Jamil Murad* |
Não é preciso ir muito longe: se não aconteceu com você, certamente há um conhecido – parente, amigo ou colega de trabalho – que foi lesado por planos de saúde. E isto não é à toa, já que nada menos do que 21% da população brasileira, ou cerca de 38 milhões de pessoas, possuem algum tipo de plano privado de saúde. O crescimento do setor, ocorrido sobretudo na década de 90, foi seguido pela explosão do número de reclamações contra as empresas de saúde nos órgãos de defesa do consumidor. Desde então, os planos de assistência hospitalar passaram a revezar com os serviços de telefonia o primeiro lugar no ranking de empresas que mais desrespeitam os usuários. E por que isto acontece? Vários fatores colaboram para que as empresas simplesmente ignorem os direitos dos usuários e cometam abusos dos mais diversos tipos. O principal deles é, com certeza, o sucateamento da rede pública de saúde. Tenho certeza de que se os governos, em todos os níveis, priorizassem esta área, poucos se disporiam a comprometer seu orçamento familiar com serviços privados de saúde. Mas existem outros fatores que contribuem para que muitas empresas atuem à margem da lei. A sensação de impunidade que impera no setor é um dos principais, já que muitas operadoras – inclusive ligadas a bancos e seguradoras – simplesmente ignoram as multas e outras punições aplicadas pela Agência Nacional de Saúde (ANS). Para ajudar a barrar mais este abuso dos planos de saúde, apresentei o Projeto de Lei 4632/04 na Câmara dos Deputados. Nele, proponho que os planos privados de saúde sejam obrigados a fazer o depósito do valor das multas aplicadas pela ANS antes de entrarem com recurso contra o valor ou o mérito da punição. Essa medida visa a acabar com a prática das operadoras de questionar as multas judicialmente com o único objetivo de protelar o pagamento, arrastando os processos por anos a fio. Acredito que com o endurecimento das regras, inclusive obrigando os planos de saúde a cumprirem as leis já existentes e a pagarem as multas aplicadas pelo governo, as empresas pensarão duas vezes antes de deixarem milhões de usuários sem cobertura justamente nos momentos em que mais precisam. O projeto está tramitando em caráter conclusivo na Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados – o que significa que não precisa ser votado pelo plenário, mas apenas aprovado pela comissão. Mesmo assim não é fácil. Muitos parlamentares estão alinhados com os interesses das operadoras, como pôde ser constatado durante a CPI dos Planos de Saúde, da qual participei como membro efetivo e que terminou sem que houvesse punição efetiva contra os abusos praticados. Para que o projeto seja aprovado é preciso que seu teor seja divulgado pelos meios de comunicação e que usuários dos planos de saúde solicitem aos parlamentares membros da Comissão de Seguridade Social que votem favoravelmente à proposta. Apenas assim conseguiremos enfraquecer o poderoso lobby dos planos de saúde no Congresso Nacional. * Jamil Murad é médico, deputado federal pelo PCdoB–SP e membro da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito para investigar a violência no campo (CPMI da Terra). Endereço eletrônico: dep.jamilmurad@camara.gov.br. Internet: www.jamilmurad.com.br |