Celebrou-se, há pouco, o anúncio de que o Brasil se tornara a sexta maior economia do mundo, ou o sexto maior PIB. Com tanto território e população, isso era inevitável. Mais recentemente, lamentou-se que o nosso PIB cresceu pouco, nesse 2012. E daí? Há razões para celebrar, ou para lamentar?
Sabe-se que é falso tomar o crescimento do PIB como sinal de melhora do bem estar, ou de mais emprego. Logo, celebrar seu crescimento, ou falta de, é comemorar o fato errado!
Qual posição o Brasil ocuparia, caso medíssemos não o PIB, mas o nível de conforto da população? Com essa medida – aliás desconhecida -, celebraríamos ou lamentaríamos?
A pergunta faz sentido porque a atenção dedicada à evolução do PIB apenas se justifica com base na ideia – falsa e enganadora – de que maior PIB leva a maior conforto do público. O PIB mede valor monetário de algumas das coisas que fazemos, mas não avalia nosso bem estar, e sabe-se que nem sempre o dinheiro pode comprar bem estar. Medir o conforto do público, embora difícil, seria uma avaliação direta daquilo que realmente interessa. A ideia pode parecer, mas não é, equivalente à mensuração da qualidade de vida, porque envolveria outros aspectos do “viver”.
Há muitas outras razões pelas quais deveríamos analisar o conforto público do cidadão, e não o PIB, para avaliar como anda um país. Pesquisas já antigas mostram que, há décadas, apesar da elevação do PIB, não aumenta a percepção de bem estar dos habitantes de países desenvolvidos. No Brasil, podemos olhar, por exemplo, para a região de Carajás, onde o PIB explodiu, mas as condições de vida da população permanecem precárias. Como disse, o PIB pode ser enganador… Prisioneiros de ideias superadas, quase todos os governos ainda perseguem o crescimento do PIB, como faziam há décadas. Se antes já disseram, equivocadamente, “governar é abrir estradas”, hoje diriam, da mesma forma, “governar é fazer crescer o PIB”.
A origem da ideia de buscar o crescimento do PIB está na promessa de que o crescimento do PIB levaria ao aumento do bem estar, afirmação que supostamente seria “comprovada” pelo aumento do número de famílias com TV, carro, geladeira e computador. Embora não sejam irrelevantes, todas essas medidas se referem ao conforto privado, ou interno às casas.
E quanto ao conforto público, o bem estar do cidadão, quando se está fora de casa? Quanto tempo ele gasta para se deslocar de casa ao trabalho? Quais as oportunidades de lazer existentes próximo às moradias? Qual o nível de segurança nas ruas, de acidentes nas estradas, de limpeza do ar que respiramos, de qualidade dos serviços públicos? As vias públicas são lisas ou cheias de buracos? A sinalização dos locais públicos é suficiente?
PublicidadeMuito mais que ter TV e carro, são esses fatores que indicam a qualidade de vida de uma população de humanos. Para se medir o “conforto público”, porém, não podemos nos limitar a um único número. Qual o sentido de se dizer que o “conforto público” aumentou, ou caiu, 2%?
O “conforto público”, claramente, tem muitas dimensões, aliás refletindo a própria ideia de qualidade de vida. Claro, acesso à educação, saúde e justiça são fatores que não podem estar ausentes de um indicador de “conforto público”, medida que dificilmente poderá ser reduzida a um único número sem descaracterizá-la. Também é fundamental avaliar o transporte público e, por exemplo, a qualidade da urbanização. Será que as habitações em que moram os brasileiros situam-se em locais onde há boa qualidade urbana, isto é, além dos básicos água e saneamento, fácil acesso ao local de trabalho e a espaços de lazer que não bares? Será que o grande crescimento do setor imobiliário brasileiro, nos últimos anos, contribuiu para reduzir a gritante diferença, em termos de qualidade urbana, entre brasileiros e, digamos, suecos?
Também devemos, é claro, nos comparar com outros povos que, em termos de “conforto público”, são ainda menos afortunados que nós; afinal, o planeta é um só. É fácil perceber, também, que esses indicadores nos dizem mais, muito mais, em termos de qualidade de vida – e de governantes – do que o velho e moribundo conceito de PIB. Além disso, a corrida por melhores posições em tal lista faria muito mais sentido do que a irracional e destrutiva ânsia de fazer crescer o PIB.
Um ponto de extrema importância a se considerar, porém, é que uma diferença fundamental entre os países “desenvolvidos” e os “subdesenvolvidos”, ou “emergentes”, é que nos primeiros o “conforto público”, ainda que de difícil quantificação, é muito maior que nos outros. Afinal, é nos países “desenvolvidos” que a educação, as cidades, a saúde, o transporte, a sinalização, etc., são muito mais “confortáveis” que nos subdesenvolvidos. Ou seja, muito mais importante do que sermos a “sexta maior economia do Planeta”, ou saber que o crescimento do PIB no trimestre foi alto ou baixo, é tentarmos alcançar posições mais elevadas nas diversas escalas possíveis de avaliação dos vários índices possíveis de conforto da população.