Está claro que hoje, em muitos países do mundo, as instituições públicas, parlamentos entre elas, enfrentam uma crise de legitimidade. Muitos perderam a confiança nessas instituições, que são percebidas como ineficazes e inaptas a responder às suas necessidades. A Organização das Nações Unidas realizou um encontro de cúpula em Viena, de 26 a 29 de junho, para se debruçar sobre as deficiências da governança pública. O 7.o Fórum Mundial reuniu altos representantes de diversos governos e parlamentos, assim como da sociedade civil, para debater essas questões e propor medidas para melhorar a governança pelo mundo.
A União Interparlamentar (UIP), organização internacional de parlamentos e de Estados soberanos, convocou, a propósito, um fórum de deputados nessa ocasião para refletir sobre o papel específico atribuído aos parlamentos, garantidores de uma governança mais transparente e mais responsável, tanto em nível nacional quanto internacional.
A reunião foi viabilizada pelo convite do Parlamento austríaco e atraiu a participação de mais de cem deputados de 31 países. Os debates versaram sobre o papel que a transparência e a responsabilidade podem desempenhar no restabelecimento da confiança das instituições do Estado. De acordo com as propostas da Sra. Barbara Prammer, presidente da Câmara dos Deputados do Parlamento austríaco, os governos devem ganhar a confiança da nação reforçando a participação popular no processo de elaboração das políticas, assegurando a promoção da coesão entre comunidades e praticando uma governança transparente, responsável e realista.
Os participantes à reunião de Viena refletiram sobre os meios pelos quais os parlamentos podem responsabilizar o Poder Executivo e destacaram que parlamentos fortes, independentes, dotados de recursos suficientes e poderes reais são um pilar indispensável e incontornável da democracia. Observaram que os parlamentos devem ser exemplos inatacáveis de integridade se desejam promover a integridade dos governantes. Quanto a isso, numerosos oradores intervieram para recomendar a adoção de códigos de conduta ética para deputados.
A vontade dos parlamentos de estender o seu controle a todos os setores da atividade nacional surgiu de debates exaustivos consagrados ao direito de observação parlamentar sobre o setor da segurança. Assim, a Sra. Margaret Mensah-Williams, vice-presidente do Comitê executivo da União Interparlamentar, que presidia o fórum, afirmou que nenhum setor da vida de uma nação poderia, legitimamente, subtrair-se ao direito de fiscalizar e investigar o Parlamento. Se é verdadeiro que a segurança nacional é um domínio de exame relativamente novo para os parlamentos, e que a aproximação a ele pode ser marcada por dificuldades e opacidade, os participantes destacaram que o setor da segurança deveria estar a serviço de toda a nação e que, para isso, é necessário submetê-lo a um controle exercido por civis. Os parlamentos devem, por conseguinte, ter o direito de examinar a estrutura, as políticas e o funcionamento de qualquer serviço de segurança. Esse direito de fiscalização parlamentar deve se realizar também sobre as contratações públicas e sobre o emprego de forças militares no estrangeiro. Os participantes também condenaram com vivacidade a ingerência dos militares na vida política das nações.
O fórum parlamentar foi concluído com um vigoroso clamor para que se amplie a proteção que se deve assegurar aos deputados no exercício das suas funções. A esse respeito, a questão dos privilégios e das imunidades parlamentares foi objeto de longos debates no curso dos quais os intervenientes afirmaram que a imunidade parlamentar não pode ser um privilégio conferido a título individual, mas deve ser um sistema coletivo que permita ao Parlamento, enquanto instituição, funcionar sem obstáculos. Uma advertência foi lançada também aos partidos políticos, que devem tomar mais iniciativas para promover integração, em especial no que diz respeito às relações de igualdade entre homens e mulheres nas instituições públicas. Os partidos também foram instados a adotar procedimentos internos mais democráticos e a aumentar a disciplina partidária para garantir que os deputados possam se expressar e agir de maneira mais independente, a fim de promover a responsabilidade dos governantes.
As opiniões e recomendações formuladas pelos deputados foram transmitidas a todos os participantes do 7º Fórum Mundial "Reinventar a Governança do Estado" numa mensagem lida, em nome da UIP, pela Sra. Nino Burjanadze, presidente do Parlamento da Geórgia.
* Este texto foi publicado em inglês e francês no último dia 18 pela União Interparlamentar (UIP, IPU na sigla em inglês), com o título “O papel dos parlamentos para reconstruir a confiança do Estado”, no IPU Bulletin nº 8. A tradução é de Carlos Luiz Strapazzon, professor de Ciência Política do Centro Universitário Curitiba e doutorando em Sociologia Política na Universidade Federal do Paraná. A UIP, criada em 1889 e sediada na Suíça, congrega parlamentos de mais de cem países do mundo.