Meu primeiro livro de poesia – Iogurte com farinha (leia antes que azede) – escrevi, imprimi e comecei a vender de mão-em-mão em 1977. Eram os tempos heróicos da geração mimeógrafo. Tinha eu 18 anos de idade. Produzi inúmeros outros. Mas o que eu quero contar aqui são fatos curiosos e pitorescos que me aconteceram em visitas às escolas. Nas públicas eu vou sem cobrar, mas nas particulares cobro cachê sim. Vamos às historias, com “h” pois que aconteceram, em escolas e em tempos diferentes.
1 – A professora comenta com os alunos: “Amanhã vem um poeta aqui falar com vocês. Quero que prestem atenção, façam perguntas e aproveitem a oportunidade”. E eis que um aluno comentou: “Poeta, aqui na escola? Pensei que já tinham todos morrido”. É que em muitas escolas o ensino de poesia para em meados do século passado, e assim, obviamente, todos os poetas ali citados já faleceram.
2 – No dia seguinte a minha apresentação a professora comenta com os alunos: “Vocês gostaram da poesia do poeta que veio aqui na sala ontem?” E uma aluna retrucou: “Aquilo não é poesia. Eu entendi tudo” – Esta historia é uma das minhas preferidas. No imaginário da maioria das pessoas a poesia é algo impenetrável, incomunicável, enfim, extremamente complexo. E isso já vem desde os pequenos…
3 – Agora já numa faculdade, com estudantes de letras. Fiz minha palestra, juntamente com o saudoso amigo poeta Cassiano Nunes. E na saída um aluno me pega pelo braço e diz” Seguinte: falta poesia na sua poesia” E vai embora. Não sei o nome do aluno, portanto nunca pude agradecê-lo por este belo cruzado de esquerda. Tempos depois, consciente ou inconscientemente, escrevi um livro de poemas chamado Menino Diamantino, sobre a minha infância em Diamantino, Mato Grosso. E algumas pessoas me disseram: “puxa, finalmente um livro de poesia…”. É que o fazer poético está muito ligado à sensibilidade, ao lírico… e como disse o poeta Rilke: “A única pátria do poeta é a infância. Por isso somos todos exilados”.
4 – Nas minhas andanças pelas escolas do DF fui várias vezes a Taguatinga, onde se passou o que vou narrar. Li meus poemas, falei de Brasilia… e um aluno: “Você só fica aí falando das superquadras…” Ai respondi que quando eu falo das superquadras falo na verdade das superquadras do mundo, e lembrei aquela famosa frase do Tolstoi: “ Cante sua aldeia e serás universal”. Ainda numa dessas visitas a Taguatinga, além de poeta, atuo como provocador, instigando os alunos a quebrarem esse preconceito que têm com a poesia.
Certa vez a professora precisou sair. Fiquei a sós com eles. E ai fiz aquela afirmação que os deixou surpresos: “Gente, poesia às vezes é um saco, né?” Sem entender muito a minha posição, foram aos poucos concordando, com expressiva maioria no público masculino. O grande problema no ensino de poesia é que muitas vezes os professores não contextualizam o escritor no momento histórico. Explico: “Gente, é que naquele tempo, a sociedade era muito estratificada, por isso a poesia também era assim, toda certinha, toda metrificada…” E aos poucos eles vão entendendo… Outra história: após minha apresentação pedi que os alunos viessem ler poemas também. Apareceram quatro meninas e nenhum homem. Falei: “ Ué! Poesia é coisa de menina? Homem também escreve poesia, oras. Veja o meu exemplo”. E aí logo um subiu ao palco, e leu seu poema. Mas foi só um. Depois disso mais três meninas leram poemas. Mais uma vez o estigma da poesia como algo para gente muito sensível, afeminada, delicada. São muitos os muros que ainda temos que derrubar em relação a visão que as pessoas normalmente tem do poeta e da poesia.
Aconselho sempre os escritores a colocar nos seus livros uma forma de contato para que as escolas os procurem. Se os poetas soubessem como é bom esse contato com o publico, fariam fila na frente das escolas.
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