Os repórteres Fausto Macedo e Júlia Affonso, d’O Estado de S. Paulo, informam, em notícia desta manhã, que a Polícia Federal indiciou o escritor e perseguido político italiano Cesare Battisti, detido em Corumbá (MS), por evasão de divisas e lavagem de dinheiro.
Ele foi preso em flagrante ontem (quarta-feira, 4), ao tentar atravessar a fronteira com a Bolívia portando US$ 6 mil em dinheiro (quase R$ 19 mil). Só poderia estar levando um máximo de R$ 10 mil. E não declarou que trazia consigo tal quantia.
Segundo os repórteres, o delegado Iuri de Oliveira da PF, mandou cientificar o juiz da 3.ª Vara Federal e o Ministério Público Federal em Campo Grande, comunicando a prisão em flagrante do preso: “Informe-se a prisão ao consulado/embaixada da Itália, uma vez que se trata de cidadão italiano”, determinou o delegado.
No interrogatório a que o submeteu, a PF insistiu em perguntar o que ele pretendia fazer na Bolívia com tal dinheirama, embora saiba de cor e salteado que Battisti ficou apavorado com a notícia alarmante d’O Globo, sobre tratativas sigilosas entre Brasil e Itália para entregá-lo, ao arrepio da decisão do presidente Lula em 2000, referendada pelo STF em 2001, nas mãos dos revanchistas italianos.
Estes querem fazer cumprir uma sentença de um período em que o Judiciário local ultrapassava todos os limites do Direito civilizado na perseguição encarniçada às centenas de grupúsculos de ultraesquerda, chegando a admitir prisões preventivas (isto é, sem um julgamento no qual o prisioneiro pudesse defender-se) com duração de mais de 10 anos!
E o que é pior: a sentença italiana está prescrita há vários anos!
Falastrões como sempre, os italianos reconhecem que são a mão que move os cordéis por trás dos panos. No Twitter, o ministro das Relações Exteriores Angelino Alfano exultou com a prisão de Battisti, afirmou que quer mesmo arrancá-lo do Brasil e admitiu singelamente as tais tratativas sigilosas que o governo brasileiro nega existirem, segundo informou a agência Ansa. Eis, ipsis litteris, o que ele escreveu:
“Hoje trabalhamos com o embaixador [Antonio] Bernardini para trazer Battisti de volta e entregá-lo à Justiça. Continuamos trabalhando com as autoridades brasileiras”.
Temos de olhar com a máxima apreensão a aparente disposição da PF de encontrar um pelo em ovo que justifique a extradição ou, pelo menos, a deportação para país no qual Cesare não estivesse a salvo da vendeta dos neofascistas italianos.
Compreendo que o companheiro Cesare Battisti tenha ficado transtornado com a ameaça de renovarem a tentativa de 2015, de uma extradição mandrake para a Itália. A notícia d‘O Globo e o aparente alerta que o Rui Martins e eu recebemos eram mesmo para inquietar qualquer um, muito mais alguém que está há tanto tempo sofrendo uma perseguição sem fim. Traumas e estresse foram minando a sua resistência psicológica, até que hoje ele não aguentou mais a barra.
Mas, atravessar a fronteira com a Bolívia não era a solução. Foi um passo precipitado e desastrado. Melhor seria ter ficado por aqui mesmo, num rancho fundo bem pra lá do fim do mundo qualquer. Espero que dê para colarmos os cacos da viola. E que o Brasil lhe devolva a paz de espírito, garantindo que agirá como manda o figurino jurídico.
Cabe às autoridades atuais honrarem a decisão tomada pelo presidente Lula em 2010 e referendada pelo STF em 2011, pois anular um ato jurídico perfeito mediante um mero decreto administrativo, sem consulta ao Supremo, apenas para bajular italianos revanchistas, seria mais um passo no sentido da bananização de nossa república.
<< Ainda o Caso Battisti! As ditaduras não respeitam as leis nem os direitos humanos
*Celso Lungaretti, jornalista e escritor, mantém o blog Náufrago da Utopia