João Vieira *
Noite inteirinha “atropelada” pelos carros sonorizados – vários – em Pirenópolis! O centro histórico do velho nicho barroco, já quase tricentenário, assiste impotente a baderneiros, aos magotes, a pé e montados num vai-e-vem constante até o clarear do dia! O aparato de segurança da cidade, pelo seu braço armado e igualmente montado, a tudo vê passivamente, indiferentemente, num dispêndio inútil de combustível, por conta do contribuinte! De duas, uma: ou a ronda de segurança, então conivente, os teme porque brigões e abusados, “turbinados”, ou sabota a tranquilidade pública em oposição – frontal – à administração instalada desde o pleito eleitoral municipal.
Este escriba que se desmancha em gosto e ternura pelo pólo turístico impar que é Pirenópolis, Goiás, ou mais adequadamente, Goyaz, o qual acumula ou cumula-se de excelências como a gastronomia regional, a espetaculosa ecologia e sua rica história; e que no seu conjunto, resiste ao tempo, intempéries e percalços, seja isso de ordem natural ou ganância argentária; ou ainda frouxidão social e quase quebra econômica geral. Sem falar da violência endêmica desses tempos de “inverno ético” generalizado. Globalizado!
A esperança de salvação está, como diz o economista E. F. Schumacher, no pequeno; no diminuto; no familiar e/ou comunitário. No artesanal e por isso mesmo em redutos como Pirenópolis. Mas, uma Pirenópolis sem a invasão sazonal da turba desarvorada de linhagem social rica, ou pobre, igualmente consumista compulsiva. E, por causa ou por tal, temerária…
Tá feia a coisa… Já sentenciara o cancioneiro caipira, vale dizer, Tião Carreiro e Pardinho.
Este escriba, dizíamos, dá seu testemunho da protagonização de cena insólita em que fizera parar uma viatura policial, transeunte, para reclamar dos carros sonorizados com astronômicos decibéis e também da gritaria e baderna dos mais jovens na inquieta madrugada de aleluia, no Largo da Matriz, neste ano passante de 2009. Em nada se fazendo ou acontecendo, pedimos, então, a orientação de como proceder/resolver…
A resposta foi esta: ir ao juiz no próximo dia útil, solicitar uma ordem escrita – e aí levá-la ao Comando Central para que providências fossem tomadas…
Desencantado, decidi recolher-me, enquanto a viatura da ronda, seguida de mais outra, dava sequência ao seu rondar espiativo, dispendioso – sem fim e finalidade!
Ia eu cerrando a porta quando um grupo de rapazes saiu em desabalada carreira, aos gritos e em perseguição a um terceiro, que foi logo alcançado, derrubado e impiedosamente chutado, espancado e que deve ter dado entrada no pronto socorro hospitalar contundido às pastas e/ou postas, se vivo! Aí fechei de vez a porta, peguei o telefone e em nevrálgica recorrência, implorei pelo socorro policial.
Quando recobrei a coragem, saí pra fora e deparei com duas viaturas, da garantia de paz púbica, bloqueando o “corso”, e foi a vez de receber a explicação: ”Eles estavam brigando e foram mandados dispersar”…
(É bem verdade que muitas dos problemas com a segurança e paz públicas, advém do mau funcionamento da Justiça, com sua morosidade e mais muitas falhas, como as defasagens, o anacronismo, o preciosismo, que emperram, esgarçam e desgastam o seu desempenho. Isso sem dizer de certos senões – pontuais? – como a corrupção ou inteiresseirismo, de efeito nefasto, devastador. Lembrem-se ainda, para ilustração, as negligências “programadas” e a insólita e desconcertante “indústria das liminares”… São senões visíveis ao olhar cidadão, desse sistema judiciário pátrio, nosso – nobre – Poder Judiciário. Republicano?)
O certo e claro, conclusivo, é que Pirenópolis ou qualquer pólo turístico interessante, lugarejo, núcleo comunitário ou cidade, daquelas urbs e civitas de verdade, não podem sucumbir. Sucumbir ao desmanche social e econômico gratuitos. Universais. Globais.
* Sociólogo e professor universitário aposentado, João Vieira foi diretor do Museu Rondon, da Universidade Federal do Mato Grosso. E-mail: joaovieira01@pop.com.