Erich Decat
O projeto de lei (PL 3299/08) que prevê o fim do fator previdenciário, elemento que estabelece o valor final do benefício de mais 11 milhões de aposentados, irá receber nesta semana o primeiro parecer desde que chegou à Câmara, após conturbada aprovação no Senado.
Apesar da polêmica que gira em torno do tema, o relator da proposta na Comissão de Seguridade Social e Família, deputado Germano Bonow (DEM-RS), adiantou ao Congresso em Foco que deve recomendar o fim da regra.
“Temos que derrubar o fator. Mas ainda estou aguardando dados do Ministério da Previdência que apontam o número de trabalhadores que já se aposentaram depois de 35 anos de contribuição, mas que voltaram a trabalhar e ainda contribuem para o sistema”, ponderou Bonow.
A medida divide especialistas da área que, apesar de não serem totalmente favoráveis ao fator previdenciário, acreditam que o mecanismo seja um “mal necessário” para o equilíbrio das finanças públicas. O governo resiste à alteração, temendo maior desequilíbrio nas contas da Previdência.
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Segundo cálculos do diretor do Ministério da Previdência Social, João Donadon, se o fator for excluído, as despesas com os benefícios previdenciários poderão chegar, nos próximos 40 anos, a 16,3% do Produto Interno Bruto (PIB). Já para o senador Paulo Paim (PT-RS), autor da proposta, diante do contínuo aumento das receitas federais, o Brasil nunca desfrutou de uma situação tão propícia para eliminar o dispositivo como agora.
Fator de desmotivação
A forma de calcular a pensão dos segurados em questão entrou em vigor em dezembro de 1999 e teve como principal objetivo desmotivar o pedido de aposentadoria por idade, uma vez que, quanto menor é a idade do segurado, maior é o redutor aplicado sobre o benefício.
A regra estabelece, no entanto, que apenas os trabalhadores que se aposentam por tempo de contribuição são obrigados a se submeter ao fator. Neste caso, quanto maior o tempo de contribuição, menor o redutor aplicado.
O valor do fator previdenciário varia de caso para caso. Para saber o impacto sobre a aposentadoria, o segurado deve entrar no sistema da Previdência Social e informar a data de nascimento, o tempo de contribuição e os salários de contribuição desde julho de 1994.
“Quem se aposenta por tempo de contribuição é normalmente quem tem uma trajetória profissional mais regular e uma trajetória de salário ascendente. Normalmente, são pessoas que têm uma melhor qualificação, tanto profissional quanto intelectual, têm mais tempo de estudo do que os outros”, explica Donadon.
Redistribuição de renda invertida
Segundo ele, dentro desse quadro, os valores dos benefícios são naturalmente maiores do que os de aposentadoria por idade. “Com uma eventual eliminação do fator previdenciário, nós estaremos fazendo uma redistribuição de renda invertida em que o mais beneficiados seriam exatamente aqueles que já têm mais benefícios”, avalia.
O valor médio dos benefícios pagos, de acordo com dados do Ministério da Previdência Social, nos último seis meses, foi de R$ 600,48. O montante representa um aumento de 17% em comparação com a média do mesmo período de 2001. Apesar do acréscimo, em junho deste ano, 68,4% dos beneficiários (17,5 milhões) tiveram direito a apenas um salário mínimo.
“Eu propus revogar o fator, voltar à fórmula anterior. Com isso, você vai ter garantido o princípio da integralidade. A Previdência nunca esteve numa situação melhor do que a atual, nunca se arrecadou tanto e todos os recursos da Previdência são também arrecadados na chamada Super Receita. É o momento propício. Vamos voltar ao sistema que sempre tivemos e que nunca causou déficit na Previdência”, defendeu o senador Paulo Paim.
No acumulado de janeiro a junho deste ano, a Previdência teve uma receita líquida de R$ 74,9 bilhões ante os R$ 67,9 bilhões acumulados no mesmo período de 2007.
Déficit em alta
Apesar de uma melhora na arrecadação, o déficit registrado no primeiro semestre de 2008 foi de R$ 18,5 bilhões. Apenas em junho, a arrecadação líquida foi de R$ 12,9 bilhões e as despesas R$ 15,8 bilhões. A perspectiva do ministério é de um déficit de R$ 38,5 bilhões neste ano.
“O sistema previdenciário tem que ser pensado a médio e longo prazo, porque ele funciona como uma espécie de pacto entre gerações. A geração que trabalha hoje está pagando benefícios para aqueles que se aposentaram ontem. Eu não posso, por uma eventual folga de caixa, pegar e comprometer esses valores, até porque, se eu aumento o valor das rendas dos aposentados e depois a economia cai, eu não posso mexer no salário deles”, ressalta Donadon.
A economia registrada com a aplicação do fator previdenciário em 2000 foi de R$ 23,1 milhões. No ano passado, esse valor saltou para R$ 3,4 bilhões. O acumulado dos últimos sete anos chega a R$ 10,1 bilhões.
Aplicação facultativa
Para aqueles que preferem se aposentar por idade, a aplicação do fator é facultativa e ocorre apenas no caso em que for vantajoso para o trabalhador, ou seja, se o valor final do benefício, depois de aplicado o redutor, não for menor do que o inicial previsto.
O dispositivo não é aplicado, no entanto, para as aposentadorias especiais, por invalidez, pensão, auxílio-acidente, salário-maternidade e auxílio-reclusão.
Além do tempo de contribuição, outro elemento que influi no valor do redutor previdenciário é a expectativa de sobrevida, que é revista todo o ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
“Acredito que esse é um dos pontos negativos para o segurado do INSS, porque ele não sabe se vai receber mais ou menos de um ano para o outro”, ressalta o técnico de Planejamento e Pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) Leonardo Alves Rangel.
Tramitação
Têm direito a se aposentar por idade os trabalhadores urbanos de 65 anos de idade, no caso dos homens, e 60 anos, no caso das mulheres. Já os trabalhadores rurais podem se aposentar dentro desse critério com cinco anos de antecedência, ou seja, com 60 anos (homens) e 55 anos (mulheres).
Para solicitar a aposentadoria integral por tempo de contribuição, é preciso que o trabalhador comprove ter pago os encargos salariais por, no mínimo, 35 anos. No caso da mulher, esse período é de 30 anos.
Antes de ir para o Plenário da Câmara, a proposta que está na Comissão de Seguridade Social e Família deverá passar pelas comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Caso seja alterado pelos deputados, o texto retornará ao Senado, onde foi aprovado no primeiro semestre.
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