O título é um exagero e tem por inspiração um conto de Gabriel García Marquéz chamado “Ninguém escreve ao coronel”, que conta a história de um velho militar que espera muito tempo por uma carta com aviso de sua pensão e acaba depositando suas esperanças financeiras num galo de briga. Plágio devidamente assumido, vamos em frente…
É claro que se escreve sobre renúncia fiscal (aquele fenômeno que ocorre quando governo abre mão de cobrar tributos) em nosso país. Mas é uma produção tão tímida diante da importância do tema, e tão difícil de ser encontrada, que o exagero do título é justificável.
Estava numa reunião de pauta e precisava apresentar uma sugestão de matéria aos colegas de redação. Até que me veio uma ideia: cruzar a lista de doadores de campanha com a dos contemplados pela renúncia fiscal. Pretendia verificar se a doação para campanhas eleitorais poderia ser considerada um investimento nos anos seguintes via perdão tributário.
Minha matéria morreu no Artigo 198 do Código Tributário Nacional, que diz: “Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades”. Mas daí surgiu o tema do meu trabalho de conclusão de curso.
Apresentei à banca de professores um anteprojeto de lei para que fosse permitida a divulgação dos contemplados pela renúncia fiscal. Nada mais justo, afinal esse tipo de informação tem elevado interesse público, a Lei de Acesso à Informação está em plena forma e a legislação tributária já autoriza a divulgação do pessoal que está inscrito na Dívida Ativa da União.
Mas até agora tudo está muito no campo da teoria. Vamos aos números. Notícia publicada em 16 de outubro de 2013 pela Agência Senado, intitulada “Renúncia fiscal equivale a um quinto das receitas”, afirma: “Em 2014, o Brasil abrirá mão de 20,66% das receitas tributárias, conforme o projeto de lei do Orçamento da União (PL 9/2013-CN). Isso equivale a R$ 249,8 bilhões, mais do que a soma de investimentos em saúde (R$ 100,3 bilhões), educação (R$ 92,4 bilhões) e Brasil sem Miséria (R$ 32,6 bilhões)”.
Como se não bastasse, a matéria ainda faz um pequeno e representativo histórico da renúncia fiscal em nosso país. “Em 11 anos, a estimativa de renúncia foi multiplicada por dez: de R$ 24 bilhões, em 2003, para R$ 249,8 bilhões, em 2014.”
O texto está ficando longo e eu ainda ia falar que encontrei um relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) sugerindo que essas informações sobre renúncia fiscal venham na peça orçamentária de cada ano. Quant o maior a transparência, mais chances tem a economia de ser saudável. Mas ficarei por aqui, não antes sem confessar que entreguei meu anteprojeto ao senador Randolfe Rodrigues (Psol-AP). A assessoria dele me jura que a proposta será apresentada…