Dante Ragazzi Pauli*
O Brasil é um país repleto de desafios.
Com dimensões continentais e muita diversidade entre suas regiões. É a sétima economia mundial, considerando o PIB, mas ocupa, ao mesmo tempo, a posição de número 79 no Índice de Desenvolvimento Humano, o IDH.
Os investimentos em infraestrutura no Brasil foram nos últimos anos absolutamente aquém do necessário para que nosso crescimento se dê de forma sustentável.
O saneamento continua longe das prioridades de grande parte de nossos governantes. Com cerca de R$ 10 bilhões investidos em 2012, de forma absolutamente desuniforme (São Paulo investe perto de 30% deste valor), estamos longe, muito longe, da tão necessária universalização destes serviços, que significam melhoria imediata das condições de saúde dos cidadãos.
Apenas para ilustrar o quão grave e desigual é nossa situação, mostremos alguns dados referentes ao esgotamento sanitário, a partir da última edição do Sistema Nacional de Informações de Saneamento (SNIS), dados de 2012.
– Municípios que responderam os questionários de água: 5070;
– Munícipios que declaram ter sistema de esgotos: 2221;
– Munícipios que declaram não ter sistema de esgotos: 1039;
– Munícipios que não prestaram qualquer tipo de informação referente ao esgotamento sanitário: 2240;
– Índice de Coleta de Esgotos (população urbana): 56%
– Percentual de Tratamento dos Esgotos Produzidos: 39%
Os números acima mostram o descaso com que vem sendo tratado este importante componente da infraestrutura.
O arcabouço legal foi construído nos últimos anos, com a aprovação de leis e decretos que tentam ordenar o setor, permitindo, por exemplo, a participação da iniciativa privada e a formação de consórcios entre entes da federação. Outras poucas e importantes ações ocorreram em alguns estados e municípios. Outro ponto que merece destaque: o Plano Nacional de Saneamento (Plansab) foi finalmente aprovado.
No importante momento em que estamos escolhendo novos governantes e políticos, a ABES pergunta a eles que medidas adotarão para reverter a situação.
Alguns pontos que julgamos importantes:
– Garantia, nos orçamentos da União, estados e municípios de recursos não onerosos para o atendimento aos segmentos não rentáveis (áreas de pobreza extrema e o tratamento de esgotos são exemplos). Tais recursos devem ser alocados com base em critérios previamente definidos e transparentes, de modo a alcançar os setores que deles realmente necessitam;
– Desoneração do setor: nesse quadro de déficits e carência de recursos, não faz sentido continuar exaurindo o setor com a cobrança do PIS e da Cofins. A cobrança desses tributos deve ser extinta, ou, ao menos, os recursos dela decorrentes devem ser aplicados obrigatoriamente no próprio setor, por intermédio de um mecanismo como um fundo, associado a critérios de eficiência na aplicação dos recursos.
– O Plansab, após anos de discussão, permanece como uma referência apenas, sendo necessária a criação de uma instância federal que possa estabelecer com as operadoras e municípios um processo de gestão por resultados, capaz de implementar a governança como regra a ser seguida por todos que desejem usar recursos públicos de qualquer fonte;
– O alcance da universalização exige também grande elevação na qualidade operacional e institucional do setor, com a recuperação de muitos operadores que trabalham hoje em situação de inviabilidade econômica. A ABES entende como fundamental a garantia de implantação dos investimentos em desenvolvimento institucional e operacional previstos nas ações estruturantes do Plansab. Questões como eficiência na redução e controle de perdas de água, dos sistemas de tratamento de esgotos e resíduos sólidos e a inovação tecnológica merecem ações específicas e continuadas;
– A cada dia as cidades são atingidas por graves ocorrências, causadas, em muitos casos, por falta de planejamento, de projetos racionais e de qualidade, da competente aplicação de recursos financeiros e da visível falta de gestão pública profissionalizada e comprometida com resultados gerenciais para a sociedade. As recorrentes cheias, a implantação do Minha Casa Minha Vida e a própria seca no nordeste são bons exemplos de que, se não houver gestão de fato, muitas pessoas continuarão morrendo e mais danos materiais com prejuízos financeiros acontecerão;
– Serviços de qualidade requerem a existência de regulação ambiental e da prestação de serviços. Enquanto a primeira já é um tema avançado em nosso país, a segunda necessita de amplo esforço de construção para alcançar níveis eficazes que otimizem serviços de qualidade com o melhor aproveitamento dos recursos disponíveis;
– Imediata aprovação do Plano Nacional de Resíduos Sólidos;
– Definição de papéis dos setores público e privado;
A ABES integra-se à sociedade no clamor por mudanças reais e efetivas, independentemente de quem seja o vencedor das eleições. Compromete-se a participar de ações que visem adotar medidas urgentes para superar as dificuldades jurídicas, administrativas e institucionais que travam a adoção de procedimentos que possibilitem a contratação de projetos e obras de forma mais ágil e efetiva, buscando a eficiência e a eficácia na prestação dos serviços. Alinha-se com todos que desejem alcançar a universalização dos serviços até 2030.
* Dante Ragazzi Pauli é presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES)