Jorge Samek*
Sempre me orgulhei de estar construindo uma biografia, o que é muito mais do que montar um currículo. Criado na escola do inigualável senso de justiça das famílias Lacki e Samek, com avós poloneses que vieram fazer do Brasil sua América, tenho até agora me pautado pelas lições recebidas. Minha vida é assim: simples, com projetos claros e bem definidos – criar os filhos, apoiar as netas e servir à causa pública.
Menino de Foz do Iguaçu, engenheiro agrônomo, fiz de Curitiba, a partir dos anos 70, o campo de ação, de vivência plena da cidadania. Na universidade, lutei pela democracia.
Terminado o curso de Agronomia, fui trabalhar como chefe do antigo Instituto de Terras, Cartografia e Florestas (ITCF) no litoral. Ao lado de outros companheiros da causa ambiental, lutei em defesa da mata atlântica, pela demarcação do Parque Estadual Pico do Marumby e pelo resgate, para o domínio do estado, da ilha do Superagüí, sítio de patrimônio natural da humanidade reconhecido pela Unesco.
Em 1982, começo da redemocratização, na primeira eleição pelo voto direto, apoiei o saudoso José Richa ao governo. Com a eleição de Richa, fui chamado a integrar a equipe como diretor da Secretaria de Estado da Agricultura. Implantamos um programa revolucionário de microbacias e manejo integrado dos solos, que marcou época na agricultura paranaense.
Dois anos depois, Roberto Requião eleito prefeito de Curitiba, por ele fui chamado, eu com pouco mais de 30 anos, a montar a Secretaria Municipal de Agricultura e do Abastecimento. Era um período de inflação galopante. Lançamos uma série de programas, alguns que viraram referência nacional e funcionam até hoje, para aproximar o produtor do consumidor e baixar o preço dos alimentos.
Curitiba fez-me vereador por quatro mandatos seguidos, numa atuação em que não apenas acredito ter construído reputação ilibada, acima de quaisquer suspeitas de que o interesse público não fosse o meu único alvo. Também leguei ações parlamentares de importância indiscutível, como a Lei Municipal do Meio Ambiente.
PublicidadeNa Câmara, travei intensos debates para mudar o plano diretor da cidade, preservar o meio ambiente, melhorar o nosso sistema de transporte coletivo, a qualidade do ensino e do atendimento à saúde, as condições de moradia dos curitibanos.
Creio ter dado minha parcela de contribuição para que Curitiba chegasse à qualidade de vida que tem hoje. Os anais da Câmara Municipal estão à disposição da história, para confirmar minha vida parlamentar.
Curitiba deu-me também um mandato de deputado federal, o mais votado da cidade e região metropolitana, em 2002. Esse resultado foi novo aval, assim o entendi, ao meu trabalho e à coerência com que sempre me mantive firme na defesa de minhas metas. Afinal, o Paraná me conhece, e assim não há como a injúria fixar seus dejetos ao meu nome.
Convidado pelo Presidente Lula, assumi a direção geral brasileira de Itaipu, em janeiro de 2003. E a tenho dirigido sempre pautado pela ética e o respeito ao interesse público.
Homem de diálogo, de espírito desarmado, vejo-me, de repente, obrigado a terçar armas. Em defesa de meu maior patrimônio, a honra. Tudo, menos atentados contra minha honra.
Pois que, gratuitamente, dentro dessa onda de denuncismo que abala o país, meu nome foi apontado, primeiro na revista IstoÉ, por um estelionatário condenado pela Justiça, ex-funcionário da binacional, da qual se demitiu em 1992, e na qual jamais exerceu posição de relevo que lhe permitisse arrogar-se autoridade em coisa nenhuma, como supostamente envolvido (eu e meus antecessores) numa história fantástica, inverossímil e cheia de contradições, de gerir um caixa dois bilionário em Itaipu.
Depois na revista Veja, que me acusou, levianamente, e à Itaipu de perdoar dívida milionária de um fornecedor, em troca de imaginária cobrança de "propina", para abastecer o suposto mensalão.
Não só pelos números envolvidos, com contas que não fecham nem para sustentar altissonantes calúnias, mas sobretudo pelos personagens que a montaram, a mentira tem de ser contestada.
Fiz e continuarei a fazer o que se espera de todo homem público: fui à Comissão de Ética Pública do Governo Federal, abri meus sigilos bancário, fiscal e telefônico e pedi para ser investigado; acionei a Polícia Federal e o Ministério Público Federal para que todos os supostos fatos denunciados pelas duas revistas sejam rigorosamente apurados; coloquei-me à disposição do Congresso Nacional para os esclarecimentos necessários; recorri ao Judiciário; expus-me aos meios de comunicação contestando os crimes e os criminosos.
Da Justiça, veio a primeira decisão favorável, da juíza federal substituta, Mônica Aparecida Bonavina Camargo, da 8ª Vara Federal Criminal, de São Paulo. Ela determinou que a revista IstoÉ acatasse o direito de resposta à matéria caluniosa apresentada em sua edição de 18 de janeiro de 2006.
Outros passos tive de dar, na mesma linha de defesa da própria honra, jamais antes atingida: da revista Veja exijo, na Justiça Federal, ampla retratação. Veja publicou uma sucessão de absurdos tendo como informantes indivíduos com passado duvidoso, sem credibilidade. A revista assim agasalhou, sem qualquer aprofundamento, aleivosias sobre fantásticas propinas, jamais cobradas. Esses fatos afetaram-me. Mas a calúnia é mal contra o qual há remédios na democracia.
A carta conjunta que comigo assinaram os ex-diretores gerais de Itaipu, Euclides Scalco e Francisco Gomide, é honroso aval de dois nomes paradigmáticos da vida pública à minha atuação à frente da empresa. É resposta de homens de bem à patologia da calúnia maquinada, mas que há de se esgotar em si mesma. Mesmo que acatada por meios de comunicação importantes. Embora eu, por formação, seja absolutamente pró-liberdade de imprensa, com responsabilidade, é a ressalva.
Como não sou dissimulado, não aprendi a fazer cenas, considero a vida pública coisa séria. Por isso, não nego: vivo uma situação dolorosa, constrangedora, que me obriga a bradar contra os criminosos e os que lhes dão apoio e acatam suas diatribes. Sempre encarando as pessoas nos olhos, sinto que estão a me questionar, mesmo que em silêncio. A dúvida foi ardilosamente semeada.
Por isso, insisto: tudo, menos a honra. E que aflore apenas a verdade, remédio definitivo a curar uma ferida aberta. Eu, de minha parte, continuarei a agir como aprendi desde o berço, sob aquele “senso de justiça de polacos”, implacável, irredutível, inarredável. É o amor à verdade dos Lacki e dos Samek, gente que tem história. E que me ensinaram a dizer e – a reclamar – a verdade, nada mais que a verdade, em qualquer circunstância.
*Jorge Samek é diretor-geral brasileiro da Itaipu Binacional.