Marcos Magalhães |
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Pode ter sido em uma revista envelhecida, no cinema ou em algum livro de história. Mas cada brasileiro lembra de ter visto a imagem em branco e preto de um tempo em que crescimento econômico rimava com liberdade. Em que liberdade combinava com a explosão criativa de um país em busca de si mesmo. Tempo em que o poder era sorridente e o Brasil apostava no futuro. O momento é mesmo outro. Bem mais violento, como mostram as balas dos traficantes que riscaram o céu do Leblon no último final de semana. Mais desigual e excludente, como atestam os indecentes índices de desemprego. Mas também cheio de oportunidades para um país que não atira no próprio pé. O Brasil está na moda. Os jovens desfilam de camisa amarela pelas ruas de Atenas. As vitrines da Selfridges exibiram recentemente uma réplica do Cristo Redentor, em Londres. A nova música brasileira está nas rádios de Tóquio e Nova York. A inflação anda quase européia. Há quem aposte em crescimento asiático nos próximos anos. E, no entanto, não se respira otimismo. Foi necessário quase meio século para que surgisse uma nova janela de crescimento econômico com liberdade. Depois que os primeiros fuscas saíram das linhas de produção, em São Paulo, o país foi sacudido por uma renúncia, um governo atribulado pela ameaça de golpe, um longo período militar, uma lenta abertura, uma morte inesperada, um impeachment e diversos planos econômicos. Uma vez assegurada a liberdade e aberta a possibilidade de um novo crescimento, quem pensaria em recolocar em debate a questão da democracia? Pois é o tema do momento. A liberdade de imprensa, garantida pela Constituição depois de anos de longas batalhas políticas, não pode ser considerada, segundo a visão oficial, como um valor absoluto. O grau de relatividade admitido dessa liberdade teria de ser calibrado por meio de uma nova legislação capaz de punir os profissionais que cometessem supostos abusos na apuração dos fatos. A produção audiovisual brasileira, por sua vez, não consegue celebrar em paz o momento de expansão e reconhecimento. Os cineastas ainda têm a câmera na mão, como antes. Mas também uma preocupação na cabeça. Preocupação com as possibilidades de dirigismo e de censura que têm sido identificadas no projeto de criação da Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual. As ameaças de retrocesso só ajudam a contaminar o ambiente político. Criam desconfiança e confronto no momento em que o país começa a projetar um cenário de crescimento. E garantem munição a debates no Parlamento que passam longe das prioridades eleitas pelo Executivo, como o projeto das parcerias público-privadas – sem o qual o país seria forçado a conviver com baixos índices de crescimento, de acordo com a equipe econômica, ao longo dos próximos anos. A mudança desse quadro depende de iniciativa política. Menos de confronto do que de serenidade, tolerância e diálogo. Muitos candidatos a ocupar o Palácio do Planalto no futuro próximo adorariam ter a possibilidade de mostrar que são capazes de promover a reaproximação entre crescimento econômico, liberdade política e uma certa aposta no futuro. |