Afora os donos corruptos do poder, que são os que governam, dominam e parasitam o Estado perversamente desde 1500, é muito difícil encontrar algum brasileiro contente com a situação do país. O que predomina de forma generalizada é a angústia, o descontentamento, a indignação, a revolta, o grito por ética e justiça, por ordem e por progresso.
Todos os injuriados somos contra as roubalheiras das oligarquias (econômicas e políticas) que governam a nação, a incompetência dos que nos gerenciam, o desperdício, a brutal desigualdade entre as pessoas, a falta de crescimento econômico sustentável, a baixa escolaridade do brasileiro.
Nesses momentos de caos profundo é que aflora a sensação de impotência, que se dissemina por toda população. A impressão que se tem é de que, de tropeço em tropeço coletivo, nossa nave está indo muito mais para a Venezuela ou para o Haiti, que para a Escandinávia.
Como o Brasil é governado não para o povo (para o todo), mas sim para as oligarquias gananciosas que regem nosso destino (oligarquias econômicas, políticas, financeiras e administrativas), o sentimento de pertencimento dos brasileiros a uma comunidade é tão raso quanto a profundidade de um pires.
Não nos sentimos corresponsáveis pelo país. As políticas reinantes não são inclusivas, ou seja, o poder não é compartilhado. Os interesses privados dos donos corruptos do poder (dos que nos roubam diuturnamente) não se alinham, salvo em raríssimos momentos, com os interesses públicos de todos (leia-se, do bem comum).
Nos países cleptocratas (que contam com governos ladrões), os segmentos excluídos oscilam entre (1) a servidão, (2) a indisciplina (descumprimento contínuo das normas, anomia), (3) a descrença nas instituições e nos valores que elas representariam e (4) a revolta (que frequentemente se transformam em rebeliões).
Da descrença nas instituições (políticas, econômicas, jurídicas e sociais) emerge o sentimento de impotência, acompanhado de desesperança, desânimo, tristeza, medo, desinteresse, ansiedade, inquietude e tensão. Esse quadro agrava, naturalmente, a depressão (o Brasil é o 5º país mais deprimido do mundo, diz Calligaris), que gera profundo desinteresse (sobretudo de participar da vida política do país).
PublicidadeAqui está a explicação para o seguinte: 59% dos eleitores dizem que vão votar em branco, nulo ou ainda não têm candidato a presidente da República (CNI-Ibope).
Quando a força simbólica das instituições (programadas para transmitirem segurança, estabilidade, tranquilidade) se minguam, o povo vai se sentindo cada vez mais diante de uma “perda da consistência simbólica” (o Estado já não funciona ou não funciona de forma minimamente aceitável).
Atingido esse desesperador estágio (de impotência absoluta), o imaginário do cidadão (e da coletividade) pede qualquer coisa que para ele tenha o significado de salvamento próprio e/ou do grupo social (recuperação da sua identidade perante si mesmo e perante a coletividade).
Quando o cidadão alcança níveis insuportáveis de descrença (e de impotência), diante da perda da consistência simbólica das instituições, o que ele mais deseja é um Estado radical, um pai severo, um professor com pulso firme, uma autoridade de mão dura, um sofrimento cruel, um castigo violento.
Daí nascem as demandas para a intervenção (golpe) militar e posturas políticas extremadas, radicais (típicas da nova direita fundamentalista).
No fundo, o cidadão quer recuperar o seu self (ou seja: sua identidade perante si mesmo e perante a sociedade). Quando o cidadão perde a ideia da garantia simbólica, corre para soluções imaginárias prepotentes, drásticas, radicais, fundamentalistas, severas, exorbitantes.
Da sensação de impotência se passa para o extremo da prepotência rapidamente. É esse momento trágico que uma boa parcela da população brasileira está vivenciando. Impotência, potência e prepotência.