O Brasil pretende, mais uma vez, buscar o papel de protagonista das negociações internacionais envolvendo temas ambientais. A oportunidade da vez será a Conferência das Partes sobre Biodiversidade (COP-10), que será realizada em outubro em Nagoya, no Japão. O objetivo do encontro é debater propostas e estabelecer metas para o uso sustentável da biodiversidade no mundo.
A conferência da biodiversidade ocorre meses depois do fracasso da COP-15, em que foram discutidas propostas para conter o aquecimento global. Sem consenso entre os chefes de Estado, a conferência do clima levou a lugar nenhum e desiludiu os que pensavam que era possível estabelecer um acordo comum para buscar soluções globais para o aumento da temperatura.
Meses depois, o Brasil se prepara para uma nova rodada de negociações sobre questões ambientais e, apesar de novas metas e novas propostas que prometem ser levadas à conferência, o país deve apresentar aos participantes da COP-10 o mesmo discurso: nos comprometeremos a cumprir metas audaciosas, desde que os países ricos paguem por elas.
Apesar de o Brasil estar em um novo patamar em termos de desenvolvimento e crescimento econômico, os negociadores brasileiros vão insistir na estratégia de exigir recursos financeiros, econômicos e tecnológicos dos países ditos desenvolvidos. Os envolvidos nesse processo alegam que essa estratégia faz parte do “DNA” do negociador brasileiro e que esse é um “discurso tradicional do Brasil nos esforços internacionais de negociação, que vem desde sempre”.
A intenção é forçar que os países desenvolvidos cumpram a sua parte em reduzir a zero a perda de biodiversidade no mundo. Como muitos deles não contam mais, ou nunca contaram, com uma biodiversidade tão diversa como nos países tropicais, esses países ricos deveriam, de acordo com a cabeça dos negociadores brasileiros, pagar para quem pode preservar.
A lógica faz sentido. Na busca para reduzir os efeitos de um colapso ambiental, como preveem cientistas, cada um deve fazer a sua parte como pode. Os que têm mais recursos financeiros e tecnológicos devem dispor de dinheiro e investimento em tecnologia e capacitação de recursos humanos nos países menos desenvolvidos para auxiliar àqueles guardiões de fauna e flora megadiversas.
Uma pergunta, no entanto, fica no ar: será que essa estratégia de negociação brasileira vai funcionar? Tudo indica que não. Mais uma vez, anos depois, os países chegam a mais uma conferência ambiental de cabeças baixas. As nações se reencontram e observam que ninguém cumpriu o que prometeu há oito anos.
Em relação à biodiversidade, em 2002, os países acordaram reduzir significativamente a taxa de perda de biodiversidade em níveis global, regional e nacional, como uma contribuição, inclusive, para diminuir a pobreza no mundo e beneficiar de modo geral a vida de todos os seres. Mas, nenhuma das 21 submetas acordadas foi cumprida e algumas, aliás, correram na contramão do que se buscava no discurso.
A submeta, por exemplo, de reduzir o consumo não sustentável de recursos biológicos, ou o consumo que cause impacto sobre a biodiversidade ficou em vermelho no relatório do Panorama da Biodiversidade Global, o que indica que esse consumo aumentou ao invés de reduzir. Assim, também não foi cumprida a submeta de manter recursos biológicos que sustentam a vida de pessoas mais pobres. Na realidade, nos últimos oito anos, muitos desses recursos entraram em declínio.
Mesmo os países não tendo cumprido suas metas de preservação da biodiversidade, a conferência de outubro agora pretende estabelecer metas ainda mais ambiciosas. Em vez de redução “significativa” da perda da biodiversidade, a versão preliminar da revisão do plano estratégico da Convenção sobre a Diversidade Biológica fala em reduzir a “zero”.
Meta ambiciosa? Utopia? Provável. O fato é que se não houver mudança no “DNA”, dificilmente se alcançará o cumprimento de um décimo desse sonho de um futuro ideal. Fim da pobreza, perda mínima de biodiversidade, preservação total de conhecimentos tradicionais, aumento considerável de áreas preservadas, e outras ideias ideais de um mundo melhor só serão possíveis com mudanças de estratégias.
Os países desenvolvidos devem se comprometer com transferência de recursos financeiros para os países em desenvolvimento, como já havia sido acordado no passado, e não foi globalmente cumprido. Mas países como Brasil, China, Índia também têm condições de firmar compromisso nesse sentido, ainda que em volume menor de recursos. O importante é o Brasil não se apegar a antigas estratégias de negociação, mas sim propor, como um líder, novos caminhos de acordo para alcançar avanços no plano internacional.