Laís Garcia |
Se a Câmara fosse uma escola e a média de participação dos deputados no plenário fosse computada como presença em sala de aula, 17,35% deles seriam reprovados sumariamente por falta. Levantamento feito pelo Congresso em Foco mostra que 89 dos 513 deputados federais têm, na média do atual mandato, menos de 75% de presença nas sessões deliberativas da Casa (leia mais). O percentual equivale ao mínimo exigido pela Lei de Diretrizes de Bases da Educação Nacional (LDB) para aprovar um estudante, independentemente da média alcançada por ele nos exames ao longo do ano letivo. Ao contrário do que ocorre no ensino regular, os deputados precisam registrar presença apenas três vezes na semana, estão livres de qualquer advertência, têm todas as condições para abonar suas ausências e só se submetem à avaliação de seus superiores, os eleitores, de quatro em quatro anos. Entre os menos assíduos, quatro se destacam por terem faltado a mais da metade das sessões de que deveriam ter participado entre 18 de fevereiro de 2003 e 9 de junho de 2005, período no qual se baseou a pesquisa. São eles os deputados: João Herrmann Neto (PDT-SP), Osvaldo Coelho (PFL-PE), Ney Lopes (PFL-RN) e Neiva Moreira (PDT-MA), que participaram entre 39% e 49% dos trabalhos em plenário. Compõem ainda a relação dos dez mais faltosos, com freqüência entre 50% e 55%, os deputados Almeida de Jesus (PL-CE), Miguel Arraes (PSB-PE), Remi Trinta (PL-MA), João Lyra (PTB-AL), Geddel Vieira Lima (PMDB-BA) e Jader Barbalho (PMDB-PA). Os dados estão disponíveis na página da Câmara na internet. (leia mais). A reportagem, contudo, não teve acesso ao registro da freqüência dos senadores. É verdade que o número de presenças em plenário está longe de ser o principal medidor da produtividade legislativa dos deputados – que deve levar em conta ainda a participação do congressista na discussão das proposições e na fiscalização do Executivo, entre outros fatores –, mas não deixa de expressar a quantas anda o grau de envolvimento dos parlamentares com o espaço mais elementar de suas atividades. Privilégio parlamentar O elevado número de ausências em plenário é diretamente proporcional aos privilégios desfrutados por deputados e senadores. Ao contrário do trabalhador comum que deixa de comparecer ao serviço, eles raramente sentem as conseqüências da falta no bolso. Um ato da mesa diretora da Câmara abre dois caminhos para que eles justifiquem suas ausências e recebam os seus vencimentos sem qualquer desconto no fim do mês. Para excluir uma falta do currículo, o parlamentar tem até o último dia de seu mandato para apresentar um atestado médico – que precisa ser assinado por três especialistas e verificado por uma junta médica oficial – ou comprovar ao presidente da Câmara que estava em “missão oficial autorizada”. Com os dois expedientes, que têm sido usados sem constrangimento pelos parlamentares, eles podem evitar o corte no salário ou garantir o reembolso do dinheiro descontado. Segundo o Ato 23/99 da mesa diretora, "considera-se missão oficial o cumprimento de representação protocolar da Casa ou, ainda, o desempenho de atividade política ou cultural relacionada ao exercício do mandato, assim reconhecido pelo presidente da Câmara dos Deputados". A justificativa, nesse caso, vale tanto para o deputado que, por exemplo, optou por acompanhar o prefeito de sua base eleitoral na inauguração de uma obra no interior do estado, quanto para aquele que participou de atividades externas de comissão ou grupo parlamentar. A facilidade com que os colegas explicam suas ausências instiga a curiosidade dos próprios parlamentares. “Preciso aprender qual é a técnica que os deputados usam para conseguir justificar tantas ausências”, brinca o deputado Bonifácio de Andrada (PSDB-MG), que aparece em 18º lugar na lista dos mais faltosos, com média de 61,57% de presença nas sessões deliberativas dos últimos dois anos e meio. Apesar de ter justificado 84,7% de suas faltas, o tucano se destaca entre os congressistas como um dos que menos justificaram suas faltas. “Poderia inventar, mas não acho certo. Tem gente que dá a certos eventos proporções maiores do que eles têm, para justificar as faltas”, revela. Ao contrário dos deputados, os trabalhadores que têm seus contratos regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não podem se dar ao luxo de justificar faltas num prazo de quatro anos. Segundo a legislação, um mês de faltas consecutivas não justificadas pode caracterizar abandono de emprego, o que dá direito ao empregador de demiti-lo por justa causa. Faltas não justificadas também podem acarretar diminuição das férias e descontos no salário. Para evitar o corte, segundo jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST), o trabalhador deve justificar sua ausência “imediatamente”, o que significa um prazo de dois ou três dias para apresentação das explicações. |