Duas ou três imagens que se espalharam pelo mundo nos últimos dias de 2006 emitiram sinais contraditórios sobre o Rio de Janeiro. De um lado, os mais do que cruéis ataques a ônibus feitos por traficantes irritados com a ação das milícias nas favelas. De outro, a disputa entre o tradicional reveillon de Copacabana e a festa para um milhão de pessoas nas areias da praia de Ipanema. Se emitem sinais contraditórios é porque o Rio é isso mesmo – contraditório.
Muita gente que vive fora da cidade hoje nem sequer pensa na hipótese de experimentar uma temporada carioca de férias. O medo da violência já faz mais do que isso. O Rio é muitas vezes tratado com deboche por brasileiros de outros estados. O deboche que se tem por alguma cidade derrotada, decadente, incapaz de vencer o círculo vicioso de drogas e violência. Uma cidade, porém, que ainda é a cara do Brasil no exterior.
Os que insistem em desembarcar no aeroporto Antônio Carlos Jobim são muitas vezes vistos como corajosos. Alguns ainda se encantam com a cidade mesmo assim. Outros não fazem a primeira parada em um hotel, mas em uma delegacia. Como ocorreu com um grupo de europeus assaltados na Linha Vermelha na primeira semana do ano. Quem tem razão, os que se encantam com a cidade ou os que têm medo dela? Ambos, provavelmente. Porque, se a cidade permanece muito perigosa, ainda não conseguiu perder seu charme e seu encantamento.
Em quesitos como saúde e segurança, o Rio parece ter chegado mesmo ao fundo do poço. E isso assusta e amedronta tanto os turistas eventuais como os próprios cariocas. O problema é que alguns aproveitam para tripudiar. Para colocar a cidade numa espécie de cesta de lixo das possibilidades brasileiras. Durante os últimos oito anos, a incompetência e o provincianismo que tomaram conta do estado ajudaram a alimentar essa imagem. O permanente divórcio entre prefeitura, estado e governo federal também deu sua longa contribuição.
O assalto aos turistas europeus na Linha Vermelha mostra que nada muda tão de repente. Mas 2007 parece ter trazido uma pequena carga de esperança às baterias de quem gosta da cidade. O entendimento do novo governador com a prefeitura e com o governo federal é um bom sinal. Assim como o anúncio de um novo modelo de gestão econômica do estado, que ainda representa a segunda maior economia do país, mas não garante sequer o pagamento em dia dos seus funcionários.
A presença de tropas federais no Rio ajudará a montar a moldura do novo relacionamento do estado com Brasília, onde pouquíssimos representantes cariocas foram vistos nos últimos anos em gabinetes importantes da Esplanada dos Ministérios. Mesmo que os agentes da Força Nacional de Segurança tenham uma atuação mais simbólica do que real no combate à criminalidade.
Combate que, sempre é bom lembrar, envolve igualmente a necessidade de uma grande mudança social. Por isso, soa bem o anúncio do novo secretário de Educação estadual, Nelson Maculan, de retomar o projeto de educação em tempo integral implantado na década de 80 pelo ex-governador Leonel Brizola. “No mundo moderno de hoje, no qual muitos pais trabalham”, disse ele ao O Globo, “é importante que o aluno faça os cursos de música, de arte, de nado, na escola”.
Maculan cita como exemplos dessa tendência França, Itália, Estados Unidos e Canadá. Poderia lembrar ainda a Argentina, onde uma lei recém-aprovada estabelece a jornada estendida ou completa a todas as escolas primárias do país. O fortalecimento da educação pública é uma pré-condição para oferecer aos jovens uma boa alternativa às seduções do tráfico e da violência.
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