Renata Camargo
Sem qualquer pompa, o Brasil deu um passo importantíssimo na semana passada. Depois de 19 anos tramitando na Câmara, os deputados aprovaram o projeto de lei que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. A proposta, que será o marco regulatório para a gestão do lixo no país, foi aprovada “em um momento de pouco entusiasmo”. E agora é preciso pressionar o Senado para votar a matéria o mais rápido possível.
A falta de entusiasmo na votação da Câmara foi detectada pelo próprio presidente Michel Temer, que lamentou que um projeto de “grande significação” tenha sido aprovado sem a tão requerida “ampla divulgação da imprensa”. Em meio à briga para ver quem fica com os royalties do pré-sal – assunto que tem se estendido como tema principal do Congresso há meses –, deputados, jornalistas, assessores e público em geral deixaram de escanteio a aprovação desse marco histórico.
Certo que a votação da matéria pegou a grande maioria de surpresa numa longa noite de quarta-feira. Mas, com exceção da mídia especializada, apenas alguns veículos de comunicação deram registro (tímido) da aprovação do projeto. E nenhum foi capaz de escarafunchar a matéria e mostrar à população os reflexos que a proposta terá na vida dos brasileiros. A relevância do tema, depois de todos esses anos no Congresso, ainda precisa conquistar o público.
O primeiro reflexo que essa política terá no dia-a-dia do brasileiro resultará numa profunda mudança de hábito. A coleta seletiva, que hoje é feita como ação ecologicamente correta esporádica, se tornará uma rotina, pois a política nacional estabelece os planos de resíduos sólidos e junto com eles a necessidade de estados e municípios instituírem a coleta seletiva.
Outro reflexo importante virá do setor empresarial. Os empresários serão obrigados a recolher do mercado os materiais recicláveis ou reaproveitáveis como embalagens, caixas, eletrônicos, pilhas e outros. Ou seja, depois de usado, o consumidor terá que “devolver” ao comerciante, fabricante, distribuidor ou qualquer outro responsável os produtos que possam ser reciclados ou reaproveitados. Será instituída uma nova lógica (a lógica reversa).
A proposta interfere também na vida do brasileiro ao proibir o lançamento a céu aberto de resíduos sólidos ou rejeitos e coibir a queima de lixo também a céu aberto. Do ponto de vista legal, os conhecidos lixões serão extintos e os municípios serão obrigados a adotar programas para tratar seus resíduos.
O rol de consequências dessa política nacional na vida do brasileiro é imenso. O tema, no entanto, ainda não despertou a curiosidade necessária da população e esse desinteresse pode refletir negativamente nesse avanço que tivemos dentro do Congresso. A questão é que a matéria precisa ser votada no Senado a tempo de ser sancionada pelo presidente Lula ainda este ano, para não correr o risco de ficar para a próxima legislatura. E, se não houver pressão popular, é possível que o projeto – que esperou 19 anos para passar na Câmara – fique mais outros muitos nas mãos dos senadores.
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