Edson Sardinha e Eduardo Militão
Cercada de desconfiança por todos os lados, a mais nova proposta de reforma política do governo Lula
desembarcou ontem (10) no Congresso com velha roupagem para tentar transpor os mesmos obstáculos que impediram o avanço de suas antecessoras.
A julgar pelas mudanças defendidas pelo Executivo, como a adoção do voto em lista fechada e do financiamento público de campanha, poucas são as chances de a espinha dorsal da proposta ser aprovada na atual legislatura. Isso porque essas mesmas medidas já foram rejeitadas pelo Plenário da Câmara em 2007 (
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Distribuído em sete proposições, o pacote traz a rigor duas novidades: o impedimento da candidatura de pessoas condenadas em tribunais de Justiça e a abertura de uma “janela” para os políticos trocarem de partido antes das eleições.
Em junho do ano passado, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) confirmou o entendimento de que somente pessoas condenadas em última instância podem ser consideradas inelegíveis. De acordo com um dos projetos da reforma política, condenados em segunda instância pela Justiça eleitoral ou por crimes contra a administração pública, entre outros, não poderão se candidatar por pelo menos três anos.
Candidatura condenada
O veto também vale para os condenados pelos crimes de abuso do poder econômico ou político, tráfico de drogas, contra o patrimônio público, o mercado financeiro e a fé pública, como falsificação de documentos.
“Isso contempla o artigo 14 da Constituição Federal, que protege alguns valores como a moralidade e a vida pregressa do candidato”, observa o deputado Flávio Dino (PCdoB-MA), ex-presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).
Nas eleições do ano passado, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) encabeçou campanha contra os chamados “ficha suja”, com a divulgação dos candidatos que respondiam a processo na Justiça. O modelo proposto pelo governo, explica Dino, é intermediário entre a proposta da entidade e o que prevê a atual legislação.
Por um lado, não impede a candidatura de processados; por outro, veda que pessoas com vida pregressa no mínimo duvidosa se valham de protelações na Justiça para garantir sua candidatura. “A inelegibilidade vai se dar toda vez que a decisão se der por um colegiado, seja ele o Tribunal de Justiça ou os tribunais superiores”, esclarece o ex-juiz.
O líder do PPS na Câmara, Fernando Coruja (SC), entende que a proposta é razoável. “Para quem já tem uma condenação, eu entendo ser constitucional”, diz o oposicionista. Na avaliação do deputado, a idéia tem boas oportunidades de vingar na Casa. “É um momento de dar uma resposta à sociedade.”
Troca-troca partidário
Na avaliação de Dino, por não afetar diretamente a vida dos parlamentares federais, que só podem ser julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a fidelidade partidária proposta pela reforma tem chances de prosperar, assim como o que prevê a abertura de prazo, a um ano das eleições, para os políticos trocarem de partido.
Proposta semelhante à enviada pelo governo ao Congresso foi aprovada ano passado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O texto que, segundo os críticos, abre uma “janela” para a infidelidade partidária aguarda deliberação em Plenário. “O novo projeto deve ser apensado ao meu. Vou pedir urgência para que eles sejam votados o mais rápido possível”, adianta o deputado.
Em 2007, o TSE e o STF firmaram o entendimento de que o mandato no Legislativo e no Executivo pertence ao partido, e não ao candidato eleito. A decisão foi uma resposta ao constante troca-troca partidário, que, a cada legislatura, inflava a base governista.
Segundo Flávio Dino, as regras impostas pela Justiça foram muito rigorosas. “Temos uma fidelidade partidária pior que a morte, porque depois da morte, pelo menos, ainda temos a ressurreição”, compara.
Na avaliação dele, a abertura de um prazo no período estabelecido para a filiação partidária dos candidatos rompe o engessamento provocado pelo atual sistema, que só permite a troca de partido em caso de expulsão, perseguição ou comprovada alteração programática. “É preciso reconhecer que nem toda mudança é fisiológica. Você pode querer mudar de partido porque o mundo muda”, argumenta.
Líder de um dos partidos que mais perderam parlamentares para a base aliada, Fernando Coruja se mostra contra a janela. “Somos contra essa tese, porque ela fragiliza os partidos. Mesmo que seja apenas por um período, é uma coisa complicada”, rejeita o oposicionista.
Filme repetido
A proposta de Dino
foi aprovada por 33 votos a oito na CCJ em julho do ano passado. O placar dilatado sinaliza que o texto enviado pelo governo também deve encontrar menos resistência do que os pontos mais sensíveis da reforma, como o financiamento público de campanha e o voto em lista fechada.
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