Rodrigo Prada *
Dear Mister Blatter,
Vou escrever em português, pois mais de 80% das pessoas do meu país não falam um segundo idioma. Nosso ministro do Esporte, Orlando Silva, convidou o senhor para visitar o Brasil ainda neste semestre, para acompanhar o andamento das obras para a Copa do Mundo de 2014. O senhor poderá ver de perto que já estamos prontos para receber o Mundial. Só tenho algumas dicas importantes para que o senhor aproveite da melhor forma possível sua estada no Brasil.
Começar seu tour na sexta-feira seria uma ótima ideia, mas corra para reservar um quarto de hotel. Na verdade, esse probleminha só ocorre em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Cuiabá, Brasília, Manaus e Recife.
Bom, após reservar o hotel, compre passagem com destino a Guarulhos, pois é o principal aeroporto da América do Sul.
Mas, aí, terei umas dicas preciosas.
Primeiro, concentre suas roupas na bagagem de mão, pois em 35% das vezes a bagagem despachada é perdida.
Além disso, aproveite para fazer amigos na fila de controle de passaportes do aeroporto, pois chegam cinco voos no mesmo horário e temos apenas seis postos de inspeção. Mesmo que demore, não tem importância, pois a bagagem também irá demorar em torno de uma hora. Aproveite para conhecer nosso Duty Free.
Traga uns relógios para distribuir aos nossos governantes. Afinal, eles estão cumprindo o cronograma com precisão suíça. Não se preocupe com a alfândega, pois com apenas um funcionário para tantos voos, a chance de ser barrado será de uma em um milhão.
Até o seu hotel, serão mais umas duas horas, durante as quais o senhor poderá notar como nosso rio Tietê está cada dia mais bonito. Aliás, o senhor estará tão perto do estádio da abertura da Copa que não custa dar uma passadinha antes em Itaquera para conferir como a obra está impecável. Duvido que o senhor encontre um defeito no que já foi construído para a abertura do Mundial.
Sei que prometeram um trem de alta velocidade para ligar São Paulo ao Rio, mas é muito mais romântico ir de ponte aérea. Não há vista mais sublime que pousar no Santos Dumont, principalmente quando o avião precisa de mais pista do que o aeroporto apresenta.
Tirando esse perigo, no Rio temos as unidades pacificadoras nos morros. Acabou o problema do tráfico de drogas e da violência na Cidade Maravilhosa. O Maracanã ficará lindo. Como o senhor desejava, será demolido integralmente por dentro e encolherá em uns 120 mil lugares. Só quem não gostou foi o vendedor de amendoim.
Em Belo Horizonte, o pessoal estava tentando contratar serviço de fiscalização e gerenciamento da obra do Mineirão pelo menor preço, mas acho que vão mudar de ideia. Assim, não corremos mais o risco de instalarem uma tabela de basquete no lugar da trave.
Se for a Salvador, não deixe de conhecer as obras do metrô. São seis quilômetros de pura beleza, tão bem executada que ninguém tem nem coragem de usar. Já temos trem, operador, estações, tudo pronto, falta somente inaugurar.
Em Pernambuco, teremos a Cidade da Copa. Ainda bem que levaram os jogos para uma cidade novinha, onde não há sequer um registro de homicídios nem de tráfico de drogas.
Em Natal, cidade mais próxima da Europa, já temos pronta a pista do aeroporto (só ela). Precisa de mais alguma coisa? Ah, e não se esqueça de escolher um hotel com gerador, pois de vez em quando acaba a luz, que volta em, no máximo, cinco horas.
Fortaleza mostra o que é planejamento. Possivelmente terá o Castelão pronto antes mesmo da reforma do estádio Presidente Vargas, que seria o substituto do próprio Castelão enquanto este estivesse em obras, entende?
Em Manaus, capital do Amazonas, conhecerá um mundo de aventura. Será mais fácil encontrar um elefante branco do que uma conexão de internet de banda larga.
Em Cuiabá, não deixe de assistir a um clássico, de conhecer a paixão do matogrossense pelo futebol.
Para chegar a Curitiba, o ideal é ir no dia anterior a sua programação, pois uma névoa levezinha atrapalha a chegada de voos matinais.
Em Porto Alegre, a rivalidade é tão grande que, se o senhor visitar o Beira-Rio, terá que ir também ao novo estádio do Grêmio. Importante: não vá de azul ao estádio do Colorado, nem de vermelho ao futuro estádio Tricolor. É perigoso.
Brasília não foi feita para ser conhecida na quarta-feira. Pois está cheia de políticos, reuniões e negócios. Por isso, pegar táxi, ir a um restaurante, hospedar-se em um hotel pode se tornar um martírio.
A nossa sorte é que em 2012 teremos eleições municipais e, em 2014, estaduais e federal. Assim, ficará fácil preparar o Brasil para o maior espetáculo da terra.
E o principal, Mister Blatter, é que aqui nós contamos com a ajuda de um compatriota que construiu o mundo inteiro em apenas sete dias. Deus é brasileiro, como o senhor bem sabe.
* Rodrigo Prada é jornalista, autor do estudo Os Estádios Brasileiros e diretor do Portal Copa 2014.