* Rodrigo Lorenzoni
A recente apreensão de alimentos que não estavam de acordo com a legislação sanitária no Rock in Rio gerou uma espécie de comoção entre aqueles que tentam incutir à força sua narrativa ideológica aos fatos.
As críticas à burocracia estatal, ao fiscalismo e as insinuações que as ações de fiscalização inevitavelmente geram corrupção foram inúmeras. Todas essas observações possuem pertinência quando realizadas em situações apropriadas. Porém, nesta ocasião é diferente.
Esta tentativa de ter um discurso que agrade setores da sociedade no afã de ocupar espaço político é no mínimo imprudente e irresponsável. Especificamente em relação à chef Roberta Sudbrack, não estamos falando sobre ações fiscalizatórias punitivas a quem empreende, e sim de ações fiscalizatórias preventivas para quem consome. Quem conhece de perto a realidade das vigilâncias sanitárias, como funciona tecnicamente seu trabalho, as legislações que regulamentam estes procedimentos, sabe que esse tipo de operação e apreensão é muito mais comum, principalmente em grandes eventos, do que estes que vociferam críticas imaginam. E foi isso que aconteceu. A regra é clara e a lei tem que valer para todos.
Compareci ao Rock in Rio e acompanhei in loco dezenas de estabelecimentos comercializando alimentos. Desde grandes redes de fast food até empreendimentos de menor porte, que vendiam desde pipoca até sushi, incluindo lanches veganos. Os estabelecimentos atenderam às exigências da fiscalização e estiveram exercendo a livre concorrência, comercializando seus produtos e auferindo lucros. Por que teria que ser diferente com a chef “famosa”? A concorrência deve ser estabelecida em condições mínimas de igualdade. Não ouvi dos defensores da renomada chef a preocupação com a concorrência, com dezenas de outros comerciantes que cumpriram com a legislação e poderiam ser prejudicados nessa situação.
Que o estado brasileiro é paquidérmico, interventor ao extremo e na maioria das vezes não propicia um ambiente adequado para negócios é fato. Agora, misturar esta situação com uma ação que visa a garantia da saúde pública é um lastimável exagero, além de um erro grotesco de compreensão. O Rock in Rio é um ambiente fantástico de exemplo de projeto empreendedor de sucesso. Absolutamente tudo é monetizado e com alto valor agregado. E é justamente por isso que o evento dá certo. Alia qualidade, organização, gera experiências inesquecíveis a seu público, que estando satisfeito consome sem culpa. Essa constatação é outra amostra de que essa falsa polêmica em volta da chef está equivocada.No caso específico do evento, todos os empreendimentos de venda de alimentos puderam empreender, com exceção de um, que não cumpriu com as legislações sanitárias, mesmo tendo sido orientado previamente.
Outro aspecto absolutamente desnecessário é a demonização dos servidores públicos fomentada por alguns dos defensores da chef. Muitos, inclusive, detentores de mandatos políticos. Neste momento, esquecem que em suas atividades parlamentares também são servidores públicos e quando generalizam acabam se colocando no mesmo cesto. Sou gestor público há seis anos, presido uma autarquia federal e posso afirmar que existe muita gente boa, qualificada e que se esforça para prestar um bom serviço à sociedade. Não será demonizando pais e mães de família que faremos um país melhor.
Esta é uma grande demonstração do quão sectário e oportunista é a ação destes imprudentes. Aproveito para deixar claro aqui que estou entre aqueles que defendem uma reforma na máquina administrativa do Estado. Acredito que existem categorias e corporações públicas que possuem benefícios desproporcionais a realidade do Estado brasileiro. Confio que a meritocracia deve ser implementada e “etc etc”, mas tudo isso de forma equilibrada e respeitosa.
Por estas constatações é que acredito que o cidadão deve ter muita atenção com esses movimentos que estão em curso em nosso país. Em ambos os polos políticos se encontram monumentos de imposição de suas narrativas goela abaixo da realidade. Esta prática desgastada e habitual da extrema esquerda passou a ser exercida por alguns que querem se intitular da “nova direita” e que apareceram apenas no momento em que ficou “cool” se dizer de direita. Esta prática é antiga e nos trouxe até aqui, esse discurso raivoso, neste e noutros episódios, coloca seus propagadores na extrema direita. E a discussão ao redor dos extremos não leva ninguém a lugar algum.
Acredito que se quisermos realmente mudar o país, será com equilíbrio. Com discussões ponderadas. Sem caça às bruxas. Onde a técnica seja responsável pela condução das discussões técnicas. Que não usemos subterfúgios para discutirmos de forma rasa situações complexas, apenas para fazer proselitismos políticos para seus seguidores.
É nisso que acredito e assim que tento proceder.
*Rodrigo Lorenzoni é presidente do Conselho Regional de Medicina Veterinária do RS, médico veterinário e empresário.
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