Alex Canziani *
A escalada da crise ameaça nossa economia, nossas instituições, nossa paz. Ameaça toda nossa sociedade. Como se não bastasse o descalabro das contas públicas, que alimenta a inflação e a recessão, essa paralisia decisória fragiliza nossa capacidade de reagir e coloca todo o país numa situação muito delicada.
Há quase dois anos vivemos um impasse que queima nossas riquezas, provoca a quebra de empresas brasileiras e fecha milhões de postos de trabalho, num trágico efeito dominó. Essa trajetória para o desastre precisa – e começou a ser interrompida com a votação histórica ocorrida na Câmara dos Deputados!
A crise começou na política e vai terminar com a política. Porque, embora a nossa democracia esteja diante do desafio de se reciclar, a atual crise não começou por causa da política, mas justamente por falta de política. A falta de diálogo e a incapacidade de negociar estão na origem da crise política que precipitou o colapso do atual governo.
Temos que enfrentar, sim, a crise da representação, reduzir o número de partidos, aproximar o cidadão de seus representantes, ampliar os canais de fiscalização e controle da sociedade sobre o Estado. Mas é fundamental, antes, compreender que a desagregação a que chegamos hoje é filha pródiga da arrogância com o desrespeito.
A presidente Dilma não foi isolada pelos seus parceiros. Não! Ela simplesmente virou as costas para o Parlamento e aboliu o diálogo como ferramenta para solução de conflitos. A política, meus amigos, é a arte da negociação. E a negociação é o único método para solução de conflitos numa sociedade democrática. Num país tão plural, tão diverso em termos culturais, sociais e econômicos, num país tão desigual como o nosso a política é o meio de condução seguro das decisões públicas. E isso, infelizmente, a presidente Dilma ignorou solenemente.
Esse desprezo pela política contaminou o ambiente de debates e hoje se reflete no alto grau de polarização que divide nossa sociedade. A Esplanada em frente ao Congresso está dividida por um muro que nos envergonha e deprime. O Brasil não é o país da intolerância. Esse não é o nosso DNA. O radicalismo e a violência tomaram conta das mentes e discursos, turvando nossa capacidade de trocar ideias e tomar decisões. Há uma agenda enorme de problemas que precisam ser resolvidos. Nós não podemos continuar interditados por um debate polarizado, burro. Nós brasileiros precisamos retomar a capacidade de diálogo, precisamos urgentemente sentar para conversar.
PublicidadeCom todos os seus defeitos, o Congresso é o ambiente da conciliação e da superação das diferenças. O debate e a negociação são os instrumentos do funcionamento parlamentar. O consenso não é fácil e nunca é definitivo – é uma construção permanente. Isso é o que aprendemos todos os dias aqui dentro, no embate das ideias, na arquitetura dos acordos, nos processos de decisão.
É no Congresso que as diferenças se expõem e é no Congresso que elas dialogam. Aqui ninguém é dono da verdade e, mesmo aqueles que defendem suas convicções com vigor, aprendem logo que as decisões coletivas passam pelo trabalho de aproximação de posições diferentes, às vezes opostas. A necessidade de construir consensos para se chegar a uma decisão treina cada parlamentar que atua no Congresso na arte de ouvir e dialogar.
Foram essas qualidades que faltaram à presidente Dilma Rousseff nos seus cinco anos e meio de governo. Não ter vivido essa experiência cotidiana de conviver com o contraditório, de sentar para negociar em jornadas exaustivas com quem pensa diferente fizeram falta à presidente na condução do Poder Executivo. E no nosso sistema presidencialista, essa incapacidade para ouvir, debater, negociar e decidir coletivamente, enfim, essa incapacidade para fazer política foi decisiva para o insucesso do seu governo. Essa inexperiência negou a ela a compreensão desses valores tão caros ao pluralismo.
É por essa razão que decidi votar pelo Impeachment da presidente Dilma. As denúncias de corrupção indignaram a população e engrossaram as manifestações de rua contra o PT e pela saída da presidente. Como a maioria dos parlamentares aqui, recebi a pressão dos cidadãos do meu estado.
Absorvi as mensagens de indignação que vinham dos meus eleitores cobrando mudanças. Mas a responsabilidade do mandato que me foi conferido não me permitiria tomar uma decisão radical de apoiar o impeachment de um presidente eleito apenas para dar uma resposta a essa enorme indignação.
Quem está no comando do poder central pode e deve ser responsabilizado pelos desvios que ocorreram. Mas o que foi determinante na minha decisão de apoiar o afastamento da presidente é a completa incapacidade de seu governo de comandar o país. Sem capacidade de liderança, o governo paralisa o processo decisório e deixa o país à deriva.
Fomos longe demais nesse impasse – talvez porque acreditávamos num gesto de grandeza da presidente que nos poupasse de tomar essa decisão tão drástica. Também por que devotamos enorme respeito ao mandato conferido pela soberania popular. Mas o fato é que a própria instituição Presidência da República acabou sendo aviltada pela insistência da presidente em permanecer sem qualquer condição para governar.
Fomos longe demais esperando um gesto de humildade de quem se dizia na defesa dos interesses maiores do país. Ela não estava na trincheira dos interesses da nossa população. Estava, isto sim, agarrada a uma posição de comando que ela não tinha capacidade de exercer e, ou não se dava conta disso, ou, pior, não dava a mínima para o que isso representaria para o conjunto da sociedade.
O tempo de recomeçar chegou e nós vamos arregaçar as mangas para recolocar o Brasil nos trilhos. Isso não será uma tarefa fácil, até porque, além do buraco em que já nos meteram, o atual governo continua de forma irresponsável a pregar a resistência: – “Vamos lutar”, dizem. Contra quem? A favor de quê? Da democracia? Ora, é justamente na falta de democracia que esse governo se perdeu!
O Brasil precisa se unir de novo. As diferenças de opiniões continuarão, as disputas de ideias também. Mas vamos juntar a sociedade em torno de um objetivo comum: o de construir uma nação socialmente justa e economicamente próspera.
O impeachment é uma decisão grave para uma situação gravíssima. E a posição que assumimos hoje impõe uma responsabilidade que não se encerra aqui. O compromisso com a mudança será ainda mais forte no momento seguinte com o governo que assume. Medidas duras terão de ser tomadas e nós precisaremos ter a lucidez e a coragem de oferecer maioria parlamentar para as reformas, muitas vezes impopulares, mas que serão necessárias para recolocar o País no rumo certo.
Este é um momento decisivo na história do Brasil e de nossa democracia. Vamos reconstruir as pontes e restaurar os canais de diálogo na sociedade para ajudar nosso País a se reconciliar com seu futuro. O futuro de uma nação próspera e feliz.
* Alex Canziani Silveira é deputado federal, presidente do PTB do Paraná e da Frente Parlamentar da Educação do Congresso Nacional.