobre o Congresso – o que será feito na próxima quarta-feira.
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