Vivemos dias de pessimismo climático. Há relatórios científicos muito preocupantes sobre os efeitos exponenciais do aquecimento global: liberação massiva do metano dopermafrost ártico e do fundo dos oceanos. Perda da capacidade desses mesmos oceanos e das florestas tropicais de absorção de carbono. Crise econômica e ação dos negacionistas climáticos, sobretudo os republicanos norte-americanos, que impedem qualquer avanço, este ano, no segundo maior país emissor. Distância abissal existente entre a soma do conjunto de metas obrigatórias (Anexo 1 do Protocolo de Kioto) e voluntárias (NAMAS de Copenhagen e Cancún) e o mínimo que os cientistas do IPCC dizem ser necessário para limitar a concentração de gases de efeito estufa (GEE) abaixo do limite de 450ppm, com alguma chance de manter o aquecimento médio do planeta abaixo de 2 graus. Já se projetam aumentos de temperatura média do planeta entre 3 e 6 graus.
No Oriente Médio, também são tempos de pessimismo. O governo de direita e extrema-direita de Benjamin Netanyahu intensifica a expansão dos assentamentos na Cisjordânia e Jerusalém Leste, afastando cada vez mais a perspectiva de criação do estado palestino. Consegue chantagear com eficácia a administração Obama, neste ano eleitoral, com a mobilização massiva dos republicanos e de uma parte dos democratas para que o presidente americano pare de pressionar em relação aos assentamentos (já parou…) e consinta com um ataque preventivo de Israel a instalações nucleares do Irã ou que lhe prometa que os EUA irão fazê-lo eles próprios. Enquanto isso, o povo sírio é massacrado, com apoio do Irã e do Hezbollah, e a primavera árabe guina politicamente rumo aos partidos islâmicos. Em Israel, a população se deixa enganar por uma falsa sensação de segurança e por uma situação econômica melhor do que a da Europa. Vivem na ilha da fantasia indiferentes ao sofrimento dos palestinos e a seu próprio isolamento na região. Todos os ingredientes de uma grande explosão estão se combinando de forma perigosa, mas as avestruzes enterram suas cabeças na areia do deserto.
E se juntarmos essas duas quadraturas do círculo?
É o que estamos fazendo ao convidar para a iniciativa Rio/Clima – The Rio Climate Challenge –, uma simulação do que poderia ser um acordo do Clima que atendesse aos mínimos parâmetros do IPCC para manter a concentração de GEE na atmosfera em 450 ppm (já vamos a 390 ppm), os artífices de uma outra simulação: a Iniciativa de Genebra que, em 2003, negociou um completo e detalhado tratado de paz entre Israel e palestinos.
Durante quatro anos, duas equipes de especialistas do mais alto nível trabalharam secretamente sob a coordenação do ex-ministro da Justiça de Israel Yossi Beilin e do ex-minstro da Cultura da Autoridade Palestina Yasser Abed Rabbo. O Acordo de Genebra que resultou dessa negociação é o mais completo e detalhado guia de estrada para a paz. Está “na prateleira” porque o atual governo de Israel não tem a menor intenção de negociar uma paz justa com os palestinos – aos quais oferece o apartheid dos bantustões – e porque os palestinos estão divididos entre o Fatah e outros setores moderados, que aceitariam uma solução desde que justa, e o Hamas, que até agora nega-se a um acordo de paz com Israel, como princípio, ainda que admita uma hudna(trégua) de longa duração que poderia, eventualmente, ser um primeiro passo.
Mas a experiência de Yossi e Yasser na iniciativa de Genebra é importante para nossa simulação de uma negociação sobre o Clima. Ambos foram convidados para o Rio/Clima e aceitaram participar, com entusiasmo, inclusive dos trabalhos preparatórios. Yossi e Yasser estarão em Brasília na quinta-feira 12/4 para uma audiência no Congresso e encontros de alto nível na esfera governamental. Depois seguirão para a reunião preparatória da Rio/Clima, em Recife.
O que um velho e renitente conflito tribal/nacional, com componente religioso numa região com “demasiada história para tão pouca geografia” tem de comum com essa quadratura do círculo global na qual sabemos que estamos condenando nossos netos e bisnetos a um contexto climático catastrófico mas não conseguimos encontrar a equação econômica/tecnológica e o consenso político para agir de forma significativa? Claramente vamos encontrar esse parentesco até porque Israel, Palestina e seus vizinhos: Jordânia, Síria, Líbano, Egito e outros da região estão dentre os mais ameaçados pelas consequências das mudanças climáticas: esgotamento das suas escassas águas, o desaparecimento do Mar Morto, as secas afetando o delta do Nilo e o Jordão. Do ponto de vista climático também faz todo sentido a presença de palestinos e israelenses, juntos, na busca de soluções aos problemas que os afetarão com toda certeza. Com ou sem paz, agora.
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